Arrancaram esta semana os primeiros debates para as Presidenciais 2026, com o frente-a-frente de António José e André Ventura, que vão prolongar-se até às vésperas do Natal (o último será a 22 de dezembro, entre Henrique Gouveia e Melo e Luís Marques Mendes)
Vistos os dois primeiros (o segundo opôs António Filipe a Marques Mendes e o terceiro, entre Gouveia e Melo e João Cotrim Figueiredo, só foi ontem à noite, já com esta edição fechada) o Nascer do SOL_ouvir diferentes analistas sobre a importância destes debates no processo de escolha do sucessor de Marcelo Rebelo de Sousa em Belém.
Para o colunista Alberto Gonçalves, «boa parte dos eleitores já consolidou o sentido de voto» e estes debates «podem ser vistos como uma forma de pregar aos convertidos». «Na grande maioria, os eleitores já sabem em quem votar. Os debates não vão alterar o sentido de voto», assinalou. Todavia, disse acreditar que estes frente-a-frentes podem, «pontualmente, servir para influenciar o sentido de voto, talvez mais pela negativa do que pela positiva». E avançou mesmo com um exemplo para justificar a afirmação anterior: «Tudo indica que isso acontece no caso do candidato Gouveia e Melo. Parece que sempre que fala, perde eleitores».
Já sobre o número de debates televisivos (28 no total), o colunista foi categórico: «Não faz sentido tantos».
Debates a Mais
«Se do ponto de vista da justiça e da equidade entendo que aconteçam, já quanto à utilidade, penso que não. Quantos portugueses haverá que vão assistir a todos os debates? O número de debates é excessivo. Ridículo», atirou. Considerou que faz pouco sentido que «todos debatam com todos» e defendeu que o «mais razoável seria os mesmos acontecerem entre os quatro, talvez cinco candidatos que vão ser mais votados na primeira volta». O colunista duvida, por outro lado, que os canais que transmitem os debates vejam as audiências subir.
«Não me parece que os debates tragam ganhos de audiências. Como também não me parece que um debate entre Catarina Martins [candidata e eurodeputada do BE] e Jorge Pinto [deputado do Livre] traga muita audiência às televisões. Não tenho nada contra o candidato do Livre, mas ninguém sabe quem é», adiantou.
E concluiu: «Admito que um desempenho brilhante ou desastroso, num debate, possa levar a ganhos ou perdas de votos. Mas, sinceramente, não prevejo que isso venha a acontecer em qualquer um dos frente-a-frente programados».
Na opinião do professor de Ciência Política da Católica João Pereira Coutinho, «parece que há candidatos a mais, o que significa que há debates a mais. E estes, em matéria de audiências, não são mobilizadores, uma vez que os candidatos não são propiramente inspiradores».
É bom serem curtos
«Digamos que há uma certa fadiga de debates nas presidenciais. Há, contudo, um único aspeto positivo: no meio do excesso, o mal menor é serem debates curtos e isso obriga os candidatos a concentrarem-se nos pontos essenciais dos programas, poupando os espectadores a excessos de linguagem e demagogias. Torna-os mais tragáveis», disse.
Sobre os frente-a-frentes poderem influenciar o sentido de voto, Pereira Coutinho mostrou-se dividido: «Pode acontecer, tanto para penalizar, como para beneficiar». E exemplificou: «O mais exposto é Gouveia e Melo. É o mais impreparado politicamente. É o mais suscetível a fazer afirmações que depois têm de ser desmentidas ou corrigidas. Como já aconteceu. Já o mais beneficiado pode vir a ser o candidato Cotrim de Figueiredo. É bom a debater e resulta bem em televisão. Isso pode permitir que no final do ciclo de debates possa sonhar com a possibilidade de chegar a uma segunda volta». «Não creio que os debates possam levar a uma mudança radical no sentido de votos dos eleitores», concluiu.
Eduardo Cintra Torres, comentador do Correio da Manhã, disse acreditar que «a esmagadora maioria dos espectadores vê um número reduzido de debates». «Só acha que há debates em excesso quem se sente obrigado a ver todos: jornalistas e comentadores», adiantou.
Debates ou programas?
Para Cintra Torres, «os cidadãos eleitores podem escolher debates, como escolhem programas, conteúdos ou até produtos na mercearia. Cada um vê os debates que lhe interessam». «Mas o que se conhece é que os espectadores não vêem programas enquanto eleitores e os eleitores não votam enquanto espectadores. Pode gostar de um candidato num ou mais debates e votar noutro candidato por uma qualquer razão», prosseguiu.
O comentador considerou também que «os debates podem ser decisivos, no sentido em que basta um voto para um candidato ganhar ao segundo classificado». «Um ou mais debates podem ser decisivos se um candidato conseguir através deles acrescentar a intenção de voto e isso ser suficiente para alcançar uma vitória eleitoral [passagem à segunda volta ou eleição]», disse. E acrescentrou: «Pode acontecer, mas para sabê-lo é preciso ter a humildade de perguntar às pessoas, através de inquéritos representativos (as sondagens) pós-eleitorais. Normalmente em Portugal não se fazem inquéritos pós-eleitorais, portanto ficamos sem saber qual a influência no voto dos debates e das entrevistas pré-eleitorais».
A terminar, o comentador considerou que «há uma questão que é preocupante no jornalismo português e em especial no ‘comentariado’: há quem escreva a partir da perspectiva pessoal baseada no preconceito de que os eleitores são estúpidos. Daí que escrevam muitas coisas sobre a ‘maioria’ dos eleitores e ‘tendências’ de voto que não podem de maneira alguma provar».
O primeiro dos 28 debates aconteceu na passada segunda-feira, na TVI, e ultrapassou a fasquia de um milhão de espetadores, em média, ao longo de todo o frente-a-frente. Foi mesmo o programa mais visto do canal, naquele dia, indicaram dados das empresas de audiometria. No dia seguinte, terça-feira, a SIC transmitiu o frente-a-frente entre os candidatos Luís Marques Mendes e António Filipe. O debate atraiu quase 800 mil espetadores. Ontem, quinta-feira, os debates voltaram às televisões, desta vez na RTP, com Gouveia e Melo e Cotrim de Figueiredo.