Trabalhei mais de 30 anos, de 1982 a 2016, ao seu lado e José António Saraiva foi sempre um exemplo raro dos valores e qualidades que estão na base do grande jornalismo. Independência absoluta face aos poderes económicos, políticos ou profissionais, criatividade e capacidade de inovação, de quebrar fronteiras tradicionais, de lançar novos produtos.
Foi graças à sua visão moderna e arrojada que o Expresso se tornou ao longo dos anos 80 e 90 a maior referência do jornalismo português e o maior sucesso de vendas e rentabilidade no setor. Ancorado no vanguardismo cultural da Revista do Expresso, dirigida por Vicente Jorge Silva, o José António fez crescer a reputação de sólida independência política e de indisputável liderança noticiosa que se tornaram a imagem de marca do Expresso nesses anos. Foi graças a ele que falharam tentativas de disputar e destronar a liderança do Expresso, como as do Semanário, de Marcelo Rebelo de Sousa, lançado em 1986, ou O Independente, de Paulo Portas, criado em 1988.
O José António foi sempre mais um arquiteto no mundo do jornalismo do que um jornalista amante da arquitetura. Dava-lhe tanto ou mais prazer do que ter uma notícia em primeira mão a descoberta de um novo grafismo para o jornal, de novas secções ou de novos cadernos. Por isso citava recorrentemente o exemplo dos Guias de Portugal, que lançou nos anos 90, com o apoio do jornalista Rui Cardoso, e que levaram o Expresso a atingir tiragens e vendas históricas a rondar os 200 mil exemplares.
Conservador nos costumes, mas sempre transgressor e irreverente na inovação, o José António vivia com gosto essa aparente contradição. Tal como nunca deixou de admirar a insubmissão política e intelectual do seu pai, António José Saraiva, ao mesmo tempo nunca deixou de elogiar as qualidades do seu tio, José Hermano Saraiva, que foi ministro de Salazar.
Também conservador nas opções políticas, nunca deixou de ser ferozmente isento e imparcial nas análises que fez ao longo de quase 30 anos no Expresso e que se tornaram uma referência de leitura obrigatória.
O Expresso converteu-se naturalmente no grande alfobre dos projetos de comunicação em Portugal. Dele saíram quase metade dos jornalistas para fundarem o Público em 1990, muitos jovens talentos para o lançamento da SIC em 1992 e outra parcela de jornalistas e profissionais para a criação do SOL em 2006. Ao contrário de Pinto Balsemão, que via nestas roturas uma infantil e narcísica ‘traição ao pai’, o José António sempre incentivou e abriu as portas aos que queriam sair para lançar novos desafios e diferentes projetos de carreira.
Nunca me arrependi, apesar de muito solicitado, de não ter saído para o Público em 1990, onde tinha grandes amigos, como o Vicente Jorge Silva, a Teresa Schmidt, o Jorge Wemans ou a Lucília Santos. Tal como nunca me arrependi de ter embarcado com o José António, a Ana Paula Azevedo, o Vítor Rainho, o Mário Ramires, o José Cabrita Saraiva e a Carolina Silva (e o apoio do amigo Manuel Boto) nesta entusiasmante e arriscada aventura de lançamento de um novo e desempoeirado semanário, o SOL. Aprendemos e crescemos muito nestas aventuras.