Sexo, amor e desejo

O que conduz ao sexo não é o amor – é o desejo. Enquanto o amor é casto, o desejo é libidinoso. Enquanto o amor é puro, o desejo é por natureza carnal, impuro.

Podia ser o título de um livro de Francesco Alberoni, mas não: trata-se apenas de um modesto artigo de jornal de um não especialista na matéria.            
Falando com uma pessoa amiga sobre relações amorosas, ela colocava exatamente no mesmo plano as relações heterossexuais e homossexuais. «Tal como um homem e uma mulher se amam, é natural que um homem possa amar outro homem ou uma mulher outra mulher. Afinal, são todos seres humanos».

É inteiramente verdade. Duas pessoas podem amar-se independentemente do sexo. Mais: pode haver amor entre pessoas e animais. Tive um gato quando era jovem e dois cães já na idade madura, e não tenho dúvidas de que os amei. Preocupava-me quando os cães desapareciam por longas horas (no Alentejo andavam à solta), alarmava-me quando ficavam doentes, sofri quando morreram. E, pelo que vejo, a esmagadora maioria das pessoas que têm animais sentem por eles um amor verdadeiro. Nas catástrofes, uma das primeiras preocupações das vítimas é salvar os animais de estimação.

No limite, pode mesmo haver amor (ou um sentimento muito próximo) por um objeto que tem para o dono um significado especial – seja pelo objeto em si, pela situação a que está ligado ou pela pessoa que lho ofereceu.

O amor é, portanto, um sentimento casto, puro, que não dispensa o contacto físico, mas onde o desejo está ausente. Os pais gostam de beijar os filhos e os avós os netos, os amigos gostam de apertar a mão, de se abraçar ou de dar um beijo no rosto, caso se trate de mulheres, os donos de animais gostam de lhes fazer festas.

Mas, repito, em todos estes casos trata-se de um contacto físico que não envolve desejo.

Portanto, quando se diz que o amor conduz naturalmente ao sexo, não é verdade. O amor e o sexo são duas coisas radicalmente diferentes. Podem estar presentes numa mesma relação mas não se confundem. Amor é uma coisa, sexo é outra.

O sexo não decorre do amor – decorre do desejo. Podemos desejar uma pessoa, sem a amarmos. E podemos amar uma pessoa sem a desejarmos.

Já falei dos casos de amor casto entre pais e filhos, avós e netos, até pessoas e animais. Mas mesmo numa relação matrimonial pode haver amor sem existir sexo, pelo menos a partir de certa altura.

Conheço casais que se amaram toda a vida mas que a determinado momento, por doença ou por opção (às vezes religiosa), deixaram de dormir na mesma cama.

Do mesmo modo que pode haver amor sem sexo, também há sexo sem amor. Um homem que frequenta prostitutas, ou uma mulher que contrata gigolos, fazem-no para satisfazer necessidades sexuais e não por amor. À partida, sabem que essas relações não envolvem sentimentos. Chegam a pagar fortunas por uma noite, mas não têm ilusões sobre a existência de amor.

O sexo não implica amor – e o amor não conduz ao sexo. O que conduz ao sexo, como se disse, não é o amor – é o desejo. Enquanto o amor é casto, o desejo é libidinoso. Enquanto o amor é puro, o desejo é por natureza carnal, impuro. Enquanto o amor pode durar uma vida e não precisa de nada para o alimentar, o desejo ou se concretiza ou morre. É difícil alguém desejar outra pessoa durante anos sem acontecer alguma coisa.

As diferenças entre o amor, o desejo e o sexo são importantes, se não mesmo decisivas, para esclarecermos os nossos sentimentos e comportamentos – e os dos outros.

E é exatamente por isso que a homossexualidade tem interpelado a humanidade ao longo dos séculos, conduzindo em certos períodos a situações dramáticas. A terríveis perseguições. É que, se é fácil perceber a amizade entre dois homens ou entre duas mulheres, se se compreende a cumplicidade que se pode estabelecer entre eles, é mais difícil perceber que dois seres do mesmo sexo possam desejar-se. Tal como num íman os polos de sinal contrário se atraem e os do mesmo sinal se repelem, também seria expectável que o desejo só surgisse entre seres de sexos diferentes.

Quando a minha amiga me diz que dois seres que se amam passam naturalmente a ter como objetivo dormir juntos, sejam mulheres ou homens, eu tenho de fazer um ponto de ordem.

Sexo, desejo e amor são coisas diferentes. Ama-se sem se desejar e deseja-se sem se amar. E o sexo decorre do desejo e não do amor. Confundir as coisas é perigoso – e pode levar a grandes confusões…

P.S. – Por falar em desejo, desejo aos meus leitores um 2025 feliz e compensador.