Um novo dia… virá!

Eu acredito naquele provérbio chinês: ‘Não amaldiçoes as trevas, acende uma luz’.

Estou no centro de Lisboa a trabalhar. Os bairros são históricos, mas de histórico tem só as pedras. No cimo de uma das colinas de Lisboa está o bairro do castelo. Ali vivem pouco mais de meia centena de habitantes. Um pouco mais abaixo está o bairro de Alfama, Santiago, que é casa de meia dúzia de pessoas. Depois tenho duas paróquias da Mouraria que, novamente, se povoaram de Mouros vindos de todas as partes do mundo…

Gosto de viver aqui… gosto de trabalhar aqui, mesmo que não tenha muita gente aqui. Numas missas tenho meia dúzia de fiéis, noutras tenho pouco mais de uma dúzia, no entanto, tenho a certeza que a minha missão está para lá daqueles que vivem permanentemente aqui e que vêm à missa. Na verdade, tenho pensado muitas vezes, por exemplo, que tenho muito poucos paroquianos na Igreja do Castelo, mas tenho três milhões de pessoas a passar em frente da Igreja!

Vejo, então, que tenho de preparar as minhas Igrejas para os meus ‘paroquianos’ de cinco minutos. É verdade! No centro de Lisboa, bem como de todas as capitais europeias, a desertificação é enorme. Por isso, tenho de chegar aos visitantes com pequenos programas de cinco minutos!!! Algo que os toque num encontro com a beleza, que acredito ser Cristo, nos poucos minutos que nos visitam!

Eu acredito naquele provérbio chinês: «não amaldiçoes as trevas, acende uma luz». É incrível como passamos a nossa vida a lamentar-nos do presente de trevas com saudades das luzes do passado. Aliás, se nos lembrarmos bem dos nossos avós, eles já diziam o mesmo: antigamente…

O Evangelho leva-nos a olhar para o futuro… para a frente… porque para a frente está Jesus Cristo. Se hoje não tenho os milhares de paroquianos que tinham estas paróquias no passado, também é verdade que tenho milhões de peregrinos da beleza que nos visitam por alguns minutos.

É por isso que, mesmo com pouco paroquianos, mesmo com pouco dinheiro, mesmo sem nada, procuro fazer um trabalho envolvente da comunidade que tenham relevância cultural e que nos ajude a avançar… Então, estou a lançar um projeto integral e comunitário para restaurar a Igreja do Castelo e acredito que traremos novamente a beleza até aos nossos olhos.

Penso, ainda, que a beleza dos templos, das igrejas, dos palácios, dos hotéis, contrasta com o horror que estamos a viver em Lisboa. Se por um lado é um horror aos nossos olhos ver a quantidade de imigrantes e refugiados e gente fugida da pobreza a viver em tendas de campismo nas ruas de Lisboa, é verdade que este horror se torna mais gritante vivido na primeira pessoa. Lembro que, quando trabalhava na paróquia de Camarate, ouvi uma cabo-verdiana que me dizia: “Padre, eu vivia em Cabo Verde numa casa pequenininha, mas era uma casa. Quando cheguei aqui a Lisboa, chorei durante um ano. Vim viver para uma barraca.

Eu não posso deixar de olhar o horror contrastante dos milhares de turistas que estão dentro de Tuks, em marcha lenta, a ver as boas vistas, enquanto debaixo de umas escadas há uns cartões e uns cobertores. Ali vive gente…

A beleza que nós queremos restaurar, não nos pode deixar de tal modo insensíveis que nos faça esquecer da beleza do encontro com os homens e as mulheres. Porque tratar das pedras dos monumentos é mais fácil do que encontrar-se com as pedras vivas, que são as pessoas.