‘A PSP não tinha que comunicar a operação à PJ’

Há 30 anos que a PSP e a PJ não se entendem quanto à investigação ao tráfico de droga. A PJ ficou muito incomodada com a maior apreensão da PSP, e Luís Neves quer resolver o problema entre pares, mas Bruno Pereira, do SNOP, diz que a PJ é que não quer colaborar.

É mais um episódio da ‘guerra’ entre a Polícia Judiciária (PJ) e a Polícia de Segurança Pública (PSP), e parece que ninguém vai conseguir ‘acalmar’ as hostes. É verdade que a guerra já é antiga, e que a PJ não gosta de ver a PSP e a GNR a investigar o tráfico de droga, enquanto as duas forças de segurança avançam com números.

Mas vamos aos factos. No dia 21 de outubro, a PSP fez o seguinte comunicado: «O Comando Metropolitano de Lisboa, através da Divisão de Investigação Criminal, com apoio de várias outras valências da Polícia de Segurança Pública (PSP), entre os dias 17 e 20 de outubro, realizou uma operação de grande envergadura, dirigida e destinada ao combate ao tráfico de estupefaciente na zona da Grande Lisboa». A investigação – que resultou na maior apreensão de sempre de haxixe por parte da PSP, além de duas lanchas rápidas, e que culminou com a detenção de sete suspeitos – «foi desenvolvida pela PSP, ao longo dos últimos 8 meses, sob a direção da 1.ª Secção do Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa», revelou a Polícia.

Aproveitando a confusão instalada nos aeroportos, porque 130 antigos elementos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que já estão nos quadros da PJ, terão que ficar mais seis meses nessas funções, o Sindicato do Pessoal de Investigação Criminal da Polícia Judiciária (SPIC-PJ) fez um comunicado muito crítico para a PSP. O_sindicato diz que são os homens de Luís Carrilho, leia-se PSP, que terão de resolver o seu problema de falta de organização, e quer os 130 elementos do antigo SEF rapidamente a trabalhar para a PJ. Mas o comunicado não deixou de dar uma bicada na ‘guerra’ da droga: «Com esta opção, caiu-se no paradoxo de ter inspetores da Polícia Judiciária a controlar fronteiras nos aeroportos, função da PSP, enquanto agentes da PSP continuam a tramitar situações de tráfico de estupefacientes, de tráfico de seres humanos e de falsificação de documentos que são competência da PJ», disse Rui Paiva, presidente do sindicato._

Luís Neves, diretor nacional da PJ, foi mais lacónico quando questionado sobre as críticas dos seus homens:_«Há situações que importam ser discutidas na intimidade do próprio Estado e é isso que faremos». Já a PSP diz que é completamente falso que não tenham comunicado nada. «A operação, sob direção do Ministério Público, foi comunicada à PJ no âmbito do protocolo UCIC», diz fonte policial ao Nascer do SOL.

PJ não liga a plataforma comum

O que diz a lei sobre o UCIC? «A legislação sobre a UCIC (Unidade de Coordenação de Informação e Combate ao Terrorismo) está integrada na legislação de segurança interna, que estabelece as políticas de segurança interna, e nas leis que definem o papel das forças de segurança e os regimes de atividade de segurança privada. Esta legislação abrange a coordenação de informações e ações de prevenção criminal, incluindo cibercriminalidade e outras ameaças, e a cooperação entre as diferentes forças de segurança».

 Passemos a palavra a outro sindicato, o dos Oficiais de Polícia da PSP, que tem uma leitura muito própria sobre esta ‘guerra’. Bruno Pereira, o presidente, tem sido o rosto no confronto com a PJ. «A PSP não tem que comunicar operação nenhuma à Polícia Judiciária, porque a PJ não é o Ministério Público. Não detém qualquer poder, qualquer competência, para interferir numa investigação em curso, numa investigação que, como todas as outras, também as da PJ, é tutelada pelo Ministério Público».

 O sindicalista da PSP lembra que a apreensão que acicatou mais os ânimos «está indiscutivelmente relacionada com o tráfico internacional de haxixe, que é feito maioritariamente por via marítima». Bruno dá mais dados: «Poderíamos falar sobre outros tipos de tráfico internacional, nomeadamente heroína. Curiosamente, ao longo de sucessivos e constantes anos, a PSP é aquela que não só apreende a maior quantidade, mas detém o maior número de suspeitos e faz o maior número de apreensões».

 O ‘relatório’ de Bruno Pereira tem mais dados: «Mas não é só na heroína, na apreensão, detenção e volume de drogas sintéticas, a PSP é, nos últimos 10 anos, aquela que mais apreende, aquela que mais detém e aquela que mais apreende em volume. A GNR é aquela que, normalmente, apreende mais haxixe. Porquê? Por causa do controle marítimo, apreende mais barcos que vêm do norte da África. E depois temos a PJ, que mais apreende em volume global, em volume, não é o número de detenções e de apreensões, em volume global, cocaína».

Bruno Pereira entende que o decreto-lei de 95 já está maioritariamente derrogado pela Lei de Organização da Investigação Criminal (LOIC). E, apesar de tecer críticas a duas leis do LOIC, o presidente do sindicato dos oficiais da PSP relembra que está nessa lei uma plataforma de Sistema Integrado de Informação Criminal (SIIC), e que a PJ se recusa a utilizá-la. Por isso, «ninguém usa a plataforma». Para que não fiquem dúvidas, o que diz o SIIC? Que «o dever de cooperação previsto no artigo anterior é garantido, designadamente, por um sistema integrado de informação criminal que assegure a partilha de informações entre os órgãos de polícia criminal, de acordo com os princípios da necessidade e da competência, sem prejuízo dos regimes legais do segredo de justiça e do segredo de Estado».

Defende que todos deveriam inserir os dados nessa plataforma, até para não se atropelarem uns aos outros, já que a PJ, PSP e GNR, podem ter investigações com muitas ramificações, e que em caso de conflito, seria o Ministério Público a decidir quem continuaria com a investigação ou se trabalhariam em conjunto. Bruno_Pereira entende que as três forças, PSP, GNR e PJ, não chegam para as ‘encomendas’ do tráfico de droga. «Custa-me imenso andarmos aqui a discutir fait divers e coisas sem sentido, quando devíamos era verdadeiramente estarmos todos alinhados na promoção da melhor capacidade de resposta que podemos dar para que o sistema seja verdadeiramente eficiente no combate a este fenómeno criminal», acrescenta.