Das reguadas aos ‘Le Pen’ da política

Tenho a sensação de vivermos uma época onde a moderação, o centro, e o bom senso não imperam no debate público.

Um destes dias intrometi-me numa conversa de um grupo de pessoas de avançada idade que relatavam as memórias dos seus professores de escola primária. Falavam das reguadas dadas e do pau de marmeleiro usado por alguns desses professores para castigar qualquer comportamento que saísse da rígida disciplina que esses professores consideravam adequada em sala de aula – tempos de má memória. Pessoalmente tive o privilégio de um professor primário com leitura humanista e pedagoga dessa tão importante função. A conversa desse grupo seguiu pelas memórias desses tempos e da forma agressiva e autoritária com que muitos professores lidavam com crianças, até que a dada altura alguém afirma que na atualidade é ao contrário; «são os pais de algumas crianças e até algumas crianças que agridem os professores». Essa magnifica conversa rapidamente concluiu aquilo que parece evidente: passámos de um extremo para outro e ambos são obviamente inaceitáveis à luz de uma sociedade que se pretende justa, humanista e equilibrada.

Serve esta nota introdutória, não para falar de pedagogia (tema hiper importante quando queremos abordar a construção de uma sociedade equilibrada), mas para chamar à atenção para as oscilações e movimentos políticos que as atualidades Europeias e Mundiais nos trazem. Tenho a sensação de vivermos uma época onde a moderação, o centro, e o bom senso não imperam no debate público, porventura por ausência de líderes e organizações que os defendam com convicção extrema. Vivemos uma época onde o bizarro, o extravagante, a calúnia, o perverso, a intriga e a mexericada ganham ao civismo, ao mérito e ao reconhecimento do bom e do belo.

A atualidade política próxima mostra-nos precisamente essa oscilação constante, como que a sociedade e os eleitores estejam à procura daquilo que tarda em aparecer: a estabilidade. As sociedades ocidentais são hoje governadas aos ‘Ss’ e aos solavancos. Há falta de equilíbrio, há falta de centro, há falta de bom senso.

O Reino Unido passou, de forma abruta e em derrocada, dos Conservadores para os Trabalhistas, em França passou-se numa 1.ª volta ganha pela direita extremista para uma segunda volta ganha pela esquerda extremista, nos EUA vive-se um extremar de posições entre Democratas e Republicanos e na maioria dos países esta é a realidade da atualidade.

É evidente que os extremos são semelhantes, mas como nos polos da eletricidade, repelem-se violentamente e por isso o mundo está cheio de guerras – pequenas e grandes. A falta de centro, a falta de bom senso a falta de fazer bem feito constitui campo fértil para a progressão dos extremos, cuja posição é sempre conflituosa. É também evidente que a falta de competência reinante nos políticos da atualidade (infelizmente não é um fenómeno exclusivamente português) facilita o discurso fácil e radical que os extremos usam para ganhar apoio popular. O excesso de despesa pública sem retorno para o cidadão, a falta de obra pública e a falta de políticas públicas orientadas para a qualidade de vida das pessoas são campo fértil para a confusão instalada.

Falta quem de forma radical ocupe o centro político do civismo, da meritocracia, do trabalho político para a qualidade de vida das sociedades e das pessoas. Falta efetivamente fazer bem feito para que os radicais miraculosos ‘metam a viola no saco’ e a sua ‘banha da cobra’ seja apenas isso mesmo.

CEO do Taguspark, Professor universitário