O meu filho mais novo diz que eu sou pouco rigorosa. Reclama que os irmãos mais velhos têm razão quando me acusam de não o educar como devia ser. Num desabafo sentido e maduro, passou-me um liminar atestado de incompetência maternal sem rodeios. Se pudesse dar-me uma nota, este meu filho dar-me-ia a mesma nota que Ana Gomes dá a qualquer político que não seja de esquerda, entre o 0 e o 2. Tudo isto porque está com más notas e acha injusto a responsabilidade ser apenas sua. Diz ele que eu só me zango para ele arrumar o quarto ou quando demora a jantar, de resto, queixa-se: “A mãe só se ri comigo e leva tudo para a brincadeira”. Citou os irmãos que dizem diariamente que eu devia ser mais rigorosa e culpou-me sem piedade nenhuma pela sua falta de disciplina nas aulas, pelos TPC que ficam por fazer e por não saber de cor as datas dos testes. “Uma mãe não pode ser assim”, reclamou. Diz que eu sou “infantil”. Fiquei pregada ao chão, muda.
Este meu filho faz basicamente o que quer, é uma exceção diária às regras. Não tem hora certa para ir para a cama, passa o inverno de calções porque sim e normalmente não come tudo o que tem no prato. Achei que seria uma criança feliz por isso mesmo, porque não chateio nem metade daquilo que chateei os outros, porque não tem regras definidas e porque, de facto, faz o quer. Mas afinal não.
O quarto, o quinto ou sexto filho, desde que seja o último, não se educa, gere-se. A experiência, infelizmente, leva-nos a ter a mesma confiança que levou a lebre a perder contra a tartaruga. Com tanto filho e tanto passado, escolhemos as batalhas que valem a pena travar e temos a convicção de que quando os miúdos crescerem as arestas estarão limadas. Somos pais com fé, portanto. Cada coisa a seu tempo e o tempo presente tem de ser aproveitado com toda a descontração, boa disposição e poucos conflitos. Não quer não vai; não gosta, não come; não lhe apetece, não faz. Não se faz, mas nós, pais experientes, fazemos. E tudo porque temos uma rede infalível: os filhos mais velhos educam por nós. Eles corrigem, zangam-se, impõem-se, estabelecem as hierarquias e até nos protegem quando o mais novo passa dos limites. Nós, pais, só temos de sorrir e acenar. Por outro lado, esta forma de ser pai ou mãe torna tudo mais divertido. A opção irracional (diga-se) em não educar faz com que tudo não seja levado muito a sério. Não existindo planos, não há nada para cumprir.
O pior é que os miúdos sofrem com tanto divertimento. A falta de regras e de exigência, de autoridade e de limites, é como atirá-los para cima de uma bicicleta sem rodinhas quando eles ainda não se sabem equilibrar. As crianças precisam de saber quais as regras do jogo para poderem experimentar limites sem grandes riscos.
Perante esta chamada de atenção da criança de 11 anos, prometi-lhe com humildade que iria ser mais rigorosa, assim como quem promete uma viagem à neve, ou uma Playstation 5. Garanti-lhe que ia fazer um esforço. E assim foi. Tenho vários filhos a tomar conta da situação: um estuda com ele, outro deita-o, outro controla o telemóvel, outro regista todas as desobediências e eu continuo a divertir-me com ele. O plano, esse, é que ele cresça devagarinho.