UTAD. “A internacionalização faz parte do nosso plano estratégico”

O reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Emídio Gomes, diz que os alunos internacionais já rondam os 1.100 num total de nove mil e conta com 50 nacionalidades.  Mas admite que a grande aposta são os alunos provenientes dos países da CPLP têm registado um peso crescente entre a comunidade estudantil. A ideia é capacitar os…

O reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Emídio Gomes, diz que os alunos internacionais já rondam os 1.100 num total de nove mil e conta com 50 nacionalidades.  Mas admite que a grande aposta são os alunos provenientes dos países da CPLP têm registado um peso crescente entre a comunidade estudantil. A ideia é capacitar os alunos com o objetivo de contribuírem para o desenvolvimento dos seus países e têm vários exemplos de alunos que regressaram.

A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) tem vindo a apostar na captação de estudantes estrangeiros e isso é visível no crescimento de 75% de número de candidatos internacionais na 1.ª fase de candidaturas ao ano letivo 2024/25. A que é se deve esta aposta?

Uma universidade é por definição um espaço aberto e virado ao exterior. A internacionalização faz parte do nosso plano estratégico e do futuro da própria universidade e tem duas dimensões. Por um lado, o espaço da lusofonia e dentro desta temos os países da CPLP. E dentro do espaço a CPLP tomámos uma decisão que teve muito impacto no mercado ao decidir este ano que, a partir deste ano letivo 24/25, qualquer estudante de língua portuguesa, seja de Moçambique,  Angola, Guiné-Bissau, Brasil, Timor Leste ou do Porto, de Lisboa, de Faro ou de Vila Real paga exatamente o mesmo valor das propinas. Foi uma decisão histórica da universidade.

Qual é a diferença?

Nas licenciaturas, por exemplo, em relação ao nosso valor que é imposto pelo Governo e que é tabelado estamos a falar de uma redução superior a 50%. No entanto, tomámos a decisão de unificar o valor das propinas para todos os estudantes oriundos de países de língua portuguesa, a começar pelo nosso próprio país. Isto teve um impacto forte. A outra dimensão da internacionalização no mundo da lusofonia tem a ver com a terceira geração dos nossos emigrantes na Europa, sobretudo França, Alemanha, também um pouco na Suíça e que está muito relacionado com aquela emigração que foi em condições muito difíceis nos anos 60, 70, para França, por exemplo, que vinha cá uma vez por ano, depois com os filhos e sempre olhou para Portugal como o país de onde tinha partido, muitas vezes com dificuldades e com uma coragem enorme. Esta geração que é a geração no fundo dos netos dessa primeira levada de emigrantes tem muita curiosidade em conhecer Portugal de outra forma, inclusive em frequentar o ensino superior em Portugal. Isto é a outra dimensão da lusofonia com que estamos neste momento a articular, por exemplo, através de acordos com França. Tudo isto faz com que, neste momento, a UTAD tenha cerca de 1.100 estudantes internacionais num total de nove mil e temos cerca de 50 nacionalidades diferentes no nosso campus de 120 hectares, onde festejamos uma vez por ano o nosso Dia Internacional, além dos outros eventos e onde funcionamos um pouco como segunda família destes estudantes.

E quais são as nacionalidades mais preponderantes?

São as de língua portuguesa, o Brasil desde logo à cabeça. Depois há ainda Espanha pela proximidade e depois, naturalmente, Angola, Cabo Verde. Há agora um fenómeno muito particular com a Guiné-Bissau, mas aí temos uma particular atenção porque se trata de um fenómeno muito repentino e quando há fenómenos repentinos de crescimento exponencial tendemos a ser cautelosos. Para nós, a internacionalização, sobretudo no mundo da língua portuguesa é sempre olhar para o futuro e para o bem estar desses países, cujos estudantes nos procuram. Não somos um fim de linha para ninguém. Ainda agora estivemos em Moçambique, por exemplo, e o nosso empenho é que esses estudantes regressem a Moçambique.

A ideia então é regressarem sempre ao seu país de origem?

Somos muito persuasivos nessa matéria. Fechámos acordos com o Governo de Cabo Verde para fortalecer, por exemplo, a sua administração pública. Vou dar um exemplo concreto: Cabo Verde está com um crescimento fortíssimo na área do turismo, diria que grande parte das suas receitas externas está relacionada com o turismo ou com as remessas de emigrantes cabo-verdianos. Este turismo em Cabo Verde é muito europeu: Alemanha, Itália, França e coloca uma grande pressão sobre os serviços, nomeadamente serviços de segurança alimentar. Um incidente pode estragar anos de trabalho. Estamos neste momento a fechar um programa para formação de quadros superiores cabo verdianos e formá-los no domínio da segurança alimentar, por isso, é mesmo para que eles regressem. Para nós, a internacionalização é uma afirmação a médio longo prazo. Não é uma necessidade de cobrir vagas em aberto como destino final. Isso é muito importante para nós.

