Donald Trump ainda nem tinha ganho a corrida à presidência dos Estados Unidos e já se escrutinava sobre as consequências que uma vitória sua poderia trazer para a economia mundial. Agora que a sua vitória é uma realidade e que já tomou posse, é agora possível ter uma ideia mais certa do que será daqui para a frente. Tarifas, invasões, taxas de juro, criptomoedas. Trump tem ameaçado com uma série de medidas mas agora, é preciso esperar para ver o que acontece.
As tarifas adicionais sobre as exportações para os Estados Unidos é uma das medidas que mais pode afetar os restantes países do mundo. O novo presidente americano anunciou anunciou uma tarifa de 60% sobre os produtos provenientes da China, 25% sobre os produtos provenientes do Canadá e do México e 10% sobre todos os outros produtos estrangeiros.
Apesar de ainda não ter passado das ameaças à ação, o presidente americano assinou um memorando focado na política comercial dos Estados Unidos com outros países. Nesse documento, Donald Trump incumbe os secretários de Estado do Comércio e do Tesouro não só de analisarem as causas dos «grandes e persistentes» défices comerciais do país como também que sejam investigadas pelas agências federais «quaisquer práticas comerciais desleais de outros países».
«Caso Donald Trump venha realmente a implementar as tarifas aduaneiras que tem referido nas suas promessas políticas, poderemos observar um aumento de preços. Este fenómeno, sim, poderia obrigar o banco central a alterar a sua política monetária, de modo a controlar a subida da inflação», alerta Vítor Madeira, analista da XTB ao Nascer do SOL.
Sobre este assunto, Paulo Monteiro Rosa, economista sénior do Banco Carregosa diz que se espera que Donald Trump «continue a adotar uma abordagem protecionista, com o aumento de tarifas aduaneiras, especialmente contra países como a China», acrescentando que, para já, «os visados são os vizinhos, México e Canadá, já a partir de 1 de fevereiro».
No entanto, o economista acrescenta que durante o primeiro mandato de Trump, «e apesar da retórica protecionista, o nível de globalização não reverteu, como evidenciam dados do CPB World Trade Monitor, que mostram recuos no comércio internacional apenas em períodos de recessão», lembrando que o peso das trocas comerciais dos EUA no seu PIB nominal manteve-se em 26% de 2017 a 2020, e os défices comerciais em 3% do PIB, «evidenciando uma interação económica ‘normal’ e não isolacionista. Vale a pena recordar que as principais empresas mundiais são americanas, tendo ramificações e interesses globais».
As consequências de uma medida destes – ainda que sejam muito mais direcionadas à China – afetarão outros países e Portugal não será exceção. E o ministro das Finanças português, Joaquim Miranda Sarmento, já alertou: «Quando se impõe tarifas, quem sofre mais são os consumidores, sobretudo aqueles de baixos rendimentos».
Segundo dados do Portugal Exporta, da AICEP, com base em dados do Instituto Nacional de Estatística, Segundo o INE, os EUA foram o quarto cliente das exportações portuguesas de bens em 2023, com uma quota de 6,8%, ocupando a 9.ª posição ao nível das importações (2,1%). Ao longo do período 2019-2023 verificou-se um crescimento médio anual das exportações de 16,7% e de 21,2% nas importações. A balança comercial de bens foi favorável ao nosso país, tendo apresentado um excedente de 2 983 milhões de euros em 2023. Mas pode haver mudanças se Trump assumir mesmo mais tarifas e se estas afetarem Portugal.
Paulo Monteiro Rosa fala ainda dos juros defendendo que este tema pode vir a ser «um dos principais pontos de confronto em 2025 entre Trump e Jerome Powell, presidente da Reserva Federal dos EUA», uma vez que o novo presidente «tem sido crítico da política monetária do banco central dos EUA, especialmente em relação ao aumento das taxas de juro». E defende que caso a pressão sobre a Fed se mantenha, «será visível uma abordagem mais agressiva de Trump para impulsionar a descidas das taxas de juro, com o objetivo de estimular o crescimento económico». No entanto, o economista diz que «as políticas económicas expansionistas de Trump, aliadas a um eventual aumento do protecionismo, poderão gerar mais inflação, o que dificultaria os cortes de juros pela Fed ou resultaria no limite em aumentos das taxas. Nesse cenário, Trump provavelmente pedirá o contrário: uma redução mais significativa dos juros».
