O Matuto e a Menina da Caixa de Fósforos

A história de Natal, favorita do Matuto, foi escrita por Hans Christian Andersen, em 1845: A Menina e a Caixa de Fósforos. O Matuto prepara uma chá quente, aconchega a manta nos joelhos, ajusta o volume da vitrola, e passa a contar a história… Era uma vez uma menina que vendia fósforos.

O Matuto gosta do Natal. E o Matuto gosta de histórias. O Natal e as histórias são uma combinação perfeita. Na verdade, o Natal é a história mais bela do Cristianismo. Deus se fez menino. O Eterno se fez perto. Esta é uma história real e perene. O Menino continua a nascer nas nossas vidas. A virgem mãe continua submissa. Os pastores não envelhecem, e os Reis magos continuam generosos com as suas dádivas. Pode-se alterar a paisagem do mundo, podem terroristas atacar mercados de Natal, podem as guerras lançar mísseis… que a mensagem de Belém (terra de pão) continua sem o mofo das inquietações humanas. Já o Ano Novo é diferente, pois traz consigo a melancolia do Ano Velho e os ossos enterrados de todos os outros anos que já se finaram. É isso: O Matuto gosta do Natal… e das suas histórias.

A história de Natal, favorita do Matuto, foi escrita por Hans Christian Andersen, em 1845: A Menina e a Caixa de Fósforos. O Matuto prepara uma chá quente, aconchega a manta nos joelhos, ajusta o volume da vitrola, e passa a contar a história… Era uma vez uma menina que vendia fósforos. Estava muito frio! A neve não parava de cair e a noite aproximava-se. Aquela era a última noite de Dezembro, véspera do dia de Ano Novo. Perdida no meio do frio intenso e da escuridão, a pobre menina seguia pela rua fora, com a cabeça descoberta e os pés descalços. Ao sair de casa tinha um par de chinelos… No entanto, estes ficavam-lhe tão grandes que a menina os perdeu quando teve de atravessar a rua a correr para fugir de uma carruagem. Um dos chinelos desapareceu no meio da neve, e o outro foi roubado por um garoto. Por isso, a menina seguia com os pés descalços e já roxos de frio. Levava no avental umas caixinhas de fósforos que estendera a toda a gente que passava, apregoando: “Quem quer comprar fósforos bons e baratos?” Mas o dia tinha-lhe corrido mal. Ninguém comprara os fósforos, e, portanto, ela ainda não conseguira ganhar nem um cêntimo. Sentia fome e frio, estava muito pálida e tinha as faces encovadas. Pobre menina! Os flocos de neve caíam-lhe sobre os cabelos compridos e loiros, que se encaracolavam graciosamente em volta do pescoço magro. Como era véspera de Ano Novo, a menina olhava com tristeza para as luzes que adivinhava por detrás das janelas de cada casa e sentia o cheiro da carne assada que chegava até ela… A dado momento, sentou-se no chão e encolheu-se a um canto de um portão. Sentia cada vez mais frio, mas não tinha coragem de voltar para casa. Não vendera uma única caixa de fósforos, e não tinha nem uma só moedinha. O pai era capaz de lhe bater por não ter vendido nada. Além disso, em casa também não havia calor. A família morava numa casinha em ruínas, e o vento entrava pelos buracos das telhas e pelas paredes velhas, apesar de terem tapado com farrapos e palha as fendas maiores. Sentia as mãos quase paralisadas de frio. Ah, como o calorzinho de um fósforo aceso lhe faria bem! Se tirasse um, um só, da caixa, e o acendesse para aquecer os dedos? Pegou num fósforo e Ffchttss, a chama espirrou e o fósforo começou a arder! Parecia a chama quente e viva de uma lâmpada que logo tapou com a mão. Mas… que luz era aquela? Que luz linda! De repente, a menina julgou que estava sentada em frente de um lindo fogão que aquecia todo o ambiente. O lume ardia com uma chama tão intensa, e o calor era tão bom. A menina estendia já os pés para se aquecer, quando a chama subitamente se apagou e o fogão desapareceu! E então viu que estava sentada sobre a neve e que com a ponta do fósforo tinha queimado a mão. Riscou outro fósforo, que se acendeu e brilhou, e o lugar em que a luz batia na parede tornou-se transparente. A menina viu o interior de uma sala de jantar: a mesa estava coberta por uma toalha branca, as loiças eram belas e sobre a mesa havia um peru assado, com recheio de ameixas e puré de batata, que fumegava, espalhando um cheiro apetitoso. Subitamente, que surpresa e alegria! O peru saltou da travessa e rolou para o chão até junto da menina. Mas, mal o fósforo se apagou, a pobre menina só viu na sua frente uma parede fria. Acendeu um terceiro fósforo… Imediatamente encontrou-se ajoelhada debaixo de uma enorme árvore de Natal. Milhares de pequenas velas ardiam nos ramos verdes, e figuras de todas as cores, como as que enfeitam as montras das lojas, pareciam sorrir para ela. A menina levantou ambas as mãos para a árvore, mas o fósforo apagou-se, e todas as velas de Natal começaram a subir, a subir… e ela percebeu então que eram apenas as estrelas a brilhar no céu. Uma estrela maior do que as outras desceu em direcção à terra, deixando atrás de si um comprido rasto de luz. “Foi alguém que morreu”, pensou a menina. A avó, a única pessoa que tinha sido boa para ela, dissera-lhe muitas vezes: “Quando vires uma estrela cadente, é uma alma que vai a caminho do céu”. Riscou outro fósforo. Fez-se uma grande luz, e no meio apareceu a avó, com uma expressão suave, cheia de felicidade. “Avó!” – gritou a menina. “Leva-me contigo! Quando este fósforo se apagar, eu sei que já não estarás aqui. Vais desaparecer como o fogão, como o peru assado, e como a árvore de Natal, tão linda”… Riscou imediatamente um punhado de fósforos porque queria que a avó continuasse junto dela, e os fósforos espalharam em redor uma luz tão brilhante como se fosse dia. Nunca a avó lhe parecera tão meiga e tão bonita! Então, a avó tomou a neta nos braços e, soltando os pés da terra, no meio daquele esplendor, voaram ambas tão alto, tão alto, que já não podiam sentir frio, nem fome, nem tristeza. Tinham chegado ao Reino de Deus. No dia seguinte, quando rompeu a manhã gelada, junto do portão, estava caída uma menina, com as faces roxas, um sorriso nos lábios… Morta de frio na última noite do ano. O dia de Ano Novo nasceu, indiferente ao pequeno cadáver que ainda tinha no colo alguns fósforos. “Pobre menina, parece que tentou aquecer-se!” – exclamou alguém. Mas nunca ninguém percebeu, nem sequer imaginou, as coisas lindas que a menina viu à luz dos fósforos, nem o brilho com que entrou, na companhia da avó, no Ano Novo.

Esta história de Natal é eterna – pondera o Matuto.  

Para a Aninha, menina encantada com histórias.