E quando esses estudantes chegam ao nosso país depois deparam-se com problemas de alojamento, com o custo de vida, etc…?

Creio que o custo de vida em Vila Real é mais baixo do que no Porto e em Lisboa. Não estou a afirmar isto com 100% de certeza, mas diria que 99,9 isto é verdade. Portanto, os quartos em Vila Real são mais baratos, temos excelentes cantinas ao preço mais baixo que a lei nos permite que é de 2,75 euros por refeição. Por isso, com muito pouco esforço, com muito pouco dinheiro e com alguma ajuda necessária, os estudantes passam bem em Vila Real e não deixamos ninguém para trás. A única coisa em que somos muito rigorosos é que não há isenções de propinas. Os valores são baixos e iguais para todos. Em todo o universo de estudantes da UTAD, em nove mil estudantes há zero isenções de propina. Mas a seguir fazemos um esforço muito grande para apoiar e para que as pessoas se integrem. Não deixamos ninguém sem teto, não deixamos ninguém com fome. Mas aí é a parte mais fácil que é o de os integrar e também é a parte a que estamos mais atentos. Temos uma coisa para os estudantes africanos, por exemplo, eles chegam com blazers a achar que vêm protegidos para frio, chega a outubro e já acham que é fresco, quando chega a dezembro, janeiro, fevereiro percebem o que é frio a sério e nós temos um armário gigantesco junto à Provedoria do Estudante, chamado armário solidário, onde todos os estudantes passam por lá e levam a roupa que querem de inverno. Depois devolvem ou não devolvem. Há uma enorme rotação. Não queremos saber quem é e temos um modelo instituído de roupas de inverno para os estudantes africanos, sem aquele caráter expositivo da doação, da parte caritativa. Temos um sistema com a nossa Associação Académica de vigilância permanente, em que não deixamos que ninguém fique sem uma refeição durante o dia.

Há um grande movimento de solidariedade…

Solidariedade, sem exposição e com uma preservação muito forte da componente de privacidade. O reitor confia que a Associação Académica faz muito bem este trabalho, pois os estudantes entre eles têm outra forma de se relacionarem e o que queremos é que exista uma grande integração, que eles sintam que haja uma família que os acolhe. Temos muito trabalho na parte das pequenas bolsas sociais e com pouco dinheiro conseguem-se instalar. E o que é um facto é que, por exemplo, em Moçambique há neste momento um crescimento muito grande, porque quem vem, a seguir quer trazer o sobrinho, a sobrinha, o irmão porque sente que em Vila Real há condições para estudar muito, muito, muito atrativas e de envolvimento global, sem aquela coisinha de ‘coitadinhos’. Os estudantes da UTAD têm para nós todos o mesmo estatuto e tentamos fazer com que ninguém note diferenças dentro do campus.

Qual é que é a importância desta aposta na internacionalização? Qual é mais-valia para a UTAD?

O conhecimento a prazo. Em Moçambique quero ser a universidade portuguesa. Isto é um crescimento lento, mas depois será muito sólido. Repare, o Governo Moçambique pediu-nos duas coisas muito concretas a Universidade Eduardo Mondlane se formávamos um conjunto de quadros docentes da Faculdade Medicina Veterinária, porque passa a imodéstia, temos uma formação de nível europeu ou até mundial em ciências veterinárias na UTAD e o nosso doutoramento tem um grande reconhecimento. Eles têm algumas dificuldades. Vamos fazê-lo. E se formávamos um conjunto de alunos de licenciatura na área de Zootecnia e vamos fazê-lo também. Esta gente quando regressar a Moçambique será o nosso maior cartão de visita para o futuro. Os dividendos a prazo vão ser grandes, muito mais do que no imediato. Somos muito cuidadosos na internacionalização. Estamos a falar de pessoas e cada pessoa que recebemos é para nós um ato de responsabilidade.

Esses pedidos foram resultado da recente viagem que fizeram a Moçambique?

Já vem daí. Celebrámos acordos muito concretos e o Governo pediu-nos basicamente três áreas em que precisava de ajuda: infraestruturas públicas, agropecuária e ciências veterinárias. Estamos com um protocolo em Ciências do Ambiente a pedido do Governo Moçambique para  podermos avançar rapidamente neste domínio. Obviamente que estamos abertos a outras áreas, mas gostamos de trabalhar temas onde os resultados apareçam e apareçam sobretudo no país de origem porque isto reforça os elos de confiança.