A reciprocidade

A atual situação de instabilidade foi criada pelo primeiro-ministro, que decidiu demitir-se com base num inócuo parágrafo de um comunicado da PGR.

Depois das eleições para a Assembleia Constituinte em 1975 e das eleições legislativas de 1976, o sufrágio do próximo dia 10 será o mais importante na história política do país.

Não é de excluir, embora não seja desejável, que o próximo ato eleitoral possa ser apenas a ‘primeira volta’ de nova consulta, a realizar num período máximo de um ano.

A atual situação de instabilidade, foi criada pelo primeiro-ministro (PM), que decidiu demitir-se com base num inócuo parágrafo de um comunicado da PGR.

Sem a explicação necessária e com os dados conhecidos, esta crise surge, mais como um “capricho” de António Costa do que provocada por razões de interesse nacional.

Mas face à situação política internacional, as próximas eleições são inoportunas e perigosas. Sendo inoportunas e perigosas serão também desafiantes pois podem corresponder a um momento de viragem política.

Neste contexto, o que deve ser pedido aos políticos que se apresentam a eleições é lucidez, competência, sentido de estado, urbanidade e, sobretudo, verdade.

A evolução macroeconómica, as suas consequências no quotidiano dos cidadãos, o ritmo da produtividade e a influência no nível de competitividade, as políticas de emprego e de investimento, enfim, as contas certas, com esclarecimento do seu objetivo e dos fatores exógenos que as tornaram possíveis, são temas para a campanha eleitoral.

Mas também é importante que se discuta, analise e perspetive, o verdadeiro estado social do país e se conheçam as diferentes propostas para o tornar mais “amigo” do cidadão comum.

Saúde, educação, segurança, justiça e habitação são temas incontornáveis até porque são setores onde as políticas públicas se tem revelado insuficientes.

O mesmo se passa com a necessidade de uma reflexão profunda sobre o papel e o destino de Portugal no contexto europeu que está, hoje, em claro ajustamento e adaptação a uma nova realidade que alterará os atuais centros de decisão, afastando-os da periferia.

No entanto, a análise de todos estes vetores, útil para uma escolha consciente no próximo dia 10 de março, tem estado quase ausente do debate ou tem sido abordada de maneira incompleta e superficial.

Pode argumentar-se que esta é uma responsabilidade exclusiva dos candidatos, mas este juízo é apenas, na melhor das hipóteses, uma meia verdade.

A comunicação social em geral, mesmo procurando (normalmente com pouco êxito) descodificar as propostas eleitorais, optou, quase sempre pelo mais fácil, fixando-se nos cenários pós eleitorais.

E sobretudo assumiu o palco que devia ser deixado aos verdadeiros protagonistas. Um exemplo: o debate entre os dois principais candidatos a PM, foi analisado e avaliado nas TVs, antes e depois da sua realização, por 39 comentadores, que ocuparam longos tempos de antena.

Da barulheira que daí resultou, só se fixou a questão dos cenários para a governação, esquecendo-se, aliás, que esta é uma decisão que vai sempre depender do julgamento final do Presidente da República.

Não parece, de resto, que este assunto mereça tanta atenção mediática pois o essencial está esclarecido.

A AD não fará qualquer acordo, de governo ou parlamentar, com o partido da extrema direita (não, é não) e o seu líder só aceitará ser primeiro ministro se ganhar as eleições.

O PS e o seu líder governarão se ganharem as eleições ou farão uma aliança de governo com BE e PCP (nova geringonça) se, não as ganhando, conseguirem uma maioria à esquerda.

São estas as opções cujo conhecimento é importante pois no primeiro caso estaremos perante uma rutura clara com o modelo de governo estabelecido por António Costa e no segundo perante a continuação desse modelo.

Este confronto artificial, com mais ou menos exigências de reciprocidade, só serve para desviar a atenção dos problemas existentes e para impedir uma boa discussão sobre as propostas alternativas apresentadas.

Resta confiar que o bom senso dos eleitores resolva a questão.