OnlyFans. ‘O meu corpo, as minhas regras!’

Através de plataformas como o OnlyFans ou o Patreon, as pessoas fazem milhares de euros só por partilharem uma fotografia do corpo.

Nunca foi tão fácil ganhar dinheiro. E quando dizemos ganhar dinheiro, não falamos de pequenas quantias ou mesmo de centenas. Há pessoas que conseguem ganhar milhares de euros apenas com um clique, tirando uma fotografia a alguma parte do seu corpo ou fazendo vídeos e publicando na internet. E se antes isso era visto com maus olhos, agora, parece que são cada vez mais aqueles que o fazem sem qualquer pudor, tentando quebrar tabus. Falamos de mulheres e de homens. “O meu corpo, as minhas regras”, afirma Isabel Gonçalves Lopes, mais conhecida como Bella Bellux.

Já existem inúmeras plataformas onde isso é possível, no entanto, as mais conhecidas no país são o OnlyFans – uma plataforma digital onde os seus criadores de conteúdo (que podem ser qualquer pessoa), podem monetizar diretamente o seu trabalho, oferecendo acesso exclusivo aos seus seguidores através de assinaturas pagas –, e o Patreon – criado também com a intenção de conectar criadores com o público. Ambas funcionam, por isso, como um serviço de assinatura em que os fãs podem se tornar patronos e, em troca, ganham acesso a materiais exclusivos. É verdade que existe uma grande variedade de conteúdos que vão desde o fitness, à culinária, às arte e à educação. No entanto, estas plataformas são conhecidas sobretudo pelos conteúdos explícitos que nela são partilhados.

Bella Bellux tem 27 anos, considera-se uma pessoa muito transparente e acredita que toda a gente é única. “Sou cansativa, intensa e interessante”, afirma ao i. Em dezembro de 2022 criou a sua conta no Patreon. “Estive até fevereiro a render forte. Assim que criei a minha conta, tornei-me bastante ativa. Publicava coisas todos os dias. Gosto de dinheiro fácil e encontrei aqui um lugar para isso”, revela. A jovem artista garante não ter pudores. “Gosto de mim, gosto do meu corpo e tenho um peito perfeito. Por isso, comecei a vender fotos dos meus seios por 100 euros cada uma”, admite. Mas não era apenas isso. Além deste conteúdo mais explícito, partilhava vídeos do seu dia-a-dia, as suas histórias, as coisas que ia vivendo. Os seus amores e desamores. “A assinatura normal era 20 euros (conteúdos mais quotidianos e ‘normais’) –, a premium (que dava acesso a conteúdos mais explícitos do meu peito) era 100 euros”, explica. Em dois meses, Bella Bellux conseguiu fazer 8 mil euros.

Interrogada sobre a sua opinião sobre a maneira como as pessoas veem esta atividade, a jovem acredita que ainda existe muito preconceito relativamente à nudez. “Acho que as pessoas são muito cobardes e perdem demasiado tempo a pensar em coisas que não fazem sentido. ‘O meu corpo, as minhas escolhas, as minhas regras!’. Eu amo o meu corpo e acho que não custa nada, nem magoa ninguém. Nunca vou tirar as cuecas, atenção. ‘My pussy, my temple’. Nunca vou mostrar nada disso. Mas os seios são uma coisa tão natural. Eu faço topless, por isso não vejo a diferença”, conta, acrescentando ser ativista e feminista. “Quero quebrar tabus”, afirma. Bella Bellux não sabe se a sua família tem ou não conhecimento, mas também não pensa muito nisso. Além disso, defende que não existem perigos no Patreon. “Não vejo perigos no Patreon. A malta comunicava comigo, eu comunicava com ela e sempre tudo na base do respeito. Ainda tenho a minha conta, mas o pessoal deixou de assinar e eu perdi um bocadinho a motivação. Pode ser que regresse!”, aponta.

Os perigos da plataforma

Segundo Nuno Correia de Brito, professor de Comunicação Estratégica na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Politécnico de Leiria e Investigador Integrado do ICNOVA da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, a utilização da tecnologia nas nossas vidas é cada vez mais intensa e mais alargada. “Há muito que o ciborgue representado em filmes como o Blade Runner (1982) deixou de ser uma ficção. A tecnologia está presente em todas as dimensões humanas, condiciona e oferece novas possibilidades à forma como nos relacionamos socialmente e connosco próprios”, afirma o especialista. “A sexualidade humana, como dimensão comportamental, também está a alterar-se graças à presença da tecnologia”. De acordo com o mesmo, a utilização de plataformas digitais com múltiplas funcionalidades e possibilidades é uma realidade, desde a oferta de conteúdo erótico e pornográfico, chats de conversação, comunidades e encontros amorosos e sexuais. “A sua utilização é ainda mais evidente nos grandes complexos urbanos”, explica. Tanto o OnlyFans como o Patreon, continua o professor, são mais uma marca que permite a partilha de conteúdo, não necessariamente sexual e pornográfico: “No entanto, tem-se celebrizado pelo acesso exclusivo de conteúdos para adultos, especialmente de figuras públicas”. “Muitos teóricos falam desta confusão entre a esfera pública e a esfera privada, graças à presença da tecnologia. Efetivamente, permite-nos criar ‘bolhas’ onde conteúdo circula entre os seus subscritores ou membros de uma comunidade/ grupo”, conta Nuno Correia de Brito, acrescentando que uma questão que se prende com este tema é o facto dos promotores destas plataformas terem acesso a uma grande quantidade de dados sobre os utilizadores. No entanto, “esses dados – possibilitados através de ferramentas de SEM (Marketing Digital), para medir o comportamento e as preferências dos públicos –, podem gerar situações ilegais e abusivas”. “Situações irregulares poderão surgir sobre o comportamento e as preferências sexuais dos utilizadores e que, ilegalmente, poderão ser utilizadas com fins comerciais ou outros”, alerta o professor.