O preço do nacionalismo económico

Muita gente se sente frustrada pela compra por estrangeiros de grandes empresas portuguesas – os ‘campeões nacionais’. Mas era inevitável que um país altamente endividado como Portugal tivesse que vender activos, incluindo as ‘jóias da coroa’. Pena é que nos loucos anos de endividamento público e privado poucos tenham pensado nessa inevitabilidade.  

Acresce que foram insignificantes as indemnizações aos proprietários das empresas nacionalizadas durante o PREC, em 1975. E o empresário nacional, em regra, não gosta de admitir capital externo na sua empresa, para não perder liberdade de gestão. Assim, o sector privado português tem vivido desde há muito com insuficientes capitais próprios e por isso demasiado dependente do crédito bancário (a dívida das empresas supera a do Estado português e é a maior da UE em proporção do PIB). Como já aqui disse, temos um 'capitalismo sem capital'.

Perante a compra por estrangeiros de importantes empresas nacionais é compreensível o sentimento de perda, pois ter no país os centros de decisão empresarial tem algumas vantagens. Mas, em contrapartida, também implica inúmeras desvantagens, só que menos visíveis.

Seriam esses centros nacionais de decisão exemplos de boa gestão e da prática de preços favoráveis aos consumidores? Na maior parte dos casos, nem uma coisa nem outra. Basta lembrar a 'excelência' da gestão do BES/GES ou da PT, durante anos a fio elogiada por jornalistas, comentadores e, claro está, pelos próprios gestores. Repare-se, também, nos altos preços praticados por alguns desses 'campeões nacionais', na energia, telecomunicações, transportes, etc. E recorde-se que foi precisa uma OPA falhada da Sonae sobre a PT para introduzir alguma concorrência no sector das telecomunicações.

Aliás, viram-se os 'benefícios' trazidos à economia nacional pela golden share do Estado na PT… É que o preço deste 'nacionalismo económico' era uma promíscua ligação dos empresários e gestores ao poder político. Os efeitos dessa promiscuidade revelaram-se altamente negativos, a começar pela entrada de boys partidários na gestão das empresas.

O patriotismo foi frequentemente invocado para proteger dos estrangeiros as empresas nacionais – na concorrência no mercado e na aquisição de capital social. Mas veja-se o exemplo de França, onde essa atitude é corrente, com governos de direita e de esquerda: só debilitou a economia francesa. 

Também se dizia que os estrangeiros não conheciam bem o nosso mercado e por isso deixariam os consumidores portugueses mal servidos. Aconteceu com a compra do banco Totta pelo espanhol Santander – afinal, hoje o único banco de alguma dimensão que ganha dinheiro em Portugal.  

A mais nefasta consequência da protecção estatal aos centros de decisão nacionais talvez tenha sido o amolecimento na gestão das empresas mantidas sob o manto formal ou informal do Estado. Na era da globalização – que está aí, goste-se ou não – é fatal a falta de uma forte concorrência. Mais tarde ou mais cedo, esta virá de fora, encontrando as empresas pouco preparadas para a enfrentar.

Se, excepcionalmente, se justifica assegurar a manutenção do centro decisão de uma empresa em Portugal, a maneira séria de o fazer é nacionalizá-la – ou mantê-la nacionalizada, como deve acontecer com a Caixa Geral de Depósitos, num sector bancário onde a presença portuguesa é hoje marginal.