O SOL teve acesso aos últimos relatórios das empresas que José Guilherme assumiu ter em Angola, em respostas enviadas esta semana aos deputados da comissão. Além dos prejuízos e dos capitais próprios negativos, a complexa teia de empresas do construtor tem rácios de solvabilidade e rentabilidade negativos, liquidez reduzida ou inexistente e um grau de endividamento excessivo.
O empresário – conhecido por 'Zé Grande' – tem participações em mais de 20 sociedades, mas alega que apenas três – Guinzinga Investments, Guingola Investments e Lisampere – têm actualmente interesses ou participações em Angola.
Rede de empresas apresenta prejuízos
As empresas Guinzinga e Guingola têm sede na Zona Franca do Funchal, foram constituídas em Março de 2009 e têm como actividade principal a gestão de participações sociais de outras sociedades. José Guilherme é o administrador único destas empresas. As últimas contas reportadas – relativas a 2013 – mostram que ambas registam prejuízos desde 2010. A Guinzinga teve um resultado líquido negativo de 25 mil euros em 2013, o que compara com quase 246 mil euros em 2012. Já a Guingola perdeu 87 mil euros em 2013, o que representou um ligeiro decréscimo face aos 158 mil euros contabilizados em 2012.
O acumular de prejuízos contribui para o agravamento da situação de falência técnica. Este cenário ocorre quando uma sociedade tem um passivo superior ao activo. A Guingola Investments tem activos de quase 53 mil euros e passivos superiores a 3,83 milhões de euros, o que empurra os capitais próprios para o valor negativo de 3,78 milhões de euros. Esta sociedade opera desde 2010 em falência técnica, à custa de endividamento. A Guinzinga Investments tem capitais próprios negativos desde 2010. Em 2013, a sociedade que também gere participações sociais tinha activos de 3,46 milhões de euros e passivos de quase 3,78 milhões.
A situação de falência técnica não obriga o construtor a declarar a insolvência destas empresas, embora aumente a probabilidade de tal acontecer a curto ou médio prazo. Ambas as sociedades são auditadas pela sociedade de revisores oficiais de contas Júlio Alves, Mário Baptista & Associados.
O SOL não conseguiu estabelecer contacto com as empresas até ao fecho da edição.
Outras empresas na esfera do empresário também apresentam uma situação frágil, nomeadamente aquelas que o empresário assumiu no negócio da Escom. «As sociedades Vergui e Guimavi, que domino, foram as sociedades através das quais participei no negócio das Torres Sky Center», adiantou o construtor civil, nas respostas enviadas ao Parlamento.
José Guilherme encaixou uma mais-valia de 25 milhões de dólares com a venda da posição de 33% das Torres da Escom, em Luanda, que comprara três anos antes à própria Escom. Comprou por sete milhões e vendeu por 32 milhões.
Entretanto, os resultados pioraram. A Vergui, criada em 1971, registou prejuízos de 689 mil euros em 2013. É detida por José da Conceição Guilherme, a sua esposa Beatriz da Conceição Veríssimo e o seu filho Paulo Jorge. Os capitais próprios são negativos em 887 mil euros.
A Guimavi, criada em Novembro de 1995, tem prejuízos de 633 mil euros e capitais próprios negativos de 1,5 milhões.
Recusas ao Parlamento
A rede de empresas de José Guilherme indicia sérias dificuldades financeiras. A Sintril, uma sociedade focada no arrendamento de bens imobiliários e anteriormente designada por Paulo, Guilherme & Veríssimo, teve prejuízos de 4,3 milhões em 2013 e está igualmente em situação de falência técnica desde 2012. É detida por José da Conceição e a sua esposa.
Por duas vezes, o construtor recusou ir ao Parlamento prestar declarações, invocando estar a residir em Angola e motivos de doença. No entanto, o Expresso noticiou que o empresário estivera em Portugal, o que levou a comissão a participar ao Ministério Público a recusa de José Guilherme em depor na Assembleia.
O construtor acabou a responder por escrito esta semana, recusando-se a esclarecer o presente oferecido a Salgado, por ser «interveniente num processo a decorrer no Departamento Central de Investigação e Acção Penal», o famoso caso Monte Branco. O empresário assumiu ter recorrido ao Regime Especial de Regularização Tributária (RERT) e admitiu que devia 120 milhões de euros ao BES em Agosto de 2014, na altura da resolução. Por isso, está «em conversações» com o Novo Banco para reestruturar a dívida. «Com a resolução determinada pelo Banco de Portugal já perdi cerca de 25 milhões de euros», lamentou.
sandra.almeida.simoes@sol.pt