O violino de Marx

A política de portas abertas europeia, que originou um processo de islamização na Europa abriu espaço para partidos islâmicos que têm formas muito diferentes de ver o Mundo e o Homem.

A polarização nas sociedades ocidentais tem atingido pontos de quase rutura. Seja pela Guerra, ou pelas causas fraturantes, ou por cenários antecipados de apocalipse climático. A causa da polarização está na forma como a Direita, mas sobretudo a Esquerda, politizou conceitos essenciais para Democracia como: Vida Humana, Liberdade ou Justiça e isso refletiu-se no presente do debate político. Esquerda e Direita têm noções muito diferentes para conceitos indispensáveis para a mínima convivência comum.

Se tudo isto fosse uma Orquestra, teríamos de um lado as cordas a começarem a mesma obra musical em Dó Maior e os Sopros em Sol# menor. Seria impossível alguém do público resistir ao ruído. Se num concerto, as pessoas podem levantar-se e sair da sala, em Democracia, eleitos e eleitores não o podem fazer. Mais, têm a responsabilidade de garantir a mínima consonância democrática na sala de concertos. É verdade que o Marxismo introduziu nos debates políticos a mais profunda das dissonâncias e de alguma forma, tem vivido disso. Isto é, o marxismo contaminou a direita e a esquerda através da luta de classes, pelo maniqueísmo do “nós contra eles” que se tornou transversal em todas as questões.

No Ocidente, quem deseja ter o mínimo de sucesso político, tem de introduzir uma novidade ao espaço público, geralmente isso faz-se através de uma dissonância. Até porque, quem quer introduzir uma consonância geralmente frustra-se, porque arrisca-se a não ser escutado. Podem 99 violinos estar a tocar um acorde de Dó Maior e 1 estar a tocar o 7º grau dissonante. Com grande probabilidade, o violinista que estiver a tocar o 7º grau do acorde de Dó Maior, será o mais escutado dos 100. Será de certeza o mais notado. Este é o paradoxo democrático. No limite, poderíamos concluir que é mais fácil destruir do que construir. Nesse caso, a sobrevivência da Democracia, reside na capacidade política que tem de ouvir as dissonâncias e aproximá-las das consonâncias. Isto é, a Democracia sobreviverá pela largura que as suas instituições têm para conseguir convergir com quem muitas vezes procurará divergir. É de alguma forma antinatural. A Democracia terá de conseguir escutar as dissonâncias por vezes antes mesmo destas reverberarem e este exercício de antecipação é particularmente exigente.

Como tal, surge a discussão das dissonâncias do futuro, qual será o limite que as instituições democráticas no Ocidente conseguirão resistir? A política de portas abertas europeia, que originou um processo de islamização na Europa abriu espaço para partidos islâmicos que têm formas muito diferentes de ver o Mundo e o Homem. Será possível conciliar isso com a matriz de Jerusalém, Atenas e Roma? Ou numa época de grande desenvolvimento tecnológico, de avanços extraordinários na ciência e medicina, não estaremos na antecâmera para a concretização na Europa de partidos Transumanistas? Algo que, por exemplo, já existe nos Estados Unidos.

A metáfora da Orquestra poderá servir de inspiração para decisores políticos. Os equilíbrios políticos serão feitos pelo alinhamento das consonâncias e dissonâncias. A história do século passado mostra o risco de forçar consonâncias, eliminando as “dissonâncias”. No presente assistimos aos riscos de algumas consonâncias artificiais de elites políticas, que tentam esconder as dissonâncias dos subúrbios. No futuro corremos o risco de uma sobreposição total das dissonâncias às consonâncias. Uma Orquestra vive de equilíbrios e as sociedades também. Procurá-los será o que fará distinguir a Democracia da Tirania, a Liberdade da Opressão.