Há três meses, os polícias enchiam páginas de jornais e abriam telejornais com os seus protestos, reivindicando um suplemento de missão, vulgo de risco, igual ao que o Governo de António Costa atribuíra à Polícia Judiciária. Nessa altura, oficiais e agentes da PSP, bem como guardas e oficiais da GNR, além dos Guardas Prisionais, estavam unidos nas mesmas reivindicações: todos sonhavam com mais de mil euros na sua conta pessoal, o que, no casos dos agentes da PSP, quase duplicava o salário. Seguindo o modelo da PJ, as contas eram simples: o diretor nacional da PSP levaria para casa mais 30% do ordenado do seu colega da PJ, o da GNR idem aspas. Depois, as contas baixavam para a casa dos 20% no que diz respeito aos diretores nacionais adjuntos, sendo que praticamente todos os restantes elementos da PSP e da GNR ficariam com um subsídio de 15% dos 6800 euros do ordenado de Luís Neves, responsável máximo da PJ.
Todos os sindicatos da PSP, com os oficiais à cabeça, e as associações socioprofissionais da GNR, que formaram a Plataforma, prometiam não dar tréguas ao novo Governo se este não fosse ao encontro das suas reivindicações. Bruno Pereira, líder do sindicato dos oficiais da PSP e membro da Plataforma, dizia mesmo ao Nascer do SOL: «Se o próximo Governo não apresentar soluções, vamos ter um problema muito sério».
Depois do Executivo de Luís Montenegro tomar posse, as divisões na Plataforma começaram a ser evidentes, com alguns a não quererem que o subsídio de missão tivesse percentagens diferentes para oficiais e restante pessoal. O sindicato dos oficiais ter-se-á mostrado sensível a esses argumentos, mudando de posição, e a luta passou a ser igual para todos, mas com uma alteração significativa. Percebendo que 1020 euros para três mil inspetores da PJ são uma coisa completamente diferente do que 1020 euros para os mais de 40 mil GNR e PS, além de que os Guardas Prisionais, os inspetores da Autoridade tributária e os militares iriam exigir o mesmo, na Plataforma começou a desenhar-se outra forma de pagamento do respetivo subsídio, tentando chegar a um acordo com o Governo. Enquanto o sindicato dos oficiais e a ASPP, o principal sindicato da instituição, aceitaram negociar valores mais baixos, que andarão na casa dos 400 e poucos euros, pagos faseadamente ao longo dos próximos dois anos – este subsídio acumularia com outro já atribuído, na casa dos cem euros –, já na Plataforma as divisões tornaram-se evidentes e o SINAPOL, liderado por Armando Ferreira, continua a defender um subsídio gémeo do da PJ. «Nós, entretanto, achámos que a aplicação dessa forma automática ou absoluta não era ágil e iria ser pior a emenda do que o soneto», esclarece Bruno Pereira. Paulo Santos, da ASPP lembrou a reunião do Porto, na sexta-feira, após a qual a plataforma dos sindicatos da Polícia de Segurança Pública (PSP) e as associações da Guarda Nacional Republicana (GNR) anunciaram que irão apresentar uma “última contraproposta” sobre o subsídio de risco, para “dar possibilidade” ao Governo de resolver o assunto “de forma responsável”.
Por outro lado, Bruno Pereira disse ainda ter “uma réstia de esperança, remota e ínfima, de que o Governo caia em si e possamos resolver isto”.
“De outra forma não sei. As pessoas estão completamente exaustas e, ainda por cima, estamos há seis meses nisto. Acho que, literalmente, os sindicatos vão perder o total controlo de mobilização, estabilização, de apelo à serenidade, eu não sei, porque isto vai passar a ser tomado por movimentos totalmente inorgânicos. E há de haver pulsões internas das massas que, provavelmente, terão efeitos danosos, naquilo que é a segurança pública deste país. Disso não tenho a mínima dúvida», disse Bruno Pereira.
Armando Ferreira, do SINAPOL, não acredita que as opiniões diferentes enfraqueçam a Plataforma. «Se tiver de haver uma manifestação, estarão lá todos os sindicatos e as associações».
O Governo tem tentado convencer os sindicatos com outras regalias que compensem as exigências da Plataforma, mas tudo indica que o máximo a que a ministra Margarida Blasco conseguirá chegar é aos 10% do salário do diretor nacional… da PSP. A ministra, contudo, ainda não desistiu de convencer os sindicatos, e tentará outra reunião para procurar chegar a bom porto. Se não o conseguir, sabe que poderá haver outra vez uma ‘guerra’ de ‘secos e molhados’.
‘É preciso tomar medidas, antes que as medidas tomem conta de nós’
A Associação Comercial do Porto (ACP) enviou uma carta à ministra da Administração Interna para que sejam implementadas medidas urgentes, tendo em conta o aumento da criminalidade e insegurança na cidade. Ao Nascer do SOL, o presidente Nuno Botelho reconhece que Margarida Blasco tomou posse recentemente, daí afastar totalmente a sua responsabilidade, mas refere que deve estar a par da situação e tirar consequências disso.
O responsável afasta o aumento da imigração por esta situação, no entanto, justifica com a existência de um muito maior número de pessoas na cidade. «O Porto tem hoje mais turismo, mais imigrantes, mais negócio, mais pessoas a circular e havendo mais pessoas haverá probabilidade de haver mais crime». E, a somar, de acordo com o responsável, há que contar com o facto de existir menos policiamento ou de este ter menos visibilidade. «Uma das coisas que pedimos é que haja mais visibilidade por parte da Polícia, mais presença física, porque há um sentimento e uma perceção de insegurança muito maiores». E acrescenta: «Não queremos viver numa cidade em que o Estado se demite de uma função que consideramos fundamental. Vemos com preocupação a criação em determinados bairros da sociedade, associação de moradores que constituem segurança privada, o que pode gerar coisas muito perigosas e levar a extremismos».
Para Nuno Botelho, «é preciso tomar medidas antes que as medidas tomem conta de nós». E refere também que este clima de insegurança e medo generalizado afeta não apenas na população residente, mas também os milhares de turistas que visitam diariamente o Porto e que constituem um ativo económico imprescindível para a cidade e para a região.