A União Europeia estabeleceu uma meta ambiental clara e ambiciosa: alcançar a neutralidade carbónica até 2050. Para cumprir essa missão, o setor dos transportes deverá reduzir em 90% as emissões. Portugal, em consonância, definiu outra meta desafiante: reduzir em 50% as emissões até 2030 e assegurar que 30% das mercadorias transportadas por via terrestre utilizem a ferrovia.
São objetivos louváveis, mas a sua concretização está longe de ser simples. O período disponível para a implementação dessas mudanças é curto, e as transformações necessárias são profundas e complexas. O transporte rodoviário, responsável por mais de 25% das emissões de CO2 em Portugal, continua a ter sucessivos apoios diretos e indiretos por parte dos governos.
A isenção de portagens rodoviárias, rede ferroviária limitada e ineficiente, as taxas ferroviárias crescentes (para circular e até para estar parado), em contraciclo com a rodovia, a impossibilidade de circular com comboios superiores a 750 metros (para obtenção de maiores eficiências), são exemplos das diferenças de tratamento entre modos de transporte.
Outras barreiras incluem a falta de igualdade nas condições de operação entre rodovia e ferrovia, como são exemplos a impossibilidade de um maquinista transitar um comboio entre Portugal e Espanha (e com outros países europeus) ou mesmo a impossibilidade de um operador ferroviário poder escolher o seu comercializador de energia em condições de mercado, situação que em Espanha também já foi resolvida, permitindo poupanças energéticas para toda a cadeia de valor.
Se estas desigualdades entre ferrovia e rodovia persistirem, as metas de redução de emissões de CO2 até 2030 não serão possíveis de alcançar.
Portugal não precisa de inventar nada, apenas necessita seguir as tendências dos seus pares. Não precisa de um investimento de milhares de milhões de euros dos contribuintes para fazer mudanças de bitola, como alguns sugerem. A bitola entre Portugal e Espanha é desde sempre a mesma e nem por isso a nossa capacidade exportadora por ferrovia consegue penetrar para além de Madrid, tantos são os processos técnico-administrativos ainda por resolver. Também não é a bitola que limita a atratividade do nosso mercado ferroviário, como de resto demonstra o movimento de aquisições e fusões no espaço ibérico, onde nenhum dos investidores internacionais exigiu aos Estados uma mudança de bitola para poder investir.
Nos últimos anos, Portugal tem-se aproximado do discurso europeu de descarbonização, mas a sua ação é contraditória e acaba sempre por defender o transporte rodoviário.
Veja-se a última medida de abolição de portagens nas nossas estradas, ao mesmo que é dado a conhecer novo aumento das taxas a cobrar pelo uso da ferrovia.
No entanto, há um agente que nunca se deixa iludir com os discursos: o mercado. O pragmatismo do mercado não paga por soluções de transporte mais dispendiosas, ainda que ambientalmente mais sustentáveis.
É crucial que o Governo tome medidas corajosas para eliminar as barreiras que dificultam a competitividade da ferrovia e promova um sistema de transporte mais equilibrado e ecológico. A ferrovia é central na estratégia de descarbonização, mas para isso, precisa de apoio real e continuado.
2030 é amanhã.