Europa. Acordo fechado

O Conselho Europeu chegou a acordo quanto aos altos cargos da União durante o jantar informal. Costa será presidente do Conselho, Von der Leyen ainda terá de obter maioria no Parlamento Europeu.

A reunião formal do Conselho Europeu, que teve ontem início e que hoje termina, deveria ser o encontro decisivo para a atribuição dos mais altos cargos da União Europeia – presidente do Conselho Europeu, presidente da Comissão Europeia e Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança. Isto porque o ainda presidente do Conselho Europeu, o belga Charles Michel, garantiu à saída do jantar informal da semana passada que «não houve qualquer acordo» e que as negociações iriam continuar para que na reunião do Conselho nestes dois dias se chegasse a uma conclusão.

Mas a verdade é que já é sabido que os nomes de António Costa, Ursula von der Leyen e Kaja Kallas ficaram definidos como certos no jantar informal da semana passada, ficando apenas por acertar alguns pormenores, designadamente para garantir a passagem da presidente da Comissão e da Alta Representante na votação no Parlamento Europeu. O que significa que as declarações de Michel, possivelmente por não querer anunciar um acordo desta importância num evento informal, não correspondiam totalmente à verdade.

De PM demissionário a presidente do Conselho

António Costa vai ser, assim, o próximo presidente do Conselho Europeu. O ex-primeiro-ministro português, que se demitiu no passado dia 7 de novembro como consequência de uma investigação que envolve o seu círculo próximo, será o primeiro português a presidir a esta instituição europeia no período pós-ratificação do Tratado de Lisboa. Ficou então definido que passaria a haver uma figura individual a presidir aos trabalhos do Conselho Europeu por um mandato renovável de dois anos e meio.

Antes de 2009, a presidência assumia um caráter rotativo, algo que ainda existe no Conselho da União Europeia, no qual se reúnem os ministros dos Estados-membros e que assume funções legislativas e adota o Orçamento Geral da União Europeia em conjunto com o Parlamento Europeu.

Costa, mesmo antes de estar confirmado, aparecia como nome mais certo de todos. Isto porque o seu processo de eleição é o mais simples, necessitando apenas da aprovação de 55% dos Estados-membros desde que estes representem pelo menos 65% da população da União.

Assim, e com o apoio da Alemanha de Scholz e da Espanha de Sánchez garantido, com o da França de Macron bastante provável e ainda com boa parte dos chefes de Estado ou de Governo cujos partidos integram o Partido Popular Europeu (PPE), a presidência do Conselho Europeu para o ex-primeiro-ministro português era já dada quase como certa.

A eleição de von der Leyen

Por isto, é assim possível que os socialistas venham a apoiar a eleição de von der Leyen na sua reeleição como presidente da Comissão, mas não é garantido. Ana Catarina Mendes, eurodeputada do PS e recém-eleita vice-presidente da bancada do S&D disse que «estão a decorrer negociações para os mais altos cargos», mas julga não ser «este o momento para dizer [se apoiam von der Leyen ou não]».

A alemã é assim a figura que terá mais dificuldades na sua eleição, uma vez que precisa de maioria no Parlamento Europeu e é difícil haver uma homogeneidade total na votação, mesmo que, e ao que tudo indica, o ‘centrão’ – composto pelos populares, socialistas e liberais – já tenha chegado a um acordo para que os três principais cargos não lhes fujam na próxima legislatura. 

Por sua vez, o Renew poderá vir a ser o quinto grupo do Parlamento e o PPE terá de apoiar a nomeação de Kallas para contar com a votação dos liberais para a reeleição de von der Leyen. 

Também a família dos Verdes está descontente por ficar à margem, e caso não haja concessões poderão votar contra a candidata do PPE.

Mas, na eventualidade de ceder a tais exigências, o apoio de alguns membros do PPE e do Renew – partido que mais favorece a indústria – pode ficar comprometido.

A ostracização de Meloni

O acordo ao centro, que, e como já foi referido, ficou consumado no jantar informal da passada semana, deve ter sido o motivo pelo qual a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, saiu da reunião em Bruxelas com cara de poucos amigos.

Como foi escrito no Nascer do SOL em edições anteriores, Meloni gozava de uma posição de poder e foi ‘cortejada’ tanto por von der Leyen quanto por Marine Le Pen, cujo partido lidera o Identidade e Democracia (ID) – o grupo mais à direita no Parlamento Europeu. 

A italiana, parte integrante e pilar principal dos Conservadores e Reformistas (ECR), não se precipitou e deixou que o tempo lhe fosse oferecendo cada vez mais margem de manobra. 

Já que o pragmatismo é uma das suas principais características, Meloni sabia que, e mesmo fazendo parte da terceira força política europeia com mais assentos, seria incapaz de colocar um dos seus nos mais altos cargos, dada a falta de representação no Conselho Europeu, onde o seu único parceiro é o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán.

Mas a líder do Fratelli d´Italia esperaria certamente ter uma palavra a dizer, algo que não aconteceu. Giorgia Meloni foi excluída das negociações, talvez também como parte do jogo político dos partidos ao centro que temem a sua associação à direita mais radical.

Porém, esta ostracização poderá levar Meloni a procurar uma aliança com o ID, uma fusão que tinha vindo a ser colocada à margem, mas que pode voltar a ganhar forma. Os grupos fecharão no dia 8 de julho, mas a distribuição de lugares será feita no dia 4, talvez para se realizar antes da segunda volta das eleições legislativas francesas, porque, mesmo que não tenham influência na distribuição, podem alterar o ambiente político em Bruxelas.

Posto isto, as certezas da Cimeira do Conselho Europeu que hoje encerra já o eram há uma semana. 

Os líderes dos Estados-membros discutirão ainda temas de incontornável importância, como a adesão da Ucrânia à União Europeia, a situação em Gaza e a reformulação da política de segurança.