“É mais fácil um novo Nobel que uma maioria absoluta”

O final de tarde morno e luminoso convidava a aproveitar o que a vida tem de agradável e Rui Oliveira e Costa chegou com ar aliviado ao encontro, na esplanada junto ao Tejo. “Ontem estava preocupado, hoje já não”, atirou, com um sorriso, o responsável de uma das grandes empresas portuguesas de sondagens. Revelou que…

A conversa com o SOL, de resto, haveria de ser interrompida para Oliveira e Costa satisfazer a curiosidade da direção socialista. As notícias não eram boas, “mas factos são factos”, justificou depois do telefonema. Outra coisa, explica, é ligar uma derrota socialista ao inevitável afastamento do atual líder. “O PS perde as eleições, mas António Costa ainda pode ser primeiro-ministro”, defende. Se PSD e CDS não tiverem mais de metade do Parlamento, o Governo da PàF “pode cair rapidamente com uma moção de censura da esquerda”, explica. Cavaco Silva terá então de convidar Costa para governar.

‘Costa está a dizer: eu fico’

Ele não é, pois, dos que pensam que Costa será corrido na própria noite das legislativas, mesmo que tenha feito isso a Seguro por causa de um resultado ‘poucochinho’ nas europeias. Os socialistas não trocarão de líder se “virem que o poder ainda está ali à mão”, argumenta. De resto, o atual líder do PS já terá sinalizado a sua vontade: “Ao dizer que chumbará o Orçamento do Estado da direita, Costa está a dizer para dentro do PS ‘eu fico’”.

Além de especialista em sondagens, Oliveira e Costa é professor de Ciência Política. Com a experiência conjugada das duas áreas, defende um sistema que dê estabilidade ao Governo. “O nosso sistema é antimaioria absoluta”, lamenta. Apenas gerou três por uma conjugação de fatores que julga irrepetível. “A maioria absoluta nestas legislativas é uma ‘não questão’”, remata, definitivo.

A sua crença é tal que revela uma aposta feita com um grupo de amigos. “Disse-lhes que mais depressa haverá um novo prémio Nobel português do que uma maioria absoluta”. Com uma gargalhada, explica que não está muito convicto de que a Academia Sueca encontre um novo Saramago ou um novo Egas Moniz. A sua segurança de que não terá de pagar vários almoços decorre, antes, da certeza de que a “maioria absoluta é uma quase impossibilidade matemática”. Brincadeiras à parte, está preocupado com o futuro do país: “Vamos viver uma fase de instabilidade como há muito não víamos. Devemos ter novas eleições num ano”.

Fazer hoje sondagens é uma profissão de risco e os que fazem disso profissão vão também a julgamento no domingo, ou não? Oliveira e Costa é um homem sem sobressaltos e confia na “sondagem definitiva”: a que vai fazer no próprio dia 4, para a SIC divulgar às oito da noite. “Temos o melhor boca de urna europeu. Nas últimas legislativas demos o resultado final com um desvio de décimas”, diz com orgulho.

As sondagens-espectáculo

Um grau de acerto que lhe permitiu dar a José Sócrates uma má notícia, às 19h30 de 5 de junho de 2011: “Ficou a saber que ia ter de puxar pelo discurso da derrota”. Uma notícia que preferia não dar ao amigo que está agora em prisão domiciliária e que visitou na semana passada.

Oliveira e Costa até já foi deputado pelo PSD, mas é socialista (“da ala direita”). Não confunde os planos, sublinha, e apesar de ter sido dirigente socialista e da UGT, assegura que a Eurosondagem não é mais favorável ao PS. “Isso é maledicência de redes sociais. O meu trabalho é independente e os resultados comprovam-no”. Falta de objetividade, diz, só na defesa do seu Sporting. De resto, é como sportinguista que é reconhecido pelo empregado da esplanada.

Nestas legislativas apