Os desenvolvimentos do conflito na Ucrânia fazem soar os alarmes na NATO, principalmente na Europa, e fazem com que a Aliança se apresse em redesenhar a sua estratégia. Os últimos tempos não têm sido tranquilos para as potências ocidentais, que se encontram numa encruzilhada entre os conflitos no Médio Oriente e na Europa de Leste. A ameaça de Vladimir Putin é cada vez mais real e, ainda que isso seja encarado com unanimidade, as propostas de ação não têm encontrado o mesmo destino.
O Presidente francês, Emmanuel Macron, proferiu declarações controversas na terça-feira, ao referir a possibilidade do envio de tropas da NATO para território ucraniano. Caso fossem postas em prática, poderiam ser o fio condutor de um conflito à escala global. A sugestão foi prontamente rejeitada pelos restantes Estados-membros da Aliança.
Mas nem tudo é mau para a Organização do Tratado do Atlântico Norte, que deu um passo importante na segunda-feira, após a ratificação da adesão da Suécia por parte do parlamento turco, quebrando o impasse. Os suecos tornam-se assim o trigésimo segundo membro.
A ideia francesa
As declarações de Macron foram responsáveis por uma (ainda) maior agitação das hostilidades no que ao conflito ucraniano diz respeito. A ideia de enviar tropas para o terreno seria o passo final para a entrada numa nova guerra mundial cujos limites não são conhecidos nem fáceis de prever. O próprio Presidente francês convocou uma cimeira em Paris, que contou com cerca de vinte líderes europeus, e admitiu que «não há consenso para apoiar oficialmente [a Ucrânia] com tropas no terreno. Dito isto, nada deve ser excluído». Os alemães, que se preparam para aumentar o seu gasto em matéria de Defesa, lideraram a oposição. O chanceler, Olaf Scholz, garantiu: «Não haverá tropas no terreno nem soldados em solo ucraniano enviados por países europeus ou países da NATO». Posição que foi reforçada pelo seu Ministro da Defesa, Boris Pistorius: «Não é uma opção para a Alemanha».
Também os Estados Unidos, principal pilar da Aliança, avançou que não tem quaisquer planos para enviar tropas. Uma posição prudente e até expectável, porque mesmo que fosse essa a intenção da administração Biden, haveria uma grande probabilidade de ser impedido pela Câmara dos Representantes, de maioria republicana. E assim seria porque há meses que o apoio americano à Ucrânia tem sido inviabilizado devido a disputas internas.
O Presidente francês talvez tenha ido longe demais, e o Kremlin não deixou passar as declarações em branco, abordando a «inevitabilidade de um conflito direto» caso as tropas ocidentais lutassem em solo ucraniano. É necessário que o Ocidente segure a Ucrânia para garantir a superioridade da ordem internacional liberal, mas um eventual conflito global é certamente assustador e seria prejudicial para os próprios objetivos ocidentais.
O reforço no Báltico
Entretanto, o impasse sueco chegou ao fim. O Parlamento da Hungria, o único Estado-membro da Aliança que faltava, ratificou a entrada da Suécia na NATO.
Os países bálticos, dada a proximidade geográfica com a Rússia, são naturalmente os que levantam mais preocupações. Mas, com a adesão sueca, o Mar Báltico, ou Lago NATO, como o têm denominado ironicamente online, fica mais protegido. A entrada da Suécia vem também aliada à promessa de fazer chegar à Ucrânia caças de quarta geração, os JAS39 Gripen, fabricados pelos suecos da SAAB.
Como já tinha sido referido num artigo anterior, sem a Suécia na equação aumentaria a dificuldade de execução de medidas urgentes no Norte da Europa. Mas os escandinavos não vêm acrescentar apenas poderio militar, já que a adesão é um reforço político igualmente importante, representando um golpe para as esperanças russas de desordem e desunião, que são normalmente criadas pela Hungria e pela Turquia, no seio da Aliança.
Também a vontade sueca, após dois séculos de neutralidade militar, é uma clara declaração de intenções enviada para Moscovo, que já reagiu, lamentando o alargamento e garantindo que será prejudicial para a região «anteriormente uma das regiões mais estáveis do mundo».
Já Ulf Kristensson, o primeiro-ministro sueco, afirma que foi «um dia histórico» e que «a Suécia está pronta para arcar com a sua responsabilidade na segurança Euro-atlântica».
O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, expressou o seu contentamento pela ratificação por parte da Assembleia húngara e assegurou que «a adesão da Suécia vai tornar-nos mais fortes e seguros».
Viktor Orbán e o seu partido exigiam a visita dos suecos a Budapeste para procederem à aprovação, e Estocolmo, após alguma fricção inicial, acabou por aceder ao pedido, e Kristersson deslocou-se à capital da Hungria para acertar os detalhes finais. O primeiro-ministro húngaro, após várias mudanças de posição quanto ao assunto, avançou que foi aberta «uma nova fase de cooperação entre a Hungria e a Suécia».
A novela chegou ao fim e a Europa e a NATO ficam mais fortes num momento crucial, em que a guerra, por enquanto ainda às portas do continente, se torna cada vez mais uma ameaça para os restantes países europeus.
Stoltenberg, no dia em que se cumpriram dois anos do início do conflito, manifestou o apoio incondicional da Aliança aos ucranianos, chegando até a admitir que a adesão da Ucrânia «não é uma questão de ‘se’ mas de ‘quando’».
Uma hipótese que será altamente improvável, se não impossível, no decurso da guerra, mas funciona como garantia de segurança e é uma declaração de que será feito o possível para não deixar cair os ucranianos, já com os olhos postos na reconstrução do país e do próprio tabuleiro geopolítico.