Receosos de que o resultado eleitoral pudesse ter sido ainda pior do que acabou por acontecer, os socialistas reorganizam-se agora para o que aí vem.
Pedro Nuno Santos garantiu que vai estar na oposição e que, na noite eleitoral, começou o trabalho para a recuperação eleitoral dos socialistas. Nesta declaração houve quem lesse nas entrelinhas que “agora é que Pedro Nuno vai começar a liderar o partido, livre das amarras de António Costa”. Será que sim? É a dúvida que subsiste num partido que se habituou a estar no poder nos últimos oito anos, dois dos quais em maioria absoluta.
O rombo sofrido na bancada socialista (o partido perdeu 43 deputados e passou de 120 lugares obtidos em 2022, para 77, não estando ainda apurados os lugares dos votos da emigração), é de difícil digestão, sobretudo para os muitos candidatos a deputados que julgavam ter a sua eleição garantida.
Apesar das garantias de unidade dadas pelo Secretário Geral na declaração de derrota, a verdade é que nos bastidores há muitos que duvidam da estratégia seguida por Pedro Nuno Santos e que consideram que o partido deve fazer uma reflexão aprofundada sobre o futuro.
Também a aparição de António Costa na sede de campanha dos socialistas e a sua declaração, chegando mesmo a assumir a responsabilidade pela derrota, espoletou várias leituras. Alguns socialistas que ouviram a declaração, viram nela um sinal de que António Costa quis mostrar que continua presente e tem planos para o futuro. Para outros, foi uma aparição para mostrar que se tivesse sido o ex primeiro ministro a ir a votos, o resultado talvez tivesse sido outro.
A verdade é que o partido socialista pós eleições de 10 de março pode vir a viver dias conturbados. Entre a adaptação ao regresso à oposição e a manutenção de um clima de unidade que se mostrou durante a campanha eleitoral, podem surgir divergências difíceis de resolver. Nos próximos tempos, o cimento do poder, que costuma unir as máquinas partidárias, deixou de existir e esse pode ser um problema sério para a liderança de Pedro Nuno Santos.
Pedro Nuno seguro para já
A derrota foi pesada mas não chegou a atingir os níveis que evidentemente poriam em causa a liderança de Pedro Nuno Santos. A forma como o líder socialista assumiu a derrota e definiu claramente o futuro do partido, deixou a maior parte das vozes mais críticas sem discurso. O “acabou o tempo da tática política”, frase com que o secretário-geral afastou cenários para os socialistas tentarem manter-se no poder apesar da derrota, foi visto com agrado por parte da maioria dos socialista, que ouviram essa afirmação como uma demarcação clara da era Costa.
O facto de os socialistas terem ficado a uma distância mínima do resultado obtido pela AD é também um fator que joga a favor de Pedro Nuno Santos que, todos reconhecem, teve muito pouco tempo para se preparar para enfrentar estas eleições.
A segurar a liderança está também o facto de que as próximas eleições estão já à porta. Em junho os eleitores são de novo chamados às urnas para elegerem os deputados ao Parlamento Europeu. São umas eleições que os socialistas não dão por perdidas, até porque os resultados das legislativas lhes permitem acreditar que é possível obter uma vitória.
Os 28,6% alcançados por comparação com os apenas 29,2% conseguidos pela Aliança Democrática deixam os socialistas confortáveis para acreditarem que Pedro Nuno Santos tem ainda provas para dar. Tudo razões para acreditar que nos próximos meses o líder socialista pode contar com o partido unido à sua volta.
Rivais atentos
Para já não se pode falar em críticos ou candidatos à sucessão, mas a liderança de Pedro Nuno Santos está sob escrutínio.
À medida que as últimas sondagens antes das eleições foram surgindo e foram antecipando a derrota nas eleições, apoiantes de José Luís Carneiro não deixaram de notar que, durante a campanha interna para a sucessão de António Costa, os estudos indicavam que o ainda ministro da Administração Interna estava em melhor posição para vencer as eleições. O próprio terá afastado qualquer cenário de desafiar a liderança de Pedro Nuno Santos fosse qual fosse o resultado e não estará disponível para ponderar uma nova candidatura nos tempos mais próximos.
A aposta dos mais críticos, ou menos próximos do atual líder socialista é a de não lhe dificultar a vida, até porque, com o cenário saído de eleições, é muito incerto quando poderá haver nova ida às urnas.
Fontes ouvidas pelo nosso jornal dizem no entanto que a prova de fogo estará na forma como Pedro Nuno Santos vai orientar a sua estratégia de oposição no Parlamento.
Ao que nos dizem, uma coisa é não ser a muleta da AD, outra é atirar Montenegro para o colo do Chega, ajudando desta forma a um crescimento do partido de André Ventura, ainda mais acelerado. Por outro lado, há uma fação do partido que considera que o PS tem de ser muito cauteloso na forma como gere a sua oposição a um governo minoritário da AD. O mais provável é que, depois das eleições de domingo, o cenário seja de regresso a governos minoritários e o crescimento da direita não deixa antever que seja provável o regresso a uma maioria de esquerda na Assembleia da República. Os socialistas devem portanto precaver futuros governos minoritários liderados por si e, nesse cenário, não podem confrontar-se com um Parlamento fraturado e sem pontes de diálogo entre os, ainda, dois maiores partidos.
É nesta gestão de equilíbrios difíceis que Pedro Nuno Santos vai estar a ser avaliado pelos seus pares e eventuais rivais. E é durante o percurso que tem pela frente que o atual líder pode encontrar oposição. Acresce que o secretário geral socialista quer agora iniciar o seu ciclo e mudar o rumo até aqui seguido por António Costa, e o virar de página no partido também promete não ser um percurso fácil. No Largo do Rato são muitos os que defendem o legado de Costa e a necessidade de que não seja esquecido, até porque ninguém acredita que o ainda primeiro-ministro tenha posto os papéis para a reforma.