O Nobel da Economia

A tese fundamental dos três galardoados é que as instituições económicas e políticas são a causa fundamental do crescimento económico de longo prazo

O prémio Nobel da Economia de 2024 foi atribuído esta semana a Daron Acemoglu, Simon Johnson e James Robinson (que designarei em conjunto por AJR). É um prémio justíssimo. São três académicos de primeiríssima água que aliam um conhecimento profundo da sua ciência a um impressionante domínio da história e da ciência política. Depois, dedicam-se ao estudo daquele que desde Adam Smith é o problema central da Economia, a saber: porque é que umas nações são ricas e outras não. Parafraseando outro Nobel (Robert Lucas Jr.): existe alguma ação que um governo de um país pobre possa tomar para crescer como a Coreia do Sul ou Taiwan? Se sim, qual, exatamente? Se não, o que há na natureza desse país que o torna assim? Finalmente, AJR são, também, divulgadores de grande alcance e sucesso como demonstram as obras Why Nations Fail e Power and Progress. 

A tese fundamental de AJR é que as instituições económicas e políticas são a causa fundamental do crescimento económico de longo prazo. O crescimento depende em grande parte de investimentos em capital físico, humano e em I&D, e estes investimentos são feitos quando existem os incentivos certos; isto é, quando e onde eles têm um ambiente legislativo e económico favorável, onde têm a garantia de que seus direitos de propriedade serão protegidos (as chamadas ‘instituições económicas inclusivas’). Esta parte do papel das instituições (aquilo a que o também Nobel Douglass North chamava as «regras do jogo numa sociedade ou, mais formalmente, as restrições criadas pelo homem que moldam a interação humana») é conhecida e há muito enfatizada. Os agora laureados destacaram a relação na outra direção: o papel das instituições inclusivas não é meramente criar os incentivos certos para os privados investirem; é também proteger os cidadãos de indivíduos e empresas excessivamente poderosos, as chamadas ‘elites’, que para manterem o poder e riqueza adquiridos coartam a competição, a inovação e a destruição criadora: os interesses instalados tornam-se obstáculos ao crescimento (enquistando aquilo a que AJR chamam ‘instituições extrativas’). E com este ‘twist’ introduzem a política no processo e tornam endógeno o tipo de instituições existente: as instituições existentes resultam da luta entre diferentes grupos e indivíduos pela ‘partilha do bolo’ e cujo resultado depende do seu poder político relativo. Este, por seu lado, é determinada pelas instituições políticas (pelo voto em democracia, por exemplo) mas também pela distribuição preexistente da riqueza conferindo aos mais poderosos economicamente, um maior poder político de facto, que tentam usar no seu melhor interesse. 

Os casos das duas Coreias são um exemplo contemporâneo frequentemente citado das teses dos novos Nobel. Nuno Palma, no seu As causas do atraso português, fornece uma boa ilustração para Portugal. Até ao final do século XVII as instituições políticas e económicas portuguesas desenvolveram-se em par com o que se passava em Inglaterra sendo mesmo, em certos aspetos, mais ‘inclusivas’. O influxo de ouro da primeira metade dos 1700’s mudou tudo: conduziu a uma apreciação real brutal que asfixiou a indústria nascente e matou as exportações e, concomitantemente, isolou o poder régio da sociedade civil, permitindo a consolidação do Absolutismo e a criação de uma estrutura mercantilista clientelar (uma típica instituição ‘extrativa’).

E como é no Portugal de hoje? Numa caracterização a traços largos Portugal tem instituições económicas e políticas inclusivas. Uma análise fina tempera esta observação: o envelhecimento da população, a dependência económica direta ou indireta do Estado, a informalidade ainda existente na economia e a influência do apelido de família no exercício do poder político e económico conduzem a ‘regras do jogo’ defensivas pouco abertas à mudança e ao progresso.