Faltam cinco dias para as eleições que definirão a nova constituição do Parlamento Europeu, com a organização das famílias políticas mais à direita de Bruxelas a prometer dar que falar. Há vários cenários possíveis e a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, será o elemento decisor de uma nova conjuntura.
A direita e a extrema-direita têm crescido de forma transversal a toda a Europa e têm cada vez mais uma palavra a dizer no momento de decidir. Apesar de algumas divergências, os dois grupos mais à direita em Bruxelas – os Conservadores e Reformistas e o Identidade e Democracia – poderão formar um bloco único, representando assim uma alteração bastante significativa no jogo de forças do parlamento. Analisando as últimas sondagens da Euronews, uma fusão deste tipo colocaria a nova agremiação política como a segunda força europeia com mais deputados, só atrás do Partido Popular Europeu, deixando o grupo dos socialistas e dos liberais em terceiro e em quarto, respetivamente.
Divisão no ID
Há também a possibilidade de criação de um novo grupo ainda mais à direita na sequência da divisão do ID, onde o Alternativa para a Alemanha (AfD) – da extrema-direita alemã – viu Marine Le Pen, líder do partido francês União Nacional, colocá-lo à margem dos seus planos futuros.
Os alemães são suspeitos de receber dinheiro de Moscovo e de Pequim e Maximilian Krah, eurodeputado do AfD, é alvo de duas investigações por parte do Ministério Público alemão. Como se não fosse suficiente, o cabeça de lista do AfD a estas eleições ainda afirmou que nem todos os membros das SS, a organização paramilitar do III Reich, deveriam ser considerados criminosos.
Perante isto, e com a necessidade sucessiva de vir justificar declarações dos alemães, Marine Le Pen afirmou que o AfD já não lhe parece “um aliado fiável e adequado”por ser“um movimento que caiu sob o domínio da sua franja mais radical”. Ainda assim, esta divisão necessária pode trazer problemas a Le Pen e ao ID, porque se a fusão com os Conservadores e Reformistas não acontecer ficarão debilitados. A francesa tinha já declarado ao jornal francês Le Monde que “é difícil vislumbrar uma estratégia europeia que ignore os alemães. É o elefante na sala”.
O possível novo grupo
A extrema-direita – a real – tem a possibilidade de se ver representada a solo no Parlamento Europeu, ainda que seja difícil.
A oferta de criação deste novo grupo veio do de Kostadin Kostadinov, líder do partido Vazrazhdane, da extrema-direita búlgara, que partiu para o ataque: “Isto são muito boas notícias [a exclusão do AfD do ID] porque temos agora a oportunidade de criar um grupo realmente conservador e soberanista no Parlamento Europeu”. Kostadinov acrescentou que não permitirá a continuação “do atual e dominante regime liberal-fascista”e que os seus“amigos alemães podem contar connosco, tal como todas as outras forças políticas europeias que pensam como nós”.
Criar um novo grupo, de modo a não perder as regalias que pertencer a um oferece, parece ser a única opção que o partido alemão tem, mas não vai ser tarefa fácil.
Para a inscrição de um novo partido ser válida, este terá de contar com, no mínimo, vinte e três eurodeputados provenientes de pelo menos sete Estados-membros. A revista The European Conservative aponta os possíveis integrantes desta nova família: os húngaros do MHM, os polacos do Konfederacja, os neerlandeses do FvD, os checos do SPD (membros do ID) e até os democratas suecos (membros do ECR). Todos estes partidos assinaram uma declaração de cooperação e amizade intitulada «Por uma Europa de Nações Livre».
Ainda assim, não parece ser este o caminho que a liderança do AfD pretende trilhar, mesmo que com alguns membros – como Maximiliam Krah – a desejarem independência em relação à liderança do partido dominado por Marine Le Pen. Um oficial do AfD disse à The European Conservative que “são os búlgaros que necessitam de ajuda urgente do AfD na campanha, só fazem isto para se fazerem parecer interessantes”. Declarações fortes e que dão a entender que ainda pode haver espaço para renegociar a permanência no ID, como ficou claro no comentário ainda da mesma fonte: “Não necessitamos de mais conflito e escalada, para que todos os membros do ID tenham o melhor resultado possível”, acrescentando ainda que o “grande número de assentos do AfD não pode ser ignorado pelo ID”.
O pragmatismo de Meloni
Como já foi referido – e abordado mais a fundo na última edição do Nascer do SOL –, Giorgia Meloni guarda a chave do futuro da direita europeia e, por isso, tem sido sondada tanto por Marine Le Pen quanto pela própria presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen.
Le Pen disse ao jornal italiano Corriere della Sera que “é o momento de nos unirmos [ID e ECR]. Não podemos deixar escapar uma ocasião como esta”, claramente numa tentativa de seduzir a primeira-ministra italiana e ex-líder do grupo dos Reformistas e Conservadores.
Tal fusão poderia ainda afetar a escolha do novo presidente da Comissão Europeia, ainda que, e com disse o politólogo Francesco Nicoli à Euronews, “mesmo que criem um grupo conjunto, isso não significa que o grupo conjunto vá votar de forma coerente”. Mas, e para prevenir um possível cenário em que não conseguiria o apoio suficiente para ser reeleita como presidente da Comissão, Ursula Von der Leyen e o Partido Popular Europeu (PPE) abrem as portas a Meloni há já algum tempo, sendo alvo de críticas por isso. Mas, e como disse um dos pais da realpolitik, Otto Von Bismarck, “a política é a arte do possível”.
Falando em Bismarck e em pragmatismo, a líder do Fratelli d´Itália mostra que essa é uma das suas imagens de marca.
Giorgia Meloni quer “construir uma maioria alternativa aquela que tem governado nos últimos anos. Uma maioria de centro-direita que deixará a esquerda na oposição”, mas não fecha a porta a novos aliados, demonstrando jogo de cintura.
Na eventualidade de ser bem sucedida nesta sua estratégia, a primeira-ministra italiana tornar-se-á numa das maiores figuras da direita europeia recente.