Foi com a naturalidade esperada que Portugal venceu um grupo de latagões finlandeses que estão muito longe de formar uma equipa de verdadeira categoria, ficando uma nota de exceção para o já entradote Teemu Pukki, agora a gozar a pré-reforma no Minnesota United, lá para a outra banda do Atlântico, nos Estados Unidos. Aliás foi ele o jogador que mais problemas criou a uma Seleção Nacional meio híbrida, formada por titulares indiscutíveis e por mais uns que, provavelmente não sairão do banco durante a fase final do Europeu, apontando dois golos, ambos fruto de facilidades concedidas pela defesa portuguesa. Dizia o treinador Markku Kanerva, na véspera do jogo de Alvalade, que a grande ambição do seu conjunto passava por marcar um golo a Portugal que tão raramente os sofre. Pois nos últimos dois jogos sofreu nada menos do que quatro, o que deverá fazer com que Roberto Martinez se debruce sobre uma certa permissividade que não é da absoluta responsabilidade do quarteto defensivo e começa, isso sim, por alguns jogadores do meio campo e do ataque que se baldam às suas funções de recuperação de bola, sendo o caso mais evidente o de Francisco Conceição que, apesar de ter alegrado o povoléu com uma série de números circenses, pareceu sempre mais preocupado em jogar para mostrar qualquer coisa do que propriamente pensar nos companheiros. O facto é que, tirando o passe (fácil e obrigatório) para o pontapé lindíssimo de Bruno Fernandes, Conceição pareceu uma peça deslocada dentro de um desenho que tentava seguir determinado número de regras antecipadamente programadas.
Portugal venceu o primeiro dos seus três jogos de qualificação, utilizou 16 dos 26 convocados para o Euro (com Ronaldo e Pepe ainda indisponíveis), mas permitiu algumas facilidades que é necessário corrigir no momento de entrar em campo no próximo dia 18, em Leipzig, contra os checos.
Outro estilo
Se a Finlândia, apesar de evidenciar uma evolução nos últimos anos, é uma equipa, por assim dizer, de arranca-pinheiros, fazendo da força física dos seus jogadores uma arma de arremesso, o próximo adversário, a Croácia, que joga no Jamor já amanhã, pelas 18h45, vai colocar à Seleção Nacional outro tipo de problemas. Finalista do Mundial de 2018, na Rússia, semifinalista no Mundial de 2022, no Qatar, os croatas têm apresentado nos últimos anos a capacidade competitiva de uma equipa que vive à base da técnica, vendo bem aquilo que nos tem faltado. Diz a história que são nossos cliente, se a expressão me é permitida. Desde 1996, em Nottingham, num jogo a que assisti na minha estreia em fases finais de Campeonatos da Europa como jornalista, e que ganhámos por 3-0, até ao último, em novembro de 2020, em Zagreb, a contar para a Liga das Nações (3-2), disputaram-se sete encontros com seis vitórias portuguesas e apenas um empate, num particular datado de setembro de 2018. Sabemos que se a nossa vida não se repete, a história por vezes teima em repetir-se. Veremos o que têm para mostrar os rapazes das gravatas.
A nomenclatura é curiosa e vem aqui a propósito contá-la. Fomos buscar a palavra gravata ao francês ‘cravate’ que, por seu lado, é uma corruptela de ‘croat’. Ora, como se chegou até aqui? Eu explico. Durante a Guerra dos Trinta Anos que, entre 3 de maio de 1618 e 15 de maio de 1648 envolveu a quase totalidade das então nações da Europa central e do norte, estando como de costume Inglaterra e França de um lado e do outro os alemães do Sacro Império Romano-Germânico, despoletada por uma verdadeira confusão de rivalidades religiosas, dinásticas, territoriais e comerciais, um grupo de mercenários croatas apresentou-se em Paris, em 1635, colocando-se às ordens do rei Luís XIV e do Cardeal Richelieu. Se Paris sempre foi a capital da moda, os franceses deixaram-se impressionar pelas imponentes fardas dos croatas que, ainda por cima, contemplavam o requinte de um lenço em roda do pescoço, atado com um nó.
A gravata, como lhe chamaram, passou a ser um elemento tão elegante que mereceu um livro posteriormente publicado: La Grande Histoire de la Cravate. É de truz! Às tantas surge a explicação do nome do adereço palavra a palavra: «O traje tradicional destes soldados despertou interesse por causa dos cachecóis incomuns e pitorescos enlaçados em seu pescoço. Os cachecóis eram feitos de vários tecidos, tanto de material grosseiro para soldados comuns a seda e algodão para oficiais. Os franceses logo se encantaram com esse adereço elegante e desconhecido, que chamaram de ‘cravat’, numa adaptação da palavra croata». Enfim, o tempo passou, como só ele sabe, irreversivelmente, e hoje os croatas não são mais conhecidos por causa das gravatas. Chamam a atenção, sobretudo, as suas camisolas os quadradinhos vermelhos e brancos. Esse xadrez, que faz parte do brasão de armas da Croácia, é um símbolo dos reis croatas pelo menos desde o século X, e é símbolo oficial de uma genealogia da família dos Habsburgos datada de entre 1512 e 1518. Do futebol vai-se a toda a parte, já dizia o meu querido mestre Carlos Pinhão. Com gravatas ou aos quadradinhos, a Croácia está aí. E cada vez há menos areia na ampulheta para que o Euro seja a doer.