Faróis sem luz

O sistema político assente na autocracia do controlo dos partidos constitui um forte impeditivo à rota meritocrática de acesso ao poder. Os boys tornaram-se os faróis.

Num tempo onde o mundo apresenta novas fontes de instabilidade e incertezas geoestratégicas que afetam de forma intensa as economias, verifiquei, ao analisar em detalhe os programas eleitorais dos partidos uma profunda, e preocupante, ausência de opiniões, visões e projetos que permitam a Portugal ter projetos e posições de intervenção internacional em matérias de economia, diplomacia, defesa e geopolítica.

Considero que o tempo que atravessamos obriga a reflexões profundas e a posições claras sobre o futuro e condicionantes ao normal funcionamento da NATO. Portugal enquanto país mais ocidental da Europa e detentor de uma das mais importantes ZEE do mundo não deveria, em seriedade, negligenciar na forma que os partidos fazem matérias tão importantes. Para alem do sim ao não, de nível primário, à permanência na NATO os partidos não apresentam posições nem propostas de desenvolvimento. As ausências de posições estendem-se a matérias tão importantes como a criação de uma força militar conjunta europeia, o desenvolvimento e modernização das forças armadas, com particular destaque para, em contexto europeu e em face da gigantesca ZEE, a importância de desenvolver a marinha assegurando um papel de referência europeu para tão importante instituição. Não há uma linha escrita, em nenhum dos programas, quanto aos investimentos em ciência, tecnologia e investigação aplicada para desenvolvimento de soluções de duplo uso (civil e militar) que permitam melhor explorar o potencial económico e geoestratégico do mar atlântico.

Não há referências aos conflitos da Ucrânia nem do Médio Oriente. Não há posições claras relativamente a Israel, Palestina e Irão. Não há quaisquer indícios, nesses programas, sobre a visão quanto às relações económicas com a China. Considero que Portugal com a a história de séculos de boa relação com a China, no que a Macau diz respeito, tem a obrigação de liderar em contexto europeu as pontes com a China; difícil? Sim, mas dos fracos não reza a História.

Não há referências ao desenvolvimento de plataformas de inovação e partilha socioeconómica na lusofonia. A negligência quanto a uma das mais evidentes áreas de atuação internacional condenam à incapacidade o aproveitamento da história comum e do idioma comum a vários continentes. O idioma português é o mais falado no hemisfério sul. Esse potencial linguístico e histórico não tem tradução na preocupação ou visão estratégica dos fracos programas dos partidos que pretendem governar (mal porque efetivamente são fracos). Os líderes e os programas são efetivamente faróis sem luz.

A falta de noção sobre a economia portuguesa e sobre o desenvolvimento da economia portuguesa está bem patente na ausência de uma estratégia para Portugal. O modo nulo como abordam a posição de Portugal no mundo constitui mais uma demonstração da incapacidade para (bem) governar o país.

Independentemente do resultado de domingo não teremos a conduzir os destinos comuns um projeto robusto, desafiante e agregador. Assistiremos a muitas palavras, muito debate, muito ataque, muita vitimização, mas não sairemos do mesmo lugar.

O sistema político assente na autocracia do controlo dos partidos constitui um forte impeditivo à rota meritocrática de acesso ao poder. Os boys tornaram-se os faróis.

Faróis sem luz.

CEO do Taguspark, Professor universitário