Outono/Inverno

Este foi o meu primeiro ano como pessoa adulta em que as minhas roupas começaram a morrer de velhice, que é como quem diz, de uso.

Primeiro foram umas sandálias que se desintegraram completamente e tiveram de ficar pelo caminho. Felizmente estávamos em Marrocos e foram, pronta e alegremente, substituídas por outras.

Depois, foi o bikini que quase morreu na praia.

Mais recentemente, um segundo par de sandálias acabou no lixo, depois de várias tentativas frustradas de as trazer de volta à vida, ou seja, de lhes colar as solas.

Vivesse eu ainda em Lisboa e, entre os saldos e as tendências da nova estação, não teria sido apanhada desprevenida. Agora, quando se vive entre o campo e a cidade, a uma centena de quilómetros das lojinhas a que estamos habituadas, corre-se o sério risco de ficarmos a braços com o pior dos nossos pesadelos: um roupeiro praticamente vazio e nada para vestir.

Como é que uma rapariga passa sem as t-shirts de rapaz e as Doc Marten? Como é que uma rapariga, no meio do Alentejo, pode antever as tendências das próximas estações e descansar a vista da paisagem campestre?

Para começar, uma jovem lisboeta nesta situação passa tão mal como passaria um alentejano em Lisboa sem o pão da sua terra e sem a comida da sua mãezinha. E começa a depender da bondade dos amigos e familiares que vêm de visita.

E, de cada vez que isto acontece, começa a pedinchice com uma semana de antecedência, para dar tempo às pessoas para procurarem: é 'aquele' casaco, 'este' batôn, o último livro do autor preferido, etc.

As compras on-line nem sempre são opção, ora porque precisamos das coisinhas para ontem, ora porque não temos a certeza de que nos ficarão bem (e depois é preciso devolver a encomenda à proveniência e esperar pela devolução do nosso dinheiro). A internet, na maior parte das vezes, serve para regalar a vista e para saber o que pedinchar e a quem pedinchar.

A vida no Alentejo simplifica imenso algumas coisas. Por exemplo, já deu para perceber que as sabrinas são um tipo de calçado sem utilidade absolutamente nenhuma. No Verão está demasiado calor para as usar, e no Inverno, com o frio e a chuva, não há calçado delicado que aguente. As sabrinas são coisa para uma ida à cidade e pouco mais.

Já as botas são um must-have: para o frio e para a chuva no Inverno, e de Verão ajudam a manter os pezinhos a salvo da bicheza rastejante e companhia limitada.

Por outro lado, ser uma rapariga do campo já não é sinónimo de usar bigode, lenço preto na cabeça a esconder um cabelo baço e mal tratado, e bata ou avental.

Nos dias que correm – e por culpa, com certeza, da globalização -, mesmo as moças do campo querem-se arranjadinhas, ainda que isso signifique uma manicure impecável e unhas pintadas quando se passa metade do dia com as mãos enfiadas na terra ou em remodelações.

Numa altura em que tudo o que é mulher começa a olhar para as colecções Outono/Inverno, depois de já ter ido aos saldos a pensar nas tendências da próxima estação, aqui, entre o campo e o mar, os dias de sol aproveitam-se ao máximo e sem pressa nenhuma.

A preocupação com o Outono/Inverno não é tanto em seguir as novas tendências mas em perceber se teremos lenha e pinhas suficientes para combater o frio…