Mudam-se os tempos sem vontades de mudança

Assumir as fragilidades dever-se-ia tornar desígnio nacional.

Tenho incómodo crescente com a generalidade dos debates entre os representantes das diversas forças políticas. O estilo tem-se degradado, atrapalhando a construção de um modelo de desenvolvimento. O debate tem-se tornado mordaz, egocêntrico e vazio de resultados. A maledicência, a calúnia e a insinuação piadética substituíram a obra e não temos grande coisa para nos orgulhar no que ao fazer bem feito pela política diz respeito. Há excesso de gracejadores no discurso com falta de pensamento e trabalho para o desenvolvimento da nação. A forma brejeira como se debate na assembleia da república e noutros fóruns, com destaque para reuniões de câmara e assembleias municipais, contribui para reavivar o pior que a revolução de 1974 trouxe à sociedade portuguesa. A confusão entre liberdade e desrespeito, e entre direitos e civismo (ou a falta dele), promove a falta de educação e os ataques pessoais numa teatralização que prejudica o a democracia. Este fenómeno tem origem na impreparação da generalidade dos políticos para os desafios do desenvolvimento. A consequente proliferação dos discursos radicais, básicos que colhem eco nos insatisfeitos crentes do simplismo faz o resto. A incapacidade que o PSD tem em construir uma estratégia e promover uma direção clara para o crescimento e inovação da economia nacional tem prejudicado a qualidade do tecido empresarial, da produtividade, e do emprego, contribuindo para a fragilização da imagem internacional resultante de medidas erráticas A falta de comparência de um projeto claro proveniente da área da social democracia meritocrata, que tenha por desígnio o Fazer Bem Feito, é, em minha opinião, a maior das falhas contemporâneas da sociedade portuguesa, e essa falha promove campo fértil aos discursos básicos e simplistas.

Nos anos 90 os governos liderados pelo primeiro-ministro Cavaco Silva produziram um conjunto de desígnios estratégicos que ajudaram à evolução, extremamente positiva, de alguns setores tradicionais e contribuíram para uma evolução única da economia e sociedade portuguesa. O relatório Porter e as políticas de integração europeia constituem um exemplo de construção estratégica com reflexo operacional. Essa época mostra como é possível mudar rapidamente para níveis superiores de exigência.

Assumir as fragilidades dever-se-ia tornar desígnio nacional: a burocracia que afeta o funcionamento da economia; o reforço na autonomia e financiamento da escola e do sistema de ensino; as responsabilidades e o civismo antecedem os direitos; a zona económica marítima exclusiva constitui um ativo económico e geopolítico indispensável. Rever e tratar as fragilidades no lugar do debate a níveis satélites constitui um propósito de desenvolvimento. Os egoístas da maledicência e simplismo básico não estão dispostos.

Enquanto isso, António Guterres, promotor dos últimos dois primeiros-ministros socialistas, que nos habituou a uma enorme discrepância entre o que diz e faz, continua, em minha opinião, a dar um exemplo de incapacidade na gestão de dossiers complexos. As afirmações e justificações no que ao ataque terrorista do Hamas a Israel diz respeito, são demonstrativas da falta de jeito para promover a paz. Será que o secretário geral da ONU exigiu visitar os reféns? Deveria ser a primeira preocupação e a primeira ação que silenciosamente deveria ter promovido. Não vejo nem vontade nem coragem.

Por fim, continuo à espera que a fantástica Câmara de Lisboa, totalmente orientada para a resolução dos problemas das pessoas, e que na fantástica política de novos tempos orientada para servir as pessoas, me entregue um documentozito que me pertence depois de dezenas de fantásticos pedidos e de fantásticos meses de espera… Lamento que Carlos Moedas fale tanto sobre tão pouco, e dê um fantástico mau exemplo dos novos tempos que não se distinguem dos velhos tempos… É caso para dizer que mudam-se os fantásticos tempos mas não se mudam as vontades…

CEO do Taguspark, Professor universitário