Desculpa Ucrânia, mas temos eleições                                                 

Trump já avisou que, com ele, a guerra acaba no dia seguinte à sua eleição – ou seja, forçaria um cessar-fogo que consagraria as conquistas territoriais russas.

No chamado mundo Ocidental existirão, consecutivamente, eleições essenciais para a (re)definição do nosso futuro. Em 2023, a Polónia (15 out.), os Países Baixos (22 nov.) e o que quer que esteja ou vá acontecer em Espanha. Em 2024, teremos eleições para o Parlamento Europeu (6 a 9 de junho), EUA (5 nov.) e Reino Unido logo ao virar da esquina. Ah! E a Eslováquia acabou de reeleger um novo líder, descrito como populista e pró-russo, que já avisou que não enviará nem mais uma bala para a Ucrânia.

Dentro deste espírito, Morawiecki, na Polónia, no meio da tensão sobre os cereais ucranianos, às quais se juntaram Hungria e Eslováquia, suspendeu a entrega de novas armas a Kiev. Nos Países Baixos, a rapidíssima ascensão do BBB – Movimento Agricultor-Cidadão, de pendor populista de direita, é um sinal de como os ucranianos, especialmente os agricultores, deverão contar com uma solidariedade cada vez mais limitada dos neerlandeses no futuro. Ursula von der Leyen, no último Discurso sobre o Estado da União, num exercício de campanha eleitoral, prestou homenagem aos agricultores europeus e apresentou uma visão protecionista da política industrial europeia. Do outro lado do Atlântico, Trump já avisou que, com ele, a guerra acaba no dia seguinte à sua eleição – ou seja, forçaria um cessar-fogo que consagraria as conquistas territoriais russas.

Por que razão é alguma destas coisas relevantes? Porque as democracias, bem ou mal, tentam responder às opiniões (pressões…) públicas e estas querem resultados, bem-estar e qualidade de vida já, no curto prazo. Nós, todos, queremos soluções rápidas e eficazes mesmo sob pena de prejudicarmos as próximas e a nossa própria geração. À medida que a guerra se arrasta e as eleições se vão sucedendo, alimentam-se os apetites populistas, nacionalistas ou protecionistas. Desenvolve-se, cada vez mais, um argumentário simplificado de proteção dos interesses internos de cada país e dos seus eleitores que colocam em segundo ou terceiro plano as questões globais ou regionais.

Num contexto marcado pela quebra do crescimento económico, inflação ou aumento dos fluxos migratórios, é possível que as opiniões públicas ocidentais e as suas lideranças torçam mais o nariz sempre que Kiev peça mais munições, armamento, dinheiro e solidariedade.

É verdade que não se ganham eleições nacionais com agendas internacionais. Contudo, o futuro da Ucrânia está indexado à sorte destas diferentes eleições e das suas disputas pré-eleitorais. Por isso, nos próximos tempos, Zelensky deverá ouvir muito: – Desculpa Ucrânia, mas temos eleições.

Professor e Diretor de Estudos Europeus e Relações Internacionais – Universidade Lusófona