Como abrir a porta

São os segmentos mais frágeis da população, em que se incluem os imigrantes, que querem mais segurança e menos hipocrisia.

O tema da imigração tem polarizado, como nenhum outro, a opinião pública portuguesa. Apesar das opções ideológicas, fomos sempre coesos, solidários e relativamente tolerantes. Hoje, há uma radicalização que conhecíamos noutros países e à qual nos julgávamos imunes.

Como António Barreto escrevia há dias, «as migrações mudam os países e as sociedades. Muito ou pouco, depressa ou devagar. Mas sempre. Para melhor ou pior, depende.»

O único influxo migratório relevante que conhecêramos fora o dos ‘retornados’, que há 50 anos cá aportaram. Não tinham problemas linguísticos nem diferenças culturais ou religiosas mas chegaram sem nada, e não se revoltaram contra os políticos que lhe tinham traçado o destino. Alguns tinham rede familiar, outros souberam fazer pela vida. A nossa sociedade mudou para melhor, porque houve um pacto entre os que chegaram os que cá estavam. Podia não ter sido assim: a chegada dos ‘pieds-noirs’ a França não correu da mesma forma.

Infelizmente, esse sucesso não está hoje a ser replicado, e não adianta dizer que somos todos culpados: essa é a forma de nos isentarmos da nossa responsabilidade individual.

Com o sistema político fraturado e em ambiente de indignada violência verbal, uma comunicação social militante entrincheirada em causas, redes sociais manipuladas por esquerdistas lunáticos e populistas da direita radical, vivemos sob o jugo de perceções conflituantes de uma realidade que nos é ocultada. Se não há um aumento da criminalidade associado à imigração ou a minorias, porque se esconde a etnia de quem comete crimes, facilitando o ódio e os mitos?

Sim, há um sentimento de insegurança e focos que todos conhecemos. Em muitos desses locais, como a Pasteleira no Porto, não há imigrantes: há tráfico de droga, à vista de todos, e a outra criminalidade associada.

Por que razão se insiste no negacionismo? Por que motivo o Chega, tão zeloso em questões de segurança, nunca fala de tráfico de droga? E a esquerda? Por que razão invoca a autoridade do Estado quando governa e ocorrem rusgas e hoje, se há uma operação policial que recorre aos mesmos métodos, reclama que estamos a ceder ao autoritarismo? Porque fala em racismo e xenofobia sempre que quem não é branco é alvo de alguma medida preventiva ou repressiva, inflamando a reação securitária de quem, no seu dia a dia, vive uma realidade alternativa e não se comove com esses argumentos?

São os segmentos mais frágeis da população, em que se incluem os imigrantes, que querem mais segurança e menos hipocrisia. Por isso, o que se espera é que o Governo tenha ponderação e firmeza, não cedendo a perceções, não mimetizando agendas. Sei bem que é um equilíbrio difícil, mas deve-se regular a imigração porque a política de portas escancaradas tem consequências intoleráveis. E deve-se também escrutinar quem quer vir para Portugal. Neste sentido, a extinção do SEF foi um disparate que merece ser revertido.

Se todos sabemos que os imigrantes aportam benefícios à economia, temos de investir parte desses ganhos no seu acolhimento digno. Desde logo na habitação, o problema que mais aflige os portugueses e que está a ser pressionado pelo grande e rápido fluxo migratório. Mas também em todas as outras funções do Estado social, que têm de ser reajustadas e redimensionadas. A saúde, a educação e também a proteção e segurança dos cidadãos. Com uma polícia visível, presente, sensível, pedagógica mas firme.

Ignorar toda esta realidade só aumentará o número dos que acham que a liberdade é um luxo que, no limite, não se importarão de trocar pela ordem.