Os trabalhos de Pedro Nuno Santos

Para se consolidar como líder do PS, Pedro Nuno Santos tem duas tarefas prioritárias: fazer com que os militantes deixem de pensar no processo judicial que derrubou o Governo, e levar o Partido Socialista a libertar-se da sombra paternal de António Costa.

Qual foi a primeira coisa que António Costa fez quando subiu à liderança do Partido Socialista? Foi levar o partido a esquecer o processo de José Sócrates, com a estafada frase «À Justiça o que é da Justiça, à política o que é da política». O facto foi tão ostensivo, que levou Sócrates a reagir com azedume e a travar-se de razões com o próprio Costa; a última coisa que ele quereria era que o seu partido o esquecesse.

O abandonasse às feras.

Mas António Costa, para se afirmar, não podia fazer outra coisa.

E agora Pedro Nuno Santos terá de fazer exatamente o mesmo relativamente ao seu antecessor.

Para se consolidar como líder do PS, Pedro Nuno Santos tem duas tarefas prioritárias:

1. Fazer com que os militantes deixem de pensar no processo judicial que derrubou o Governo e envolve vários membros ilustres do partido, incluindo o ex-primeiro-ministro, e se concentrem no trabalho político;

2. Levar o Partido Socialista a libertar-se da sombra paternal de António Costa.

Enquanto não conseguir isto, Pedro Nuno Santos não se afirmará plenamente como secretário-geral do partido.

Enquanto o PS andar às cabeçadas ao Ministério Público, gastar o seu tempo a atacar Lucília Gago, reivindicar a inocência dos seus militantes, não se dedicará a fazer o que realmente precisa de fazer: voltar a falar de política e olhar para a frente, concentrando-se nas próximas eleições.

Tal como fez António Costa quando se tornou líder do Partido Socialista, ignorando o caso Marquês, Pedro Nuno Santos terá de dar ordens expressas aos seus militantes para ignorarem o caso Influencer.

Por outro lado, o novo líder terá de conseguir que o partido esqueça rapidamente António Costa. Este é o passado – e o que interessa ao PS é pensar no futuro.                                                                                                    Pedro Nuno Santos nunca criticará António Costa, não renegará o que o seu Governo fez, mas quererá que o Partido Socialista feche essa página.

Se o partido continuar preocupado em reclamar a inocência de António Costa, em celebrar os feitos de António Costa como primeiro-ministro, Pedro Nuno Santos será uma personagem secundária, uma segunda figura.

Se a sombra de António Costa continuar a pairar sobre o PS, Pedro Nuno Santos não conseguirá ser visto como o verdadeiro líder.

Assim, ao contrário do que diz a maioria, julgo que Pedro Nuno Santos não desejará ter António Costa na campanha eleitoral.

Percebo que Costa se tenha oferecido para isso.

O que lhe interessa neste momento é aparecer, não sair da ribalta, mostrar que está vivo.

 Quererá participar nos comícios, falar aos jornalistas, ajudar o PS, para o PS continuar a ajudá-lo.

Quererá levar o PS a ganhar as eleições, para se vingar de Marcelo Rebelo Sousa e dizer que o Presidente estava errado ao dissolver o Parlamento.

É isto que António Costa pretenderá.

Mas a Pedro Nuno Santos convém exatamente o contrário.                                                                                      Ao lado de António Costa, será sempre visto como seu ex-ministro, a quem ainda por cima Costa fez uma enorme desfeita obrigando-o a um humilhante ato de contrição em público.

Ao lado de António Costa, Pedro Nuno Santos será sempre visto como um simples coronel, ajudante do general.

Rei morto, rei posto: é assim a política.

E assim sendo, o que interessará a Pedro Nuno Santos é que Costa desapareça de cena, saia do palco, o deixe sozinho na campanha, não lhe dispute o protagonismo.

Não interessará a Pedro Nuno Santos travar até ao fim uma luta em duas frentes: contra o PSD e o CDS, na frente externa, e no interior do seu próprio partido, contra o fantasma do ex-líder.

Pedro Nuno Santos pretenderá aparecer inquestionavelmente como o número um, sem ter a sombra de ninguém.

Quererá limpar o passado, o que ficou para trás, e surgir como uma virgem pura, quase como se tivesse nascido agora.

Quererá apagar o seu tempo como ministro.

Ignorar a nacionalização da TAP, as milionárias injeções de dinheiro na companhia, o anúncio intempestivo do novo aeroporto, a indemnização a Alexandra Reis.

Ora, a presença de António Costa na campanha trará sempre à memória esse tempo, o passado incómodo que o novo líder quer esquecer.

Bastaria isto para Pedro Nuno Santos desejar que António Costa se mantenha bem longe da campanha eleitoral.

jose.a.saraiva@nascerdosol.pt