Abilio Diniz. Um luso-brasileiro de sucesso

1936-2024. A cara do grupo Pão de Açúcar.

Era luso-brasileiro e tinha um império no Brasil. Abilio Diniz, fundador do Pão de Açúcar, morreu esta semana, aos 87 anos. Com descendência portuguesa – o pai era da zona de Pinhel – viveu no Brasil e, apesar de hoje ser um dos empresários mais acarinhados e bem-sucedidos do Brasil, teve uma infância não muito abastada.

Era o mais velho de seis irmãos e cresceu numa casa dos fundos de uma padaria que se chamava Doceria Pão de Açúcar, em São Paulo.

Mais tarde formou-se em gestão e fez estágios em várias redes de supermercados em França e nos Estados Unidos, assumindo depois, já com experiência e ao lado do pai, o comando da rede de padarias familiares. Por essa altura, em 1963, ainda eram pequenas. Mas em 1971 já conseguia liderar esse segmento na América do Sul.

E o negócio foi crescendo. De tal forma que criou ainda a Associação Brasileira de Supermercados e também o Jumbo, que foi a primeira rede de hipermercados do país. O sucesso – e a agilidade para o negócio – era de tal forma que conseguiu fazer abrir o primeiro supermercado dentro de um centro comercial e também as primeiras farmácias abertas 24 horas.

Os anos foram prosperando, o empresário foi abrindo muitas lojas mas não ficou sempre à frente da marca que ajudou a erguer.  22 de junho de 2012 ficará sempre guardado na história de Abilio Diniz. É nesta data que o empresário passa para o grupo francês Casino o comando do Pão de Açúcar, num discurso emocionado, deixando aberta a porta para um futuro acerto de contas entre os sócios. Nessa data, o presidente-executivo e do conselho do Casino, Jean-Charles Naouri, foi eleito como novo chairman da Wilkes, holding controladora do Grupo Pão de Açúcar.

No entanto, apesar da emoção, essa mudança já era esperada desde 2006, altura em que o Casino comprou o controlo do Grupo Pão de Açúcar. Por essa altura, foi definido que o comando seria transferido ao grupo francês em junho de 2012. O Casino investiu pela primeira vez no Pão de Açúcar em 1999, quando resgatou o grupo de grandes dificuldades económicas. Só que essa disputa acabou por ganhar outros contornos quando, um ano antes, em 2011, Abilio Diniz tentou romper esse acordo ao propor uma fusão da companhia brasileira com o um dos principais concorrentes do Casino, o Carrefour. Sem sucesso.

Apesar da saída, nunca esqueceu o grupo que ajudou a criar. À revista Exame chegou a dizer: «O Pão de Açúcar é o meu ADN. O Pão de Açúcar vai comigo onde eu for».

O grupo esteve ainda em Portugal. O Pão de Açúcar era, em Portugal, uma cadeia de supermercados que pertencia ao grupo francês Auchan. Nesse segmento, o dos hipermercados, usava a insígnia Jumbo. No entanto, tanto a marca Jumbo como a Pão de Açúcar terminaram em 2019, passando a existir uma marca única: Auchan. Mas nessa altura, Abilio Diniz já não pertencia ao grupo.

Deixando a empresa que sua família ajudou a fundar, o empresário comprou em 2014 uma participação acionária no Carrefour, com a qual concorria na época do Pão de Açúcar. Além do Carrefour, Abilio tinha investimentos na rede de padarias Benjamin, Wine e na Oncoclínicas (grupo de clínicas especializado no tratamento de cancro).

No nosso país, a primeira loja Pão de Açúcar abriu em Lisboa, na Avenida Estados Unidos da América, a 1 de maio de 1970. Exatamente meio ano depois, a 1 de novembro de 1970, abria a segunda loja em Lisboa, em Alcântara, na Avenida de Ceuta. Uma das maiores lojas Pão de Açúcar do país estava fixada na Cova da Piedade em Almada, onde abriu em 1972. O sucesso foi tanto que vinham pessoas de todo o país para conhecer a loja que fechou em 2002. Ao lado existia uma rotunda que ainda é hoje conhecida como ‘Rotunda Pão de Açúcar’.

Foi em 1996 que  a rede foi adquirida pelo grupo francês Auchan.

A imprensa brasileira diz que o sucesso nos negócios fez de Abilio Diniz um dos homens mais ricos do país. No Brasil, ocupava a 31.ª posição no ranking de bilionários da revista Forbes (1526.º no mundo), e deixa uma fortuna estimada em quase 1,9 mil milhões de euros.

O futuro dos negócios da família será agora conduzido por uma holding de investimentos Península Participações, apesar de Abilio Diniz ter cinco filhos.

Apesar de ter saído do grupo, Abilio Diniz – que foi casado duas vezes e teve quatro filhos do primeiro casamento e dois do segundo – continuou sempre a trabalhar. Mas o último ano da sua vida não foi fácil. Um ano e meio antes de perder a vida, o luso-brasileiro perdeu um filho, vítima de um enfarte fulminante aos 58 anos. «A dor que sinto é inexplicável», escreveu nessa ocasião num texto publicado nas redes sociais. Naquele que para Abilio Diniz foi «o golpe mais duro» da sua vida, o empresário garantia nessa altura: «Não sei como vou conseguir viver sem você».

Um ano e meio depois, foi o pai que foi vítima de insuficiência respiratória derivada de uma pneumonia. Estava internado  no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. «É com extremo pesar que a família Diniz informa o falecimento de Abilio Diniz aos 87 anos neste domingo, 18 de fevereiro de 2024, vítima de insuficiência respiratória em função de uma pneumonite. O empresário deixa cinco filhos, esposa, netos e bisnetos, e irá ao encontro do seu filho João Paulo, falecido em 2022. Desde já, a família agradece a todas as mensagens de apoio e carinho», escreveu a família em comunicado.

O empresário era ativo nas redes sociais. Um mês antes de falecer, a 17 de janeiro, publicou um vídeo onde aparece na neve. «Adoro o frio e os esportes de neve. Esse é o meu programa favorito das férias de janeiro». Mas já por essa altura mostrava alguns problemas de saúde, como o próprio escreveu: «Neste ano, infelizmente, não conseguirei esquiar porque estou me recuperando de duas cirurgias no joelho, mas só de estar aqui em contato com toda essa beleza da natureza já me sinto feliz e energizado». Mas a vontade de recuperar era muita. «Sei que logo estarei 100% para descer a montanha com o esqui no pé ao lado da minha família e amigos», desejava.

Uns dias antes, falava sobre o legado que deixaria. «Sempre me perguntam qual é o legado que eu quero deixar mas confesso que nunca me preocupei com isso». E acrescentava: «A minha preocupação sempre foi a de buscar, em vida, ser uma pessoa feliz, que pratica o bem e que compartilha conhecimento».

A verdade é que Abilio Diniz  era tido como o grande visionário do setor onde trabalhava e foram várias as figuras públicas – como Lula da Silva – que lamentaram o seu desaparecimento.