Caiu do palco? Perdeu um sapato? O comício foi interrompido por um tiroteio? Meios de comunicação social ditos de referência – internacionais, como a CNN, e nacionais, como o Expresso – resistiram o que puderam a dar a notícia a que todo o mundo já estava a assistir em direto: Donald Trump fora alvo de um atentado, uma bala passou-lhe a raspar na face, ferindo-o na orelha, o candidato republicano manteve uma frieza de espírito notável, deitando-se no chão como mandam as regras de segurança e levantando-se quando os seguranças o permitiram, quebrando o protocolo para erguer o punho e gritar para a multidão que não desistirá de lutar – com sangue no rosto de quem não se deixa intimidar nem se verga ao medo que se transformará (já o é) na imagem de marca/ícone desta campanha e que ficará para a história.
Quer se queira, quer não.
Quer se goste de Trump, quer não se goste.
É o que é. Não há nada a fazer.
Claro que as teorias da conspiração não demoraram a aparecer e era ver as vozes costumeiras nas incontáveis TVs nacionais de informação deste país com um mercadozinho tão pequenino a perorar sobre o «tiroteio» e o «incidente» da Pensilvânia.
Senhoras e senhores (como se usa dizer), estava na cara (literalmente na de Trump) que se tratara de um atentado contra a vida do candidato presidencial dos Estados Unidos da América, de uma tentativa de homicídio do tão odiado ex-Presidente americano agora recandidato dos republicanos.
É verdade que as falhas de segurança e as quebras de protocolo foram mais do que muitas e algumas delas verdadeiramente inconcebíveis.
A começar por ter sido possível que um fedelho de 20 anos escalasse para o telhado dum edifício a 120 metros do palco onde Trump discursava e conseguisse tomar posição, apontar e disparar uma arma semiautomática contra o candidato presidencial sem que as autoridades policiais e, em particular, os serviços secretos, tivessem dado por nada.
E a acabar na forma como os agentes secretos da segurança pessoal de Trump o deixaram exposto depois de o reerguerem do chão, permitindo que se mostrasse à multidão de punho erguido e peito feito, bem como ao transportarem-no para a viatura em que saiu do local, tornando-o alvo fácil para um eventual segundo atirador.
Mas daí a admitir tratar-se de uma encenação daquelas sobre a qual laboraram tantos ‘especialistas’ e ‘observadores’ das TVs internacionais e nacionais vai a distância nem sei lá do quê… Absurdo, ridículo.
E não é que são esses precisamente os mesmos comentadores que sentenciam sobre os perigos das fake news e das redes sociais e sobre a crise dos media e do jornalismo e sobre a falta de credibilidade e de confirmação das notícias e a manipulação dos factos e das imagens e das mensagens…
Pois é… a verdade é que não há maior cego que aquele que não quer ver.
O wokismo ou a cegueira ideológica não podem condicionar a informação e o jornalismo.
E não vale a pena falar de bom e de mau jornalismo, de polígrafos ou outros quejandos programas de fact checking.
Quando se fala em jornalismo, só pode falar-se de bom jornalismo, com informação confirmada e desprovida de uma carga ideológica que o separa da propaganda ou da desinformação.
A crise dos media é real e muito por culpa dos grandes editores, que começaram por baixar os preços da publicidade numa suicidária política de descontos para combater a concorrência, dão a informação gratuita a toda hora em cada vez mais canais de TV exclusivamente de informação e na web, e depois queixam-se é das redes sociais e da internet e afinam as notícias e a opinião publicada pelo politicamente correto e pela agenda dos poderes políticos e económicos dominantes dos quais se deixaram tornar dependentes.
Ora, os media subjugados ou submissos ao poder, ou aos poderes, politicamente seguidistas e financeiramente insustentáveis (queimadas que foram as suas receitas tradicionais das vendas ao público, pela oferta de informação gratuita, e da publicidade, pelas baixas dos preços), deixaram-se transformar em instrumentos do poder, em vez de se afirmarem como meios de escrutínio e de contrapoder, que é a sua original e nobre função.
E o que hoje mais temos é um enorme desinvestimento da grande indústria da informação no jornalismo – na razão inversa da aposta em influencers e entertainers que cativam audiências e agradam aos detentores dos verdadeiros poderes que não gostam de escrutinadores – e o bullying (tantas vezes com criminoso dumping e abuso de posição dominante no mercado) aos projetos de pura e desinteressada informação que, apesar de tudo, conseguiram resistir cumprindo.
Obliterar a verdade que se mostra aos olhos de toda a gente não é o caminho de futuro de uma sociedade que se quer democrática e livre.
Mas é essa a tendência gritante dessa autoestrada da (des)informação e da aldeia global que é a web, que a grande indústria dos media não só não soube aproveitar como a ela não soube responder.
E o jornalismo é que perde, para mal geral. Sobretudo de uma sociedade que peca por excesso de informação e por estar mal informada neste tempo em que a grande indústria dos media dá cada vez mais tiros nos pés, que estão há muito descalços… E assim caiu do palco!
Trump calçou-se.