Privado e público

Quando uma escola pública é boa, quer dizer que é boa apesar do sistema. Já uma escola privada tem a obrigação de ser pelas condições que tem. Numas e noutras depende essencialmente do corpo docente e dos diretores.

A previsibilidade e a estabilidade são dois dos fatores que mais contam na escolha entre as escolas públicas e privadas. Nas privadas é assim: as listas de material e dos manuais são enviadas aos pais antes da férias. O horário letivo é conhecido quando se matriculam os filhos. O corpo docente é estável e se não é, ninguém dá por isso: não há furos. As atividades extracurriculares são dadas a conhecer em setembro e começam em outubro. As aulas são invariavelmente de manhã e parte da tarde. Nos colégios privados o acesso aos professores é fácil, as regras são claras e não mudam a meio do ano. Também as fardas (quando existem) esbatem as diferenças sociais, financeiras, etc. A autoridade é mais facilmente imposta e há maior flexibilidade em adaptar os métodos pedagógicos aos alunos: corrigir e acertar o tiro ao longo do percurso e conforme as falhas forem detetadas. Há colégios em que as saídas são mais controladas do que outros, em que os telemóveis são proibidos e outros em que não são. O que todas as escolas particulares têm em comum é que todos sabemos ao que vamos quando iniciam as aulas. Umas são mais exigentes que outras, umas mais liberais e outras mais dedicadas a determinadas áreas. É escolher. Os projetos são quase todos diferentes tal como são os alunos e a exigência dos pais.

Nas públicas é assim. Até pelo menos a uma semana antes do início das aulas os pais ainda não sabem o horário ou se as aulas são de manhã ou à tarde, ou de manhã e de tarde. O material escolar é indicado pelos professores quando as aulas começam. O projeto educativo depende da área de residência, não se pode escolher. O corpo docente é uma incógnita e pode ir mudando ao longo do ano. A falta de professores é uma nuvem que paira em cima da escola: pode ser que não haja professores para todas as disciplinas ou que haja e depois faltem. Qualquer mudança obriga primeiro a um projeto piloto e qualquer inovação pedagógica depende da persistência do diretor e da adesão dos professores que não são escolhidos por ele.

A qualidade do ensino nas escolas particulares e públicas pode ser igual, melhor ou pior numas e noutras: não é a sua natureza que determina a qualidade. Numas e noutras depende essencialmente do corpo docente e dos diretores. Mas é um facto que a organização, previsibilidade e estabilidade ajudam. Quando uma escola pública é boa, quer dizer que é boa apesar do sistema. Já uma escola privada tem a obrigação de ser pelas condições que tem. Ou seja, pela liberdade que tem em se ir esturrando e respondendo às necessidades da comunidade educativa (alunos, pais e professores).

Hoje, inscrever os filhos nas escolas privadas já não é sinal de riqueza. Cada vez há mais filhos únicos e netos únicos e as mensalidades são divididas por todos. É apenas sinal de que se dá importância à educação, à estabilidade para se conseguir conciliar trabalho com família e que se desconfia da escola pública para assegurar as duas coisas.

Um quinto dos alunos em Portugal estudam em colégios privados, e como é óbvio um quinto dos alunos não são oriundos de famílias ricas. E o número continua a crescer. Educação gratuita e universal para todos existe. Mas só alguns é que a têm de qualidade porque escolheram ou tem a sorte de viver perto de escolas públicas de qualidade. Os outros pagam, com maior ou menor sacrifício. No meio disto, os colégios são os que mais beneficiam da instabilidade da escola pública. É lidar.