Pior do que falir

No primeiro semestre deste ano iniciaram-se menos 17% processos de falências de sociedades do que em igual período de 2013, segundo a Informa D&B. Mas houve uma baixa de 12% no número de empresas que recorreram ao processo especial de revitalização (PER). 

O PER ainda não encontrou uma fórmula eficaz, que satisfaça as Finanças, por exemplo. Estas travam vários desses casos para não abdicarem de receitas fiscais. Quase um terço das empresas que recorre ao PER tem falido. 

O sentimento de vergonha que entre nós envolve as falências empresariais prejudica o papel que lhes devia caber: eliminar empresas inviáveis, libertando recursos susceptíveis de serem melhor aplicados em empreendimentos que venham a gerar lucros e a empregar pessoas.

 No segundo trimestre do corrente ano nasceram na economia portuguesa  mais quase 5% empresas do que no segundo trimestre de 2013. Em Junho, relativamente a Junho  do ano passado, a subida foi de 10%. É positivo, mas poderia ter sido ainda melhor se não fosse hábito nacional manter em funcionamento empresas tecnicamente falidas, um desperdício de recursos humanos e materiais. Ou, mais grave ainda, de o fazer à custa do banco da família, caso do BES. É pior do que falir.

A comparação entre o que se passa na Europa (incluindo Portugal) e a prática corrente nos Estados Unidos é instrutiva. Os americanos são eficazes na protecção, face aos credores, das suas empresas em pré-falência, desde que mostrem viabilidade a prazo e aceitem mudanças na gestão. Além disso, falir nos EUA significa apenas uma tentativa falhada, devendo o empreendedor aprender com os erros cometidos e partir para outra. Mas os tribunais são rápidos em eliminar as empresas inviáveis. Pelo contrário, a lentidão da justiça portuguesa não ajuda nem a salvar empresas viáveis mas com problemas de tesouraria, nem a eliminar as inviáveis.
 
Por outro lado, Daniel Gros, Director do Centro de Estudos de Política Europeia, afirma que a diferença de crescimento económico entre a zona euro e os EUA nos últimos três anos (a economia americana cresceu 6 pontos de percentagem mais do que a da zona euro) tem muito a ver com a legislação sobre execução de hipotecas de casas.  

Quando, nos EUA, o comprador de uma habitação a crédito, com garantia hipotecária, não consegue pagar os juros e as amortizações da sua dívida, entrega a casa ao banco. Não é uma situação simpática, mas pelo menos a dívida fica saldada, ainda que (como aconteceu  milhões de vezes desde 2008) o valor da casa tenha descido para um nível abaixo do empréstimo.

Na Europa, pelo contrário, o devedor executado entrega a casa, mas continua a dever ao banco aquela diferença. Além de que o processo judicial nos países europeus pode demorar longos anos (em Portugal, sobretudo), enquanto na América em regra leva menos de um ano.
 
Daí que, salienta Daniel Gros, o endividamento das famílias europeias tenha travado o consumo, enquanto as famílias americanas conseguiram libertar-se rapidamente desse travão. Assim, apesar do desemprego e da estagnação dos salários, regressaram a apreciáveis níveis de consumo, que é o principal motor da economia americana. 

Para Daniel Gros estes factores são mais influentes do que a tão debatida austeridade na fraca recuperação económica da zona euro. Mas quase ninguém fala deles.