Um país avariado

Um processo com oito anos, uma ministra que não sabe contratar e um secretário de Estado sem bom censo.

1.  O Ministério Público concluiu o despacho de acusação do processo Tutti-Frutti. Os procuradores do Ministério Público levaram oito anos para concluir que Fernando Medina não fez nada de irregular ao conceder um apoio de 200 mil euros a um clube de rugby de Lisboa, coisa que, de resto, acontece com todos os clubes equivalentes na cidade. Oito anos de acusações, de suspeitas, de notícias na comunicação social, sempre a propósito do apoio concedido pela autarquia, decidido em reunião de Câmara, onde têm assento e direito de voto todos os vereadores, de todas as forças políticas. E no fim, nada.

Também o então vereador, Duarte Cordeiro, era visado da investigação. Por causa das suspeitas levantadas, decidiu não se candidatar a cargos políticos até que tudo estivesses esclarecido. A gota de água, foram buscas feitas na sua residência à frente da mulher e dos filhos pequenos. O próprio Duarte Cordeiro disse no desfecho desta investigação que, ao longo destes oito anos, nunca foi ouvido. Duarte Cordeiro é um dos quadros mais preparados do Partido Socialista, abandonou a política ativa, não porque o Ministério Público abriu uma investigação em que o seu nome estava envolvido, mas porque a justiça demorou oito anos a apurar factos que eram, no essencial, conhecidos deste a primeira hora.

A operação Tutti-Frutti concluiu com a acusação a 60 pessoas, dos aparelhos do PSD e do PS de Lisboa. Os 461 crimes descritos na acusação dizem respeito a acordos de bastidores feitos entre socialistas e sociais-democratas para ocuparem lugares políticos no município e fazerem ajustes diretos a beneficiar empresas ligadas a Sérgio Azevedo e Carlos Eduardo Reis, um antigo e um atual deputado do PSD. A provarem-se, as acusações são graves, mas o essencial dos factos de que consta a acusação são conhecidos, através de fugas de informação, há muitos anos.

Eram mesmo precisos oito anos para concluir esta investigação? Era mesmo preciso hipotecar a carreira de um dos políticos mais valiosos do Partido Socialista e de um ex-presidente de Câmara e ministro das Finanças? E quem me está a ler, estaria disposto a sujeitar-se a tamanhas humilhações para servir o país? Já percebeu porque é que temos uma classe política cada vez mais fraca? Eu já.

2. Talvez muito do que vou dizer abaixo se explique pelo que escrevi acima, mas não deixa de ser elucidativo da forma como os nossos políticos fazem escolhas decisivas.

Luís Garcia foi indicado no último Conselho de Ministros para o cargo de enfermeiro diretor do novo conselho de administração da Unidade Local de Saúde do Alto Minho (USALM). Menos de 24 horas depois do anúncio, o dito enfermeiro pôs o lugar à disposição, porque no hospital onde exerce funções tinha uma queixa recente por assédio sexual.

Depois das gaffes com a contratação do diretor do INEM e do diretor executivo do SNS, esperavam-se cuidados redobrados com novas nomeações. Qualquer pessoa, quando quer fazer uma contratação, obtém informações e referências sobre os quadros que quer contratar.  Erros destes levantam as maiores dúvidas sobre a competência da ministra da Saúde.

3 . Hernâni Dias foi ao Parlamento explicar que consultou a entidade da transparência antes de criar as duas empresas e que teve luz verde para o fazer. Tudo certo, de facto não é crime, é só falta de bom senso, o bem mais mal distribuído da humanidade.