A mudança e contra-mudança do logótipo do Governo português deve ser analisada à luz do método iconológico de Erwin Panofsky. O historiador da arte alemão propôs três formas de analisar uma obra de arte: pré-iconográfica (vemos um homem numa cruz), iconográfica (identificamos Jesus Cristo) e iconológica (encontramos na obra informações sobre a sociedade que a produziu).
Se fizermos uma análise iconográfica do logótipo criado por Eduardo Aires, vemos um ovo estrelado acompanhado por uma salada de alface e tomate. Até aqui está tudo bem pois, como o objetivo da mudança de logótipo era ser inclusivo, ele é atingido: toda a gente aprecia um ovo estrelado com uma salada. É certo que parece haver mais tomate do que alface – e isso pode ofender os entusiastas das verduras – mas, caramba, temos de ter em conta que o licopeno do tomate protege a próstata. É também verdade que os puristas do ovo estrelado também se podem sentir ofendidos por este não estar no ponto certo – mais tostado e com uma cor alaranjada. E nem vou falar da possibilidade de incluir batatas fritas e uma alheira de Mirandela.
Como se vê, tudo isto é muito complexo e, quando combinamos ovos, vegetais e a História de Portugal, é fácil semear ofensas e agravos. Porém, o verdadeiro problema não está na análise iconográfica do novo logótipo, mas sim na sua análise iconológica. Que informações nos dá sobre a sociedade portuguesa do século XXI em que a obra foi produzida? O que ficamos a saber sobre a mentalidade e cultura dos portugueses no presente? Nada, exceto a referida preferência gastronómica.
Ora, em vez de ser inclusivo, o logótipo exclui toda a gente. No anterior logótipo – agora reposto – os castelos, as quinas e a esfera armilar incluíam quase mil anos de História e os milhões de portugueses que nos precederam. No logótipo de Eduardo Aires ficou apenas o gosto ancestral pelo ovo estrelado com salada. É pouco.
Portanto, é preciso um novo logótipo verdadeiramente inclusivo que una o passado com o presente. E como no presente os temas que mais interessam aos portugueses são a ideologia de género, os direitos dos animais e as alterações climáticas, é preciso colocar mais ingredientes sobre a bandeira nacional. A saber: a padeira de Aljubarrota com jeans e botas Doc Martens, um daqueles gatos idiotas japoneses que não param de dizer adeus e, claro, a efígie da Greta, zangadíssima.
Portanto, Eduardo Aires, seja verdadeiramente inclusivo, não exclua ninguém, em todas as famílias há ladrões e meretrizes, e mostre o nosso querido, progressista e fantástico Portugal como deve ser.
P.S. – Considero o designer Eduardo Aires um grande artista.