África Otimismo cauteloso, em ano de riscos e oportunidades

O FMI estima que 10 das 20 economias que mais vão crescer em 2024 são africanas. Uma boa notícia para o continente mais jovem do mundo. Mas a excessiva dependência da China gera apreensão.

Segundo estimativas do FMI, África será – a seguir à Ásia – a região que mais crescerá em 2024. Um indicador positivo para o continente mais jovem do mundo, onde começam a sentir-se os efeitos positivos da Zona de Livre Comércio que entrou em vigor há três anos.

Mas, num continente de contrastes, subsistem riscos como a desaceleração da economia chinesa, a inflação e a dívida que pesa sobre algumas das principais economias. E nas regiões do Sahel e do Corno de África, 2024 confirmará a reconfiguração da arquitetura de segurança, num contexto em que acordos bilaterais, forças regionais ou sub-regionais e grupos de segurança privada vão substituindo as missões multilaterais sob comando das Nações Unidas.

‘Quando a China espirra…’

‘Quando a China espirra, o mundo apanha uma gripe’. A frase é certeira em relação a alguns países africanos, como a República Democrática do Congo, a África do Sul ou a Zâmbia, cujas economias dependem da exportação de matérias-primas para o gigante asiático. Foi o crescimento acelerado da China na última década do século XX e na primeira década do século XXI, ancorado na estratégia de go out, que permitiu a várias economias africanas, como Angola, a Nigéria ou a Zâmbia, atingir taxas de crescimento muito significativas.

Mas o apetite do dragão diminuiu. Neste momento, a economia chinesa enfrenta vários riscos, incluindo o envelhecimento demográfico, a diminuição da produtividade e uma crise no mercado imobiliário. Uma China a consumir menos em 2024 – tendência já verificada nos anos anteriores – é um problema para África, que tem no gigante asiático o seu maior parceiro comercial.

Outro risco é a inflação. E se os dados indicam uma desaceleração da subida dos preços nos mercados emergentes, os cidadãos de países como o Zimbabué, o Egito, a Nigéria ou o Gana continuarão a sentir a pressão inflacionária. Uma das possíveis consequências, como demonstraram as primaveras árabes, são protestos que podem levar a quadros de instabilidade ou desintegração política, sobretudo em regimes que não são democracias plenas.

Associado à inflação está o peso da dívida, num contexto de taxas de juro mais altas e de um dólar forte. Vários países africanos negociaram ou estão em curso de negociar processos de restruturação da dívida com o FMI, o que implica a adoção de medidas impopulares, como o fim da subsidiação de produtos alimentares ou dos combustíveis.

Oportunidades em contraciclo

A boa notícia é que muitas economias africanas parecem estar em contraciclo. Segundo o relatório do FMI, dez das vinte economias que mais deverão crescer no próximo ano são africanas. Este indicador, por si só, não diz muito. Mas há sinais encorajadores de transformação económica em países como Angola, o Ruanda ou Marrocos, que tem apostado – com sucesso – no desenvolvimento da indústria automóvel.

E se as economias africanas, importadores líquidos de cereais, são castigadas pelo conflito na Ucrânia, países exportadores de matérias-primas também beneficiam do novo contexto geopolítico que obriga atores como a União Europeia a diversificar o leque de fornecedores de energia. Por outro lado, os esforços da transição energética são uma oportunidade para países produtores de cobalto e cobre como a República Democrática do Congo, a África do Sul ou a Zâmbia.

Testes nas urnas

Também em África o calendário eleitoral de 2024 está bastante preenchido, com eleições na Tunísia, Argélia, Gana, Senegal, Ruanda, Namíbia, Moçambique ou África do Sul.

Na África do Sul, é possível que o ANC perca a maioria num momento em que se torna evidente o seu desgaste junto das gerações mais jovens, e num contexto marcado pela persistência do desemprego, corrupção, altos níveis de criminalidade e uma crise energética. Também em Moçambique, e com as autárquicas de 2023 como prenúncio, as eleições gerais de outubro de 2024 podem trazer um impasse, e tensões políticas e sociais.

E em dois países apontados como casos de sucesso da última vaga de transição democrática, o Senegal e o Gana, as eleições de 2024 representarão um teste à robustez das instituições, num momento em que aumenta a insatisfação popular. No Senegal, os protestos obrigaram Macky Sall, na presidência desde 2012, a retirar a sua candidatura.