O regresso de ‘dinossauros’

A menos de um ano das eleições, antigos protagonistas da política local preparam o regresso. Maria das Dores Meira avança como independente em Setúbal, Luís Mourinha volta à corrida em Estremoz, apesar do passado judicial e Ricardo Sousa renova dinâmicas no tabuleiro político

Enquanto uns saem, outros regressam. A menos de um ano das eleições autárquicas, os chamados autarcas ‘dinossauros’ – políticos locais que tiveram longas carreiras nas autarquias – começam a aparecer. Um dos nomes mais sonantes é o de Maria das Dores Meira. A ex-presidente da Câmara Municipal de Setúbal, eleita pela CDU em três mandatos consecutivos, nas eleições autárquicas de 2009, 2013 e 2017, já anunciou que quer reconquistar a liderança do município sadino, mas, desta vez, como independente. Nas últimas autárquicas, candidatou-se à Câmara de Almada, por já não poder concorrer em Setúbal, mas saiu derrotada contra a socialista Inês de Medeiros.
Entre o conjunto de prioridades que Maria das Dores Meira já anunciou na sua campanha para o concelho de Setúbal está a melhoria e limpeza do espaço público, a criação de uma polícia municipal, a discussão pública para a eventual implementação de sistema de videovigilância em alguns locais e a construção de uma marina.
Certo é que estes planos não vão contar com o apoio do antigo partido pelo qual deu a cara e com quem a ex-autarca comunista parece agora estar de relações cortadas. Recorde-se que em julho de 2024, o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, já tinha desvalorizado a sua candidatura independente, defendendo que «fora de um coletivo, as pessoas valem pouco mais que nada».
Já em novembro, Maria das Dores Meira garantiu estar a ser vítima de uma «perseguição política», alegadamente promovida pelo PS e «com o apoio inequívoco da CDU». Em causa está uma auditoria proposta pelos eleitos do PS, aprovada pela maioria CDU, PS e PSD, após uma notícia sobre a alegada utilização abusiva dos cartões de crédito do município e recebimento indevido de ajudas de custo no mandato de 2017/2021 da ex-autarca. Maria das Dores Meira rejeita as supostas ilegalidades, mas as acusações poderão ser uma ‘mancha’ na campanha da candidata.

Ex-autarca condenado por prevaricação recandidata-se
Outro autêntico ‘dinossauro’ que já prometeu voltar a pisar os palcos da política local é o antigo presidente da Câmara de Estremoz Luís Mourinha. O ex-autarca esteve à frente do município durante 12 anos eleito pela CDU e outros 10 pelo Movimento Independente por Estremoz (MIETZ), pelo qual vai agora concorrer novamente.
Depois de ser reeleito nas eleições autárquicas de 2017, a condenação em tribunal pelo crime de prevaricação, que incluiu a pena acessória de perda de mandato, precipitou a saída de Luís Mourinha do cargo em 2019.
Em causa estaria uma queixa-crime apresentada em 2010 pela Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte (LACE), que acusava Mourinha de ter cortado, de forma indevida, um subsídio destinado à associação. O ex-autarca acabou condenado a uma pena suspensa de dois anos e oito meses de prisão, além da perda de mandato.
Após a sua saída, o então vice-presidente Francisco Ramos assumiu a presidência da câmara e, posteriormente, a autarquia contratou Luís Mourinha, em regime de avença, para prestar serviços na área do desenvolvimento económico, justificando a decisão com o seu conhecimento do concelho e dos seus contactos relevantes.
O passado com a justiça não impediu que Luís Mourinha fosse escolhido, por unanimidade, como cabeça de lista do MIETZ, para a corrida às autárquicas em 2025.

Antigo autarca é o candidato do PSD à Câmara de Espinho
Ricardo Sousa, de 43 anos, é o candidato do PSD à presidência da Câmara Municipal de Espinho. Com uma licenciatura em Direito, iniciou a sua carreira política na Juventude Social Democrata (JSD) e possui uma ligação familiar ao partido, sendo neto de um militante fundador do PSD.
Embora não tenha tido uma carreira tão prolongada e contínua em cargos autárquicos, Ricardo Sousa exerceu funções como autarca durante 16 anos na Assembleia Municipal de Espinho e foi chefe de Gabinete do Presidente da Câmara de Espinho num mandato de Pinto Moreira. Entre 2022 e 2024, desempenhou ainda o cargo de deputado na Assembleia da República pelo círculo de Aveiro.

Os ‘dinossauros’ que podem continuar no poder
O fenómeno não é novo. Nas autárquicas de 2017 vários ‘dinossauros’ marcaram o regresso às corridas eleitorais, embora a maioria não tenha conseguido singrar. Foi o caso de Valentim Loureiro, que já tinha presidido à Câmara de Gondomar durante cinco mandatos completos (entre 1993 e 2013), e candidatou-se novamente à autarquia. Conhecido como “Major”, Valentim Loureiro acabaria por perder contra Marco Martins (PS), mas ainda assim conseguiu eleger dois vereadores.
Isaltino Morais foi um dos poucos “dinossauros” a resistir, tendo sido eleito depois de cumprir uma pena de prisão de dois anos por fraude fiscal e branqueamento de capitais. Há mais de 30 anos à frente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino presidiu pela primeira vez a Oeiras pelo PSD entre 1985 e 2002; foi reeleito em 2005 e em 2009 como independente, após uma breve passagem pelo governo como Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente; e voltou a ser eleito presidente da câmara em 2017, mantendo-se no cargo até hoje.
Sobre a intenção de se candidatar em 2025 ao seu terceiro e último mandato, Isaltino não confirma nem desmente.
Mas há outros ‘dinossauros’ à frente de autarquias que se poderão recandidatar em 2025. Fernando Ruas é um deles. Após liderar a Câmara Municipal de Viseu durante 24 anos, o ex-autarca regressou em 2021 para um novo mandato. É possível que considere a recandidatura em 2025, tendo dito em novembro que a reconstrução do IP3, por parte do Governo, «é uma condição» para se voltar a candidatar.
Também Francisco Lopes, uma figura proeminente na política local de Lamego e atual presidente do município, pode considerar a recandidatura, caso mantenha o interesse em continuar no cargo.
Após cumprir três mandatos consecutivos como presidente entre 2005 e 2017, esteve impedido de se recandidatar em 2017, mas voltou a ser reeleito em 2021, iniciando um novo ciclo de mandatos. Assim está legalmente habilitado a recandidatar-se a um terceiro mandato consecutivo.