Vai deixar de ser possível fazer pagamentos bancários online sem ter acesso a cartão bancário. Esta obrigação resulta da transposição de uma diretiva comunitária de 2015, mas, ao que o Nascer do SOL, apurou abrange uma percentagem residual de clientes, menos de 1% num total de mais de 23 milhões de contas bancárias e que ronda as 170 mil. Isto é, serão afetados todos aqueles que faziam pagamentos online através de homebanking ou da aplicação do banco mas que até aqui não necessitavam de um cartão bancário. O Nascer do SOL sabe que esta foi a solução encontrada pela SIBS, empresa responsável pela gestão das redes Multibanco, para responder às exigências desta diretiva.
Tudo apontava para a entrada em vigor a 1 de janeiro destas novas regras, no entanto, a aplicação será feita consoante as políticas comerciais e há quem já tenha anunciado esse adiamento. Um desses casos é o Santander e o Bankinter. No entanto, depois da polémica instalada, o Banco de Portugal (BdP) veio esclarecer que «a exigência de detenção de um cartão para a realização de operações de pagamentos de serviços, pagamentos ao Estado e carregamentos de telemóveis no homebanking das instituições não resulta de qualquer imposição direta do Banco de Portugal, nem da aplicação de regulamentação europeia ou nacional», mas diz que enquanto autoridade competente nacional para a fiscalização do cumprimento dos deveres estabelecidos neste regulamento pediu à SIBS para fazer essa regularização, não impondo medidas em específico.
«A referida determinação específica não foi prescritiva quanto à forma como a SIBS deveria conformar as operações de pagamento disponibilizadas na rede Multibanco com a legislação aplicável, deixando ao critério daquela entidade a melhor forma de o fazer. Acresce que, de entre os requisitos cujo incumprimento importava corrigir, não se incluía a obrigatoriedade de detenção de um cartão na realização de operações de pagamentos de serviços, pagamentos ao Estado e carregamentos de telemóveis no homebanking das instituições».
A entidade liderada por Mário Centeno esclarece também que a «SIBS FPS e os prestadores de serviços de pagamento tomaram a decisão, que é da sua exclusiva responsabilidade, de passar a exigir a detenção de um cartão para continuar a realizar essas operações no homebanking».
Mas, ao que o nosso jornal apurou, foi dada a opção aos bancos para cumprir as novas exigências: ou com um cartão bancário físico, ou com um cartão virtual (neste caso sem custos associados). Esta última opção já foi avançada por alguns bancos, mas apenas para os clientes empresariais. Uma decisão que não agrada ao economista da Deco Vinay Pranjivan. «Se essa solução é possível para cada uns clientes então também tem que ser possível todos os clientes. Se isso resolver a situação, se clarificar o âmbito da aplicação do regulamento para este tipo de pagamentos e se não comporta custos para qualquer cliente então tudo bem», refere ao nosso jornal.
Deco censura medida
A Deco já veio considerar que esta ação unilateral da SIBS «é abusiva e sem enquadramento legal, tendo já enviado carta à SIBS com as suas preocupações», assim como enviou uma carta ao Ministério das Finanças e ao Banco de Portugal manifestando a sua posição e exigindo intervenção no sentido de impedir esta imposição. «De facto, como veio a ser comprovado pelo comunicado do Banco de Portugal (BdP) de sexta-feira, não tem justificação para esta exigência. Portanto, somos totalmente contra porque não faz de todo sentido que seja agora obrigatório ter de ter um cartão de débito ou de crédito para efetuar pagamentos quando de facto não há nenhuma obrigação nesse sentido, em termos regulatórios, na exigência do supervisor», salienta.
Vinay Pranjivan, economista da Associação de Defesa do Consumo chama a atenção para o impacto desta obrigação. «Os impactos obrigariam os clientes de contas bancárias a deter cartões de débito ou de crédito, físicos ou virtuais, para continuar a efetuar pagamentos online. Esta medida levaria a que os clientes que optem por não deter cartões não possam efetuar pagamentos online. De entre os clientes impactados incluir-se-iam aqueles que residem no estrangeiro, mas mantêm pagamentos em Portugal ou aqueles que têm mais do que uma conta e só precisam de cartões numa delas».
E defende que este tema assume maior relevância num contexto de elevados custos associados a deter um cartão físico ronda, entre os 18 e os 20 euros. Ainda assim, reconhece que «também é verdade que há muito poucos clientes que têm contas bancárias sem cartões».
Vinay Pranjivan admite que nesta situação estão alguns clientes bancários privados, mas acima de tudo empresas que «usam este tipo de contas para pagar, por exemplo, impostos». No entanto, lembra que com esta obrigatoriedade os bancos vão ‘engordar’ ainda mais as comissões dos bancos que têm vindo a engordar nos últimos anos. «Além disso é um um custo que está sujeito às flutuações dos preçários e como todos sabemos nos últimos anos não têm sido meigos», refere ao nosso jornal. E acrescenta: «Os bancos começaram a carregar nas comissões porque as margens financeiras estavam totalmente esbatidas e, como tal, tinham de ter uma outra fonte de rentabilidade. No entanto, há dois anos estamos com uma margem financeira bruta muito forte como os resultados têm vindo a demonstrar, as margens financeiras estão incrivelmente altas e não se assiste a um único sinal de retrocesso nas comissões».
Esta medida já originou uma petição contra levada a cabo por Paulo Santos e diz que como vive no estrangeiro, paga muitas contas através da internet. E afirma que não entende esta necessidade de cartão: «Não consigo perceber qual é o nexo disso, porque isso vai complicar o sistema e torna-o mais inseguro, porque vou ter que andar sempre com cartões».