PSP acusa PJ de colocar os agentes em perigo

A PJ, que ouviu os dois polícias envolvidos na morte de Odair Moniz, é acusada pela PSP de ter feito um julgamento público ‘criminoso’, ao divulgar parte do inquérito aos agentes envolvidos.

A Polícia de Segurança Pública (PSP) manifestou o seu profundo desagrado à ministra da Administração Interna e acusa a Polícia Judiciária de ter colocado em perigo de vida os seus agentes no terreno. Em causa está a divulgação de informações parcelares por alguns órgãos de comunicação social sobre os depoimentos na PJ dos dois polícias envolvidos na morte de Odair Moniz, na madrugada da passada segunda-feira, no bairro do Zambujal, Amadora.


Mas a PSP não se lamentou apenas à tutela, pois numa reunião que decorreu no Sistema de Segurança Interna (SSI), ao final da tarde de quarta-feira – onde estavam presentes todas as forças de segurança e os serviços de informações e se pretendia discutir as famosas equipas mistas anunciadas pelo primeiro-ministro no Congresso do PSD -, o representante da PSP deu conta da sua preocupação com a fuga de informação, «que era incendiária e que punha em causa a segurança de todos os elementos que tinha no terreno».


Segundo a notícia avançada por diferentes órgãos de comunicação social, o agente suspeito de ter disparado contra Odair, escreveu no auto de notícia que agiu em legítima defesa, depois de Odair o tentar agredir com uma faca. Mas, no testemunho à PJ, segundo o que foi revelado, o polícia não terá falado na faca. A história ganhou contornos mais graves porque o vídeo do confronto físico entre Odair Moniz e o agente que terá disparado os dois tiros fatais foi também divulgado à comunicação social. E, apesar de as imagens não serem completamente explícitas, prevaleceu a ideia de que Odair não tinha uma faca na mão.

Alimentar a contestação criminal


«A PJ quebrou o segredo de justiça quando estamos a viver uma situação de caos com os tumultos nos bairros da Grande Lisboa? Se quebraram o segredo de justiça que expliquem agora o que têm. Revelaram antes de investigarem – a investigação ainda está no início e eles já libertaram esta informação», diz ao Nascer do SOL fonte da PSP. «Colocaram a segurança dos nossos homens em perigo», reforça outro oficial.


«Quando se pede contenção e moderação, e deixar tempo para que a investigação faça o seu trabalho, não me parece de bom tom que haja esta violação do segredo de justiça, manifesta, flagrante e grosseira, com intenções neste momento de vir a alimentar ainda mais a contestação criminal, pois isto não é contestação social», acrescenta outro destacado oficial da PSP.


É preciso salientar que os dois jovens agentes envolvidos na morte de Odair Moniz prescindiram de advogado quando prestaram declarações à PJ, mostrando a sua ingenuidade no processo, segundo colegas dos mesmos.

A inexistência do SSI


Numa situação tão complexa como a que se está a viver, em que jovens vândalos colocam alguns bairros da Grande Lisboa a ferro e fogo seria de esperar que o Sistema de Segurança Interna (SSI), à semelhança do que fez na Jornada Mundial da juventude, coordenasse as operações, chamando para o gabinete do secretário-geral todas as forças de segurança e de informações. Isso seria possível se o SSI tivesse secretário-geral, algo que não acontece há largos meses, altura em que saiu Vizeu Pinheiro. O mais insólito é que na conferência de imprensa que a direção nacional da PSP deu, o superintendente Pedro Gouveia, em substituição de Luís Carrilho, falou em nome de todas as forças envolvidas. Ora, o Nascer do SOL sabe que tudo não passou de uma falácia, pois a PSP só tem falado com a PSP, tendo o apoio da GNR, e vice-versa. Para se ter uma ideia, a PSP tomou conta das ocorrências sem contar com outras ajudas, daí ter feito o comando estratégico, na sede da direção nacional, o posto de comando operacional, em Moscavide, e os postos de comandos táticos em vários locais da Área Metropolitana de Lisboa. «O diretor nacional em substituição teve instruções para assumir que estava a falar em nome de todas as forças de segurança e de informações», apesar de o estar a fazer em nome da PSP, e da GNR, quanto muito, apurou o nosso jornal.

