A situação política em Moçambique escalou de forma perigosa com o ataque à Frelimo, partido que está no poder desde 1975. A prisão do responsável de uma manifestação nos arredores de Quelimane, a quarta cidade mais importante do país, provocou uma violenta revolta da população. Um grupo de pessoas perseguiu a polícia e responsáveis locais da Frelimo, entrou em casa de Luís Joaquim Salimo, vice-presidente da Comissão Distrital de Eleições, e assassinou-o. Depois assaltou a casa do dirigente Nhacungo e raptou a sua mulher, desconhecendo-se o seu paradeiro. A seguir, destruiu o comando da polícia, libertou todos os presos e incendiou dois carros.
A violência tem vindo a aumentar. No dia anterior, a polícia tinha disparado indiscriminadamente sobre os manifestantes, matando seis pessoas Nampula e deixando muitas outras feridas, registando-se ainda inúmeras detenções. Os moçambicanos criticam a falta de vontade política de o Governo reconhecer a legitimidade dessas reivindicações e de admitir que cometeu crimes contra a população.
Enquanto a Polícia da República de Moçambique (PRM) continua a ter um comportamento extremamente violento, usando gás lacrimogéneo e balas reais, os militares têm sido mais discretos. Nas redes sociais existe um vídeo de militares a fazer o ‘V’ de vitória e a gritarem pelo nome de Venâncio Mondlane. Pode ser um ato isolado ou, então, o primeiro sinal de que as forças armadas podem vir a mudar de posição e serem a mola impulsionadora para uma mudança de regime. Em África, é o método mais comum de fazer cair governos.
A situação agrava-se todos os dias à medida que o número de mortos aumenta. Há cada vez mais manifestantes a organizarem-se para realizar ações de contestação, que podem levar à guerra civil. Essas ações não têm apenas a ver com os resultados eleitorais, mas também com o quadro de insatisfação com o que se passa num dos países mais pobres do mundo. Venâncio Mondlane, candidato do partido Podemos, não está sozinho na luta contra o regime. Manuel de Araújo, presidente da Câmara de Quelimane eleito pelo MDM, foi claro: «Não nos provoquem. Podem descobrir que, afinal, não somos assim tão parvos. Quando o povo acorda, ninguém o trava», afirmou. Este dirigente e a sua família foram atacados no dia anterior com gás lacrimogéneo quando protestavam na cidade, o que levou o MDM a abrir um processo-crime contra a polícia.
Mais manifestações
Esta semana o candidato derrotado nas eleições presidenciais, Venâncio Mondlane – que se encontra refugiado na Suécia –, voltou a apelar aos seus apoiantes para se manifestarem em todo o país contra o «processo eleitoral fraudulento», o «assassinato do povo» e os «raptos e sequestros». Usou o Facebook para lançar aquilo a que chamou a quarta volta das manifestações e convocou protestos durante três dias nas capitais provinciais, postos fronteiriços e portos marítimos. «Os protestos só irão parar depois da restauração da verdade eleitoral, e quando a matança e os raptos do nosso povo pararem», ameaçou. Pouco depois, o comandante da Polícia da República de Moçambique, Bernardino Rafael, afirmou que as manifestações convocadas por Venâncio Mondlane são subversivas, querem alterar a ordem constitucional e afetam a economia do país, e disse «basta» às manifestações e ao terrorismo urbano. Estavam criadas as condições para a situação se agravar, como se verificou nos dois últimos dias. Recorde-se que, pelo menos, 40 pessoas morreram nos tumultos que começaram depois de Daniel Chapo, candidato da Frelimo, ter sido eleito Presidente da República nas eleições de 9 de outubro. Desde então, o Ministério Público instaurou 208 processos-crime que visam a responsabilização criminal dos autores morais e materiais da violência nas manifestações.
Enquanto os apoiantes de Mondlane se preparam para aumentar a pressão sobre o Governo, a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral apelou a uma cimeira extraordinária para discutir a instabilidade em Moçambique. O conjunto de 16 países irá reunir-se em Harare, no Zimbabué, entre 16 e 20 de novembro, para debater a violência pós-eleitoral em Moçambique.