A segurança europeia em câmara lenta

A 21 de agosto celebraram-se os 600 anos da data em que D. João I, ao dar o passo que deu na tomada de Ceuta, lançou Portugal enquanto pioneiro da expansão europeia e da primeira globalização vivida pelo Mundo. Um passo que marcou a história universal para sempre.

Os tempos são agora obviamente outros. Mas alguns desafios, evoluindo com o contexto geral dos tempos, não deixam de ser comuns. É o caso daqueles que se colocam ao nível da segurança e que decorrem da globalização e, depois também, da revolução da mobilidade e das comunicações.

Em 2007 pude testemunhar, enquanto co-presidente do Grupo Multidisciplinar sobre Criminalidade Organizada do Conselho da União Europeia, como a Comissão Europeia teve a oportunidade de apresentar a sua proposta para a criação do chamado “PNR Europeu”.

Trata-se essencialmente de um projeto que visa construir um sistema de obtenção e tratamento de dados sobre as pessoas que viajam no espaço aéreo europeu, pretendendo-se que tais dados sejam colocados ao dispor, sob determinadas condições, das entidades responsáveis pela prevenção, deteção e investigação dos crimes considerados mais graves, incluindo o terrorismo.  

Estas formas de crime envolvem frequentemente deslocações aéreas, nacionais e internacionais, algo evidente para todos quando olhamos para cidadãos da UE que se deslocam de e para zonas de conflito para participar em atividades terroristas.

O sistema em causa pretende assim fornecer mais uma ferramenta para lidar com os fenómenos “naturais” decorrentes da globalização, da mobilidade e da evolução das práticas e pretensões criminais.

Importa destacar que esta é, por um lado, uma resposta necessária, mas também uma solução exigível, de modo a que a liberdade de circulação possa ser protegida. Se pretendemos manter as liberdades no plano da UE, devemos também adotar as ferramentas que se exigem para fazer face aos fenómenos que nesse âmbito ganham oportunidade. 

Conhecendo os problemas das negociações europeias, muito evidentes para qualquer cidadão no quadro dos últimos desenvolvimentos da vida financeira da Europa, não deixa de ser extremamente surpreendente que, cerca de 8 anos volvidos sobre a apresentação da primeira proposta sobre o tema, estejam ainda a ser aprovadas resoluções e declarações políticas que prometem concluir a negociação do ‘PNR Europeu’.

A resposta europeia da segurança e da justiça aos fenómenos que estão em causa não pode compadecer-se com este ritmo. Devendo sempre salvaguardar-se direitos fundamentais, exige-se também capacidade de negociação e de compromisso de todos os agentes na apresentação de soluções, sob pena de que estejamos, uma vez mais, a dar argumentos para colocar em causa a própria construção europeia.

Essa sim deve ser a prioridade da política nacional no quadro europeu, a consolidação e a saudável continuação da construção do projeto que Delors batizou como «OPNI», isto é, o “Objeto Político Não Identificado”. Ao invés de mais estruturas e cargos políticos, como parece ser a bandeira de alguns, importa sim que nos centremos na defesa de políticas públicas concretas, que respondam a necessidades colocadas pelo nosso tempo. Portugal, nomeadamente pelo seu passado internacionalista, em que foi pioneiro, é um interlocutor respeitado, o que comporta responsabilidades especiais.

 

Declaração de interesses: o autor é candidato a deputado nas listas da coligação Portugal à Frente.