Há poucas coisas que representem tão bem o povo português quanto a relação que temos com o Verão, o Natal e os feriados. O nosso calendário, ritmo de trabalho e agenda depende destes períodos. O problema português é que não nos condicionamos apenas pelos dias ou mesmo semanas, mas por meses. Chegados a maio, começamos a ouvir, “agora mete-se o Verão, mais vale marcar essa reunião lá para setembro”, “é melhor fechar isso até maio porque depois metem-se os santos e as férias e já não vai dar”. Começamos a reduzir o ritmo até a letargia absoluta em maio, junho no máximo. O início de junho, marcado pelo início da época balnear já não é mês para reuniões. Deixa de se conseguir iniciar projetos, processos, planos ou mesmo tomar decisões importantes, entre maio e agosto. Depois, é uma correria. Metemos a primeira e arrancamos em alta rotação até novembro. No início do 11.º mês, travamos a fundo: mete-se o Natal e o Ano Novo, e volta a “não vai dar”.
Vivemos assim, como vivemos tudo: a 8 ou 80. Com os miúdos passa-se o mesmo. Antes do final do ano letivo, há um período reservado para as festas de final do ano letivo. Entre teatros, preparação de teatros, festas, ensaios, as férias dos miúdos começam muito antes do calendário oficial. Acabam-se os testes e as avaliações em meados de maio e começa a festança que dura até outubro, altura em que a criançada entra no ritmo dos estudos.
Não temos tempo para trabalhar como deve ser. Vivemos num país com milhares de santos e uma Nossa Senhora para cada palavra do dicionário. Temos bom tempo, os dias são grandes, a comida é boa, o vinho uma tradição e o trabalho uma obrigação. Trabalhamos porque sabemos que mais mês menos mês temos feriados, férias ou fins de semana grandes.
Eu acho que assim, com este espírito livre e inconsequente, vive-se melhor. Uma reunião é adiável, um projeto pode ser sempre agendado para quando estiver menos calor e é melhor garantir que ninguém está de férias quando nos propomos a avançar com ideias novas. Mais tarde ou mais cedo tudo se faz. O clima e as estações do ano, esses, não esperam. Se há povo que sabe aproveitar as coisas boas da vida somos nós e não há força europeia, costume estrangeiro, rotina germânica ou pontualidade britânica que se atravessem no nosso caminho. Assim como a paz é o período entre duas guerras, também a o trabalho é um período entre duas férias, com várias interrupções pelo meio. É mais fácil trabalhar assim, até porque tudo aquilo que é urgente, vai-se a ver, e afinal não era. Bastava esperar e não marcar a reunião para se perceber isso.
Agora, mete-se o Verão e não vai dar para escrever mais disparates. Pelo menos, por enquanto. Por outro lado, depois vem o Verão de São Martinho, logo a seguir o Natal e se calhar este ano já não vai dar. Logo se vê.