A economia comanda a vida?

Aumenta a impressão de que, cada vez mais, a nossa vida é determinada por decisões privadas na área económica e sobretudo financeira, com prejuízo da decisão política democrática. Os gestores económicos, no sector empresarial e noutros (gente que joga nos mercados, por exemplo), não respondem perante os eleitores; quando muito, responderão face a accionistas.

Um dos grandes problemas do século XXI é enquadrar politicamente a globalização, evitando que a própria democracia perca sentido. O que só se conseguirá com uma conjugação de esforços dos dirigentes mundiais, liderados pela única superpotência, os Estados Unidos. A presidência de George W. Bush fez o contrário, desprezando a lei internacional e a própria cooperação com outros países. E Obama frustrou as esperanças de uma séria viragem nesta matéria. 

Graças às tecnologias de comunicação a globalização avançou rapidamente na área financeira. Contra o que por vezes se diz ou se sugere, o sector financeiro também é um factor produtivo, ao fornecer serviços úteis para a actividade económica. Mas o peso deste sector no conjunto da economia cresceu porventura demais nos últimos vinte anos.

A ideia de que a vida em sociedade depende, em última instância, da esfera económica era central na ideologia marxista, hoje largamente abandonada. Mas ideia semelhante também se encontra entre liberais (no sentido económico) e economistas ilustres. A convicção de que a expansão do comércio internacional impedia a guerra entre as nações desenvolvidas (um célebre livro britânico defendeu essa tese em 1911…) e de que o mercado é supremo e sem limites, ou ainda de que as pessoas tomam grande parte das suas principais decisões em função de cálculos económicos – tudo isso é um conjunto de ilusões, que a realidade desmente.

Repare-se nas graves ameaças que hoje o mundo enfrenta. O radicalismo islâmico, agora com um esboço de Estado – com território, exército, tanques, etc -, tem pouco a ver com motivações económicas, embora o acesso a poços de petróleo ajude à compra de armas. O mesmo se diga da política de Putin, que visa de alguma forma recriar o antigo império soviético (agora sem ideologia), ainda que tal implique perdas económicas. Por exemplo, perder tecnologia ocidental, de que a Rússia precisa até para a produção de petróleo e gás natural.

Os nacionalismos que aspiram à independência (Escócia, Catalunha, Flandres, Norte de Itália, Baviera, etc) manifestam-se sobretudo em zonas ricas, ou que se julgam ricas (a produção de petróleo do Mar do Norte, que estimulou o nacionalismo escocês, está em declínio). Estes nacionalismos não querem pagar para regiões menos ricas. Mas na sua raiz está principalmente o receio de perderem a identidade num mundo que a globalização torna multicultural.

O caso da China é curioso. Contra o que aconteceu na Revolução Francesa, onde uma burguesia rica e culta não tolerou manter-se afastada das decisões políticas, até aí reservadas à aristocracia, os já numerosos milionários chineses parecem confortáveis com a manutenção do monopólio do poder político nas mãos do partido único.

A preponderância de decisões financeiras 'sem rosto' é decerto um problema muito sério. Mas o alegado domínio da economia sobre a política parece exagerado. A política não desapareceu.