Caos nas escolas por resolver

As contas às despesas do último mês são fáceis de fazer, diz Ana, professora de Biologia e Geologia: “Foram 350 euros de renda, três viagens ao Sabugal que custaram 360 euros, mais as despesas com alimentação porque, como ainda não tinha a casa toda equipada, tive de comer fora várias vezes”. Professora contratada há dez…

Caos nas escolas por resolver

Os quase mil euros que a docente gastou neste mês para poder  trabalhar poderão ser incluídos nos encargos que o ministro Nuno Crato prometeu compensar no caso dos professores que ficaram sem emprego devidos aos erros da primeira bolsa de contratação. Mas para Ana “não há indemnização que pague o stresse e o transtorno deste processo” – causado a si, que agora fica sem emprego, e aos alunos a quem fez testes de diagnóstico e iniciou uma relação que vai agora por água a baixo. Ana ainda vai ficar uns dias em Lisboa à espera de saber o que vai acontecer. Depois rumará ao Sabugal, onde continuará a procurar um horário para leccionar. Há ainda duas questões que a preocupam: não sabe se lhe vai ser pago o salário de um mês de aulas e ainda não recebeu o papel para o subsídio de desemprego.

O anúncio da criação de uma comissão arbitral, presidida por um magistrado, para analisar eventuais compensações a pagar aos professores prejudicados pelo erro do Ministério foi o trunfo levado por Nuno Crato ao Parlamento, esta quarta-feira, numa tentativa de acalmar a indignação dos sindicatos e dos partidos da oposição. O pedido já chegou ao Conselho superior da Magistratura que deve agora nomear um magistrado para presidir à comissão. Mas os professores ouvidos pelo SOL dizem-se mais interessados em dar aulas, mantendo o posto de trabalho que tinham até há uns dias, do que em receber indemnizações para ficar em casa sem trabalhar. 

Erros nos concursos vão além  da Bolsa de Contratação

Nuno Crato tem tentado resumir os problemas da colocação de professores – que geraram o caos nas escolas como não se via há muitos anos – aos que decorrem da Bolsa de Contratação de Escola (BCE), que se destina a colocar professores nas cerca de 300 escolas em territórios especiais de intervenção prioritária (TEIP) ou com contratos de autonomia.

Este concurso tinha um erro na sua fórmula inicial e, depois de corrigido, originou novas colocações, levando a que, pelo menos 150 professores que já estavam a dar aulas desde o dia 12 fossem substituídos e ficassem sem emprego. Isto mesmo depois de o ministro ter assegurado que a correcção do erro dos serviços não iria prejudicar nenhum docente já colocado e que, se necessário, haveria duplicações de docentes.

Andreia, professora do ensino especial, é um exemplo do que correu mal também nos outros concursos que colocam professores contratados, segundo a graduação profissional, nas escolas que não são TEIP nem de autonomia e que são ainda a maioria. 

“Tinha condições para ser reconduzida logo no início do ano lectivo. Havia horário para mim na escola, a direcção pediu para eu ficar, reunia todos os requisitos. Mas não fui reconduzida”, contou ao SOL esta docente que é contratada há vários anos mas tem encontrado sempre horário perto de casa. Para ocupar o seu lugar, não ficou ninguém. Professora do ensino especial, viria a conseguir colocação mais tarde, a 26 de Setembro, através da segunda reserva de recrutamento – na mesma escola e para dar precisamente as mesmas aulas. “Estou nas mesmas funções, só que só comecei a dar aulas no dia 30 de Setembro e perdi 30 dias de serviço”, explica.

As consequências não se resumem ao transtorno e ao facto de os alunos terem perdido um mês de aulas. No caso de Andreia, poderá significar a não entrada para o quadro do Ministério da Educação (que a lei impõe após cinco renovações seguidas de contrato). 

Outras 'injustiças'

Apesar de Nuno Crato ter garantido que no caso dos professores prejudicados pelos erros da BCE os efeitos dos contratos seriam reportados ao dia 1 de Setembro, no caso dos outros contratados que deveriam ter sido reconduzidos e não foram – sem que haja explicação para tal – nada foi assegurado. E segundo relatos recolhidos pelo SOL, são muitos os docentes que não foram reconduzidos e cumpriam os requisitos impostos pela lei.  

A “injustiça” é ainda maior se a situação relatada ao SOL por Andreia for comparada com a de colegas da mesma escola. “Tive um colega com condições para ser reconduzido e não foi. Mas depois foi colocado através da BCE. Apesar de termos começado a dar aulas no mesmo dia, o contrato dele tem efeito a partir do início de Setembro e o meu não”. Até que a situação fique resolvida, esta docente não vai baixar os braços: queixou-se ao Ministério e já tem um advogado para avançar para tribunal.

rita.carvalho@sol.pt