Não deixa de ser a homenagem possível, e mostra o muito que nos falta para chegarmos a coincidir com o balanço transgressivo e a força de libertação de uma das nossas aventuras artísticas mais pregnantes.
«Decorrerão muitos séculos antes de nós/ mas não te importes», avisava faz umas décadas Mário Cesariny, e está claro que estamos ainda na infância desta espera, de tal modo que mesmo aqueles que dizem amar o poeta se mostram reticentes em lançar-se com ele na trincheira que escavou para se isolar face ao ambiente de sórdida intriga que domina o espaço cultural, e também para preservar as sumptuosas conquistas e avanços da sua poesia.
Ele que em tudo se exprimia como quem lava o sangue sujo do quotidiano, o apura e vivifica passando pela mais alta inspiração, também quando pintava, compunha artefactos ou tocava piano para se confessar aos pássaros não perdia essa afinação estupenda.
Ora, o MAAT quis celebrar o poeta, e expor algumas das peças da sua obra plástica, colocando-a em diálogo com obras de outros tantos artistas com quem viveu nesse exílio do espírito no período de trevas do Estado Novo e mesmo nos anos equivocados que se lhe seguiram.
O Castelo Surrealista de Mário Cesariny é uma exposição rudimentar e tosca, sem audácia nem nada de muito instigante, que lança mão de uma série de objetos do poeta e os mostra num registo próximo de uma feira de garagem, e, no entanto, não deixa de ser a homenagem possível, e mostra o muito que nos falta para chegarmos a coincidir com o balanço transgressivo e a força de libertação de uma das nossas aventuras artísticas mais pregnantes.