As eleições europeias, por regra, quase não têm história: A abstenção acompanha o desinteresse pelo que se passa no Parlamento Europeu para um eleitorado consciente de que o poder de decisão da UE_está concentrado no eixo franco-alemão, na Comissão e no Conselho Europeu.
Luís Montenegro surpreendeu tudo e todos com a escolha do cabeça de lista da AD às eleições para o Parlamento Europeu.
Rui Moreira era o nome de quem mais se falava já há muito tempo, estava no seu último mandato como presidente da Câmara do Porto e já cumprira praticamente tudo o que projetara para a cidade e a presidência do FC Porto deixara de ser hipótese com a entrada de André Villas-Boas na corrida contra Pinto da Costa.
O próprio autarca portuense, nas vésperas dos conselhos nacionais do PSD e do CDS para aprovação da lista de candidatos, admitiu publicamente que poderia estar disponível para o desafio europeu.
Foi, por isso, ainda maior a surpresa quando o nome anunciado foi o de Sebastião Bugalho, jovem comentador político da SIC-Notícias e do Expresso, que passara pela CNN-Portugal, pelo DN e pelo Observador depois de ter feito o estágio de jornalista no SOL e no i, onde começou como cronista.
No ínterim, teve uma fugaz passagem pela política, concorrendo como candidato independente a deputado à Assembleia da República pelas listas do CDS, a convite da amiga Assunção Cristas, nas legislativas de 2019, recusando ocupar o lugar de Ana Rita Bessa semanas antes de o Presidente Marcelo dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas.
Mas Sebastião Bugalho estava predestinado para a política, que sempre ambicionara.
Pela mão de Luís Montenegro, entrou pela porta grande e sem pedir licença a ninguém.
Diga-se o que se disser e seja qual for o resultado destas europeias, goste-se ou não se goste da personalidade ou da personagem, com todas as suas muitas qualidades e também todos os seus defeitos, estas ficarão para a história como as ‘eleições do Bugalho’.
Com efeito, as eleições europeias são sempre eleições sem história, com uma abstenção correspondente ao desinteresse do eleitorado pelo que se passa no Parlamento Europeu, numa União Europeia em que o poder de decisão se concentra no eixo franco-alemão e no que os seus líderes concedem delegar na Comissão Europeia.
Tudo junto e somado, com debates centrados em temas para os quais é absolutamente irrelevante o que Portugal pensa, quer ou pode fazer (para além de andar de mão estendida ou à cata de lugares), e com as tradicionais arruadas que já não mobilizam ninguém, o que fica para a história é mesmo o batismo de fogo de Bugalho na política.
E daí que estas sejam mesmo ‘as eleições de Bugalho’.
Fosse Francisco Paupério o candidato do PS e ainda poderia repartir a menção – mas como dá a cara pelo Livre e dificilmente conseguirá um resultado fora de todas as previsões ou possa ambicionar ter um grande futuro no partido de Rui Tavares…
Veja-se, por exemplo, o efeito que teve o anúncio da cabeça de lista do PS praticamente em simultâneo com o da AD.
Marta Temido, ex-ministra da Saúde, presidente da concelhia do PS e nome mais falado para liderar uma plataforma de esquerda nas autárquicas do próximo ano contra a AD de Carlos Moedas, foi, por isso mesmo, ela própria uma surpresa como número um do PS ao Parlamento Europeu.
Até por relegar para lugar secundário Francisco Assis, que se destacara naturalmente pelo apoio dado a Pedro Nuno Santos nas eleições diretas que ditaram o sucessor de António Costa como secretário-geral socialista.
Ainda por cima, porque Marta Temido não tomou posição na disputa entre Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro, mantendo uma neutralidade muito mal entendida entre os próprios camaradas.
E, mais, logo atrás de Francisco Assis surge
o nome de Ana Catarina Mendes, também
ela ex-ministra, mas com um percurso e um peso político no Partido Socialista sem qualquer comparação com a antiga titular da pasta
da Saúde a quem António Costa entregou
o cartão de militante no Congresso
de Portimão em 2021.
Mas a verdade é que o efeito surpresa da sua candidatura se esboroou mal se soube o nome do candidato da AD.
Porque Bugalho, sim, foi mais surpreendente.
Mesmo sendo uma carta que já fazia parte do baralho, movendo-se nos bastidores da bolha política como peixe na água.
Sebastião Bugalho até pode não ganhar as eleições deste domingo – não tem essa obrigação nem daí resultarão consequências maiores. Mas entrou na política e foi para ficar.
Por muito tempo, que a sua juventude tem essa vantagem.