Drones auxiliares


Enquanto se aguarda pelas conclusões do inquérito, o PGR já disse que quer celeridade, o Nascer do SOL sabe que os serviços de informações da PSP apuraram que os diferentes grupos dos diferentes bairros que têm provocado desacatos, roubo e incêndio de autocarros, caixotes do lixo queimados, tiro à Polícia, etc, têm comunicado entre si através das redes sociais, nomeadamente do Telegram, WhatsApp e Intagram. Como é que a Polícia tem acesso a essas informações? Quando alguém é detido tem muita informação no telemóvel…


Mas o Nascer do SOL sabe que o drone usado na Cova da Moura e no bairro do Zambujal ajudou a deter alguns dos suspeitos. O nosso jornal questionou o MAI sobre a fraca utilização de drones, a não existência de armas taser, a falta das webcams, e a renitência no uso de sistemas de videovigilância. O gabinete de Margarida Blasco respondeu de uma forma direta: «Como é sabido, os ‘drones’, por si só, não controlam tumultos. Porém, têm tido utilização tático-estratégica, como noutros momentos, nos locais que refere, nomeadamente, nos últimos dias; A previsão de equipamento das “forças de segurança” com webcams é uma prioridade deste Ministério. Importa, no entanto, esclarecer, que como é público, já foram lançados dois concursos públicos que foram impugnados aguardando-se a decisão judicial para poderem ser concluídos e as Webcams adquiridas e postas em funcionamento; Esclarecemos que os agentes usam os “equipamentos taser” de acordo com os protocolos e as normas em vigor em cada uma das forças de segurança.


Há zonas nas áreas dos bairros, onde se registaram os confrontos, com sistema de videovigilância (CCTV). Esclarecemos, ainda – ao contrário do que vem afirmado – que este Ministério não tem, bem pelo contrário, qualquer resistência à utilização dos sistemas de videovigilância. Aliás, este sistema já está instalado em vários pontos do país, alguns inaugurados recentemente. E, consta do programa do Governo, a concretizar por este Ministério, o alargamento das zonas com o uso de CCTV. Esclarecemos que as dificuldades, em geral, tem estado, não no MAI, mas no âmbito dos pareceres emitidos, quanto à instalação daqueles equipamentos, por parte da Comissão Nacional de Proteção de Dados».

A falta de apoio do Presidente


Não foi só o Bloco de Esquerda e o SOS Racismo que se colocaram imediatamente ao lado da família da vítima, falando em racismo policial. Questionado sobre a posição do Bloco de Esquerda, Bruno Pereira, líder do Sindicato Nacional dos Oficiais de Polícia (SNOP), não foi meigo nas palavras, até porque tem sido um dos homens destacados no terreno. «Como é que nós, polícias, podemos admitir ao representante político, que tem capacidade de penetração nas pessoa, em casa, como é que pode vir dizer que cometer crimes, danificar património, privado e público, praticar atos de extrema violência é uma manifestação democrática e legítima? Não sei em que país é que se pode fazer esta leitura».


Quanto à posição do Presidente da República, Bruno Pereira também não poupa nas palavras: «Acho estranho que o senhor Presidente da República, que é uma pessoa tão sensível a apoiar quem tem que apoiar, não tenha tido, como o primeiro-ministro teve, uma palavra de solidariedade de apoio forte e incondicional ao trabalho das forças de segurança. No caso em concreto, à PSP, que tem estado, nestes dias, de forma bastante exigente a ter de lidar com todos estes fogos de incidentes».

O motorista às portas da morte


Quem está de acordo com Bruno Pereira é Pedro Clemente, antigo diretor nacional adjunto da PSP e professor universitário. «Assim como é intolerável o racismo policial, também se afigura inadmissível o racismo anti-policial, manifesto em declarações de organizações radicais e fonte de alegria de bandos de delinquentes, interessados em dominar certos bairros e expulsar a lei das ruas. Não pode haver espaços sem lei num Estado de Direito. É agora tempo da Justiça, deixemo-la funcionar, como sucedeu noutras situações similares. Basta de julgamento sumário; o tempo das fogueiras da Inquisição já passou e dos fuzilamentos soviéticos também. E importa olhar para todas as vidas, especialmente a do motorista da Carris, gravemente queimado por arruaceiros e à porta da more. Não se está perante um protesto legítimo, está-se perante puro vandalismo criminoso».


Ontem, ao princípio da tarde, a PSP fazia o balanço do dia anterior: «Deteve 13 suspeitos da prática de crimes de roubo (4), ofensa à integridade física qualificada (4), posse de engenhos explosivos e armas proibidas (3), tentativa de fogo posto (1) e acionamento de extintor e dano contra viatura da PSP (1). Foram registadas 45 ocorrências de incêndio em mobiliário urbano (maioritariamente caixotes do lixo) na Área Metropolitana de Lisboa, nos concelhos de Almada, Amadora, Barreiro, Lisboa, Loures, Oeiras, Seixal e Sintra. Foram ainda identificados 18 suspeitos por motivos diversos. De todas estas ocorrências, houve ainda a registar: 1 viatura policial danificada; 2 autocarros incendiados; 8 veículos ligeiros de passageiros incendiados; 1 motociclo incendiado; 3 cidadãos feridos, um deles com gravidade – motorista de um dos autocarros, o qual sofreu queimaduras graves na face, tórax e membros superiores; Inúmeros caixotes de lixo incendiados, assim como outro mobiliário urbano». Tudo isto em apenas 24 horas…

*Com Maria Moreira Rato