As notícias sobre uma nova crise política à vista na Região Autónoma da Madeira podem ser manifestamente exageradas. Ao que o Nascer do SOL apurou junto de fontes políticas que estão a acompanhar o processo no Funchal, mas também junto da Presidência da República, o facto de Miguel Albuquerque ter adiado por mais algumas semanas a votação do programa de governo na Assembleia Regional faz parte de um caminho que conduzirá a um consenso negociado com a Iniciativa Liberal e com o Chega que permitirá a viabilização do novo governo madeirense.
Nos últimos dias, o PSD/Madeira apresentou no parlamento regional um programa de governo em que, à semelhança do que aconteceu com o Governo nacional da AD de Luís Montenegro, procurou incluir algumas propostas escolhidas avulso dos programas eleitorais dos restantes partidos, como demonstração de vontade de diálogo com a oposição.
Depois dos resultados das eleições de 26 de maio, os sociais-democratas da Madeira viram-se a braços com um resultado muito difícil de gerir. O PSD_ganhou inquestionavelmente as eleições, mas ficou a cinco deputados da maioria absoluta, e nem o acordo firmado com o CDS poucos dias depois das eleições permite ao novo governo garantir os votos suficientes para fazer passar o seu programa. Mesmo que aos dois deputados do CDS se juntem os deputados únicos do PAN e da IL, a soma fica a um deputado da maioria.
A chave para que o governo de Albuquerque possa seguir em frente tem necessariamente de passar pelo PS, pelo JPP ou pelo Chega e, nos dias seguintes às eleições regionais, nenhum destes partidos quis arriscar o anúncio de uma disponibilidade para o viabilizar, até porque o país ia a votos poucos dias depois para umas eleições europeias que todas as forças políticas encararam como essenciais para definir estratégias para o futuro.
Cedências ao Chega deverão permitir a viabilização
Ganhar tempo e começar a negociar é a aposta de Miguel Albuquerque para chegar a um programa que possa ser viabilizado por uma das forças políticas que lhe faltam. As fontes ouvidas pelo nosso jornal garantem que a aposta será numa negociação com o Chega, mostrando disponibilidade para elaborar um novo programa a apresentar à Assembleia Regional que inclua algumas das bandeiras deste partido. «Até aqui não houve qualquer tipo de negociação, agora é que nos iremos sentar à mesa» e o «pragmatismo» é a palavra chave que poderá conduzir a um entendimento aparentemente impossível.
Para chegar a um acordo, os sociais-democratas esperam que os apelos da sociedade civil, precocupada com uma nova crise e com a possibilidade de não verem um orçamento aprovado para o ano de 2024, possam fazer o seu caminho junto dos deputados eleitos do Chega. Nos últimos dias, vários setores tornaram pública a sua preocupação com o prolongar da crise política na Região Autónoma. O facto de não ter sido aprovado um orçamento até agora está a colocar em causa a prestação de alguns serviços contratualizados com o governo regional e, sobretudo, impede que os funcionários públicos possam ser aumentados, à semelhança do que aconteceu em todo o país.
A insatisfação popular é, assim, a maior ajuda com que Albuquerque conta para levar o partido de André Ventura a recuar na sua recusa em aprovar o programa de governo, que permita que o processo orçamental de 2024 possa ser concluído.
«Ao mesmo tempo, é importante que ao longo destes dias vão surgindo outras figuras do PSD para além dos mesmo de sempre. Temos de romper a ideia de que estamos agarrados ao poder», diz-nos uma fonte do PSD/Madeira. No Funchal há a convicção de que é muito importante começar a identificar um número dois e um número três que sinalizem uma era pós-Albuquerque.
Ireneu mais preocupado do que Marcelo
Os próximos dias vão ser agitados para o representante da República da Madeira, Ireneu Barreto, até porque na oposição há quem o responsabilize pela instabilidade política na região, ao ter dado posse a Miguel Albuquerque sem garantias de que o programa de governo poderia ser aprovado. Face aos desenvolvimento dos últimos dias, Ireneu Barreto voltou a ouvir os partidos nesta quinta-feira e espera novas garantias de Albuquerque.
Em Belém, garantem ao Nascer do SOL que o Presidente não está preocupado nem pondera ter que convocar novas eleições na Madeira. Ao que nos foi dito, os resultados de dia 26 de maio provam que uma nova ida às urnas não resolverá o impasse e os partidos, particularmente o Chega, quererão dar um sinal de responsabilidade, obtendo com isso alguma vantagem.
Então para que serviu o debate destes dias? A resposta aponta para o calendário eleitoral que se vivia nos dias seguintes ao sufrágio madeirense. As europeias terão levado os partidos a radicalizar as suas posições e Albuquerque a aceitar fazer este compasso de espera.
Os próximos dias serão determinantes e as negociações políticas, verdadeiramente, só agora vão começar. Os resultados destas negociações, acredita-se na Presidência, vai evitar uma nova ida às urnas na Região Autónoma, e o Chega é o partido que terá mais vantagem em viabilizar o Governo se tiver um bom caderno de encargos para apresentar e que pode incluir um cenário de sucessão de Albuquerque.