No artigo da passada semana queixei-me de como os governantes tendiam a fugir do risco da tomada de decisões para o refúgio dos planos estratégicos. É, pois, de elementar justiça que esta semana celebre uma exceção: o ministro Fernando Alexandre (FA). Em menos de 18 meses ele demostrou ter uma visão, capacidade estratégica e, acima de tudo, coragem para as por em prática.
O sistema de apoios à Ciência e Transferência de Tecnologia data dos anos 90 do século passado e tem dois pilares fundamentais, a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e a Agência Nacional de Inovação (ANI). Por debaixo, no terreno, – com de suas largas dezenas de ‘instituições de interface’, laboratórios associados e de estado, e centenas de unidades de investigação –, o ecossistema apresenta-se disperso, com funções por vezes sobrepostas e sem uma estratégia coerente. Os resultados, medidos pela produção científica, têm sido positivos. Contudo, se nos preocuparmos também com o impacto económico e social do novo conhecimento – como faz o ministro e devem fazer todos os que se preocupam com a utilização do dinheiro dos contribuintes –, os resultados são menos claros. Parece-me, pois, inteiramente natural querer revisitar a organização do sistema de apoios à Ciência e Inovação introduzindo novos focos estratégicos e critérios de aferição, para mais num quadro em que os termos dos financiamentos europeus se vão alterar. A fusão da FCT e da ANI é a solução? Não sei, veremos!
O Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (RJIES) é outra herança muito positiva de Mariano Gago, com a qual tentou por fim à gestão democrática das universidades. A experiência 20 anos transcorridos aconselhava a sua revisão, e FA avança com vários desenvolvimentos muitos positivos, designadamente o reforço da autonomia, a voz dada aos antigos alunos e, sobretudo, a proibição do recrutamento endogâmico dos professores. Estranha e infelizmente, todavia, não põe fim à endogamia gestionária pois, ao invés de aprofundar a accountability externa, regressa ao sistema pré RJIES de eleição direta dos reitores.
Finalmente, a proposta de eliminação dos tetos às propinas dos mestrados. As críticas que logo se ouviram mostram que muitos não acreditam na capacidade de autogoverno das IES nem nas virtualidades da competição entre estratégias alternativas para o seu desenvolvimento. A abolição dos tetos não força qualquer instituição a aumentar as propinas nem que todas tenham as mesma propinas. Aquelas que concorram em mercados internacionais e tenham ofertas que proporcionam salários médios elevados cobrarão, naturalmente (e com justiça), propinas relativamente caras. Outras, que optem por mestrados integrados virados para o mercado interno, terão outras ofertas a outros preços. Também não colhe a preocupação do ‘ensino para ricos’: o maior ativo de qualquer instituição são os seus estudantes, em particular os de maior potencial. Nenhuma IES responsável quererá, assim, deixar de fora estudantes talentosos por motivos de capacidade para pagar.
Pode discutir-se o mérito de algumas medidas – e, como escrevi, algumas suscitam-me reparos –, mas isso não é, para mim, o essencial. Destaco, antes, – para desespero das corporações dos interesses instalados, daqueles para quem o debate e a consulta são pretextos para o imobilismo – como Fernando Alexandre recusou perder tempo com diagnósticos já há muito feitas passando, resoluto, à ação. As reformas não se fazem procurando consensos; quem o faz não quer reformar.