Paulo Monteiro Rosa diz ainda ao nosso jornal que o aumento da dívida pública e a necessidade de combater a inflação «podem forçar a Fed a adotar uma postura mais restritiva» e que uma eventual política orçamental «ainda mais expansionista de Trump, com cortes de impostos, pode agravar os já elevados défices orçamentais norte-americanos e impedir a descida dos juros, como Trump deseja». Assim, conclui, « as próprias políticas de Trump podem vir a contrariá-lo, reacendendo a inflação e impulsionando os juros, algo que ele não pretende. Pelo contrário, Trump procura uma redução das taxas de juro». Mas diz ser normal que a economia dos EUA cresça acima do seu potencial (com um output gap positivo) e «isso gere inflação e conduza ao aumento dos juros».
Questionado sobre o que esperar a nível económico desta vitória de Trump, Ricardo Evangelista, CEO da ActivTrades Europe defende que «o cenário mais provável indica que as taxas de juro nos EUA deverão permanecer elevadas por um período prolongado», acrescentando que «a agenda protecionista da nova administração americana, que tem ameaçado impor tarifas adicionais sobre as importações, poderá ter como efeito colateral um aumento da inflação». Nesse contexto, Ricardo Evangelista lembra que a maioria dos analistas «prevê apenas um corte nos juros este ano, o qual, se ocorrer, será provavelmente apenas no verão».
Criptomoedas, cenário promissor
Donald Trump vai querer liderar a popularização das criptomoedas nos EUA. «Novas autoridades na SEC, na CFTC e também uma remodelação entre os vice-presidentes da Fed poderão levar à aprovação posterior da Bitcoin como uma reserva de valor», alerta a XTB com Vítor Madeira a defender que «é difícil ter previsões certeiras, uma vez que estes são ativos altamente especulativos, dependentes de forças de procura/oferta». Isto deve-se, acrescenta, «à natureza do valor das criptomoedas, que não é suportado por dados fundamentais. Desta forma, todos os cenários são possíveis».
E diz que basta observar o caso da Bitcoin, que atingiu novos máximos históricos antes da tomada de posse de Donald Trump. «Contudo, este otimismo acabou por ir perdendo força» nos últimos dias. «Isto pode ter sido influenciado pelo facto de o discurso da tomada de posse não fazer qualquer menção ao mercado de criptomoedas», diz Vítor Madeira.
Sobre este assunto, Ricardo Evangelista diz que Trump prometeu durante a campanha eleitoral «transformar os EUA no principal centro global para as criptomoedas, incluindo a criação de uma reserva estratégica de criptoativos». Além disso, «algumas figuras de destaque na nova administração, como Scott Bessent, recentemente nomeado Secretário do Tesouro, são defensores fervorosos das criptomoedas. Com uma administração favorável ao universo cripto, o cenário parece promissor para este tipo de ativos».
Já Paulo Monteiro Rosa defende que embora Trump tenha demonstrado uma postura cética em relação às criptomoedas no seu primeiro mandato, «tendo talvez sido a sua crítica mais notável em julho de 2019, quando afirmou no Twitter que ‘não era fã do Bitcoin’ e que as criptomoedas ‘não são dinheiro’, expressando preocupações sobre o uso do Bitcoin para atividades ilegais, como o tráfico de drogas e o financiamento do terrorismo, sugerindo também que, caso as criptomoedas fossem usadas como moeda, deveriam ser regulamentadas e supervisionadas pelo governo dos EUA, atualmente parece haver uma reviravolta na sua posição».
Trump parece estar agora mais recetivo ao setor, e a sua administração, favorável às criptomoedas, diz o economista. «Alguns membros da sua administração defendem um ambiente regulatório mais favorável ao mercado de criptomoedas, sugerindo até a criação de uma reserva estratégica de Bitcoin», acrescenta.