Manuela e Cavaco, amigos como antes

Apesar de parecerem mais afastados, a relação de Manuela Ferreira Leite e Cavaco Silva continua a ser o que era.

Ferreira Leite assinou o polémico manifesto dos 70 mas tem vindo a defender uma sintonia com Cavaco Silva, que se demarcou publicamente das ideias expressas no documento.

Nas suas mais recentes intervenções, quer no seu comentário habitual na TVI24 quer no Fórum das Políticas Públicas, que reuniu os responsáveis pelas Finanças entre 20002 e 2013, a ex-ministra sugeriu implicitamente que as suas reflexões e as do Presidente da República são complementares e ‘encaixáveis’.

Afinal, ambos alertam para o impacto que o pagamento da dívida pública terá para o país nos próximos 20 anos. Sendo que Ferreira Leite vai mais longe, neste momento, e diz mesmo que é “inexequível” reduzir a dívida pública para 60% do PIB, uma vez que exigiria um crescimento económico de 4% ao ano durante os próximos 20 anos e uma taxa de juros não superior a 4%. O que “não é possível”, garantiu a ex-ministra. E, por isso, entende que faz todo o sentido discutir neste momento os caminhos que Portugal tem pela frente.

Já no cenário que o Presidente da República traça no prefácio do seu Roteiros VIII também fica a chamada de atenção de que Portugal ficará ‘preso’ à troika até 2035, altura em que poderá estar em condições de ter liquidado 75% da dívida, mas que para isso teria de crescer 4% ao ano.

“Num horizonte temporal muito alargado, se Portugal se afastar de uma linha de rumo de sustentabilidade das finanças públicas, de controlo das contas externas e de estabilidade do sistema financeiro suportará, de forma inescusável, novos e pesados custos económicos e sociais”, adverte o chefe de Estado.

A tomada de posição de Ferreira Leite como uma das subscritoras do manifesto dos 70 e a demarcação de Cavaco Silva do documento com a exoneração dos seus consultores Sevinate Pinto e Vítor Martins, que também assinaram o manifesto, sugeriam que as relações entre a ex-ministra das Finanças e o Presidente da República podiam já não ser o que eram. Mas não só em Belém se assegura o contrário – e que a amizade entre ambos continua e que falam com regularidade – como sociais-democratas próximos de Ferreira Leite garantem que as relações com o Presidente da República “não saíram beliscadas” depois deste episódio.

No seu habitual espaço na TVI24, a ex-ministra das Finanças não quis comentar as exonerações dos dois consultores de Cavaco que assinaram o manifesto, mas não terá sido por acaso que sublinhou que o Presidente da República foi “o primeiro a preocupar-se” com o pós-troika”.

E defendeu que “é exactamente nesta altura” que este assunto tem de ser discutido: “Vamos estar no pós-troika, precisamos de ponderar a nossa vida depois da troika”. Precisamente a matéria a que Cavaco Silva dedica o prefácio do seu Roteiros VIII.

sofia.rainho@sol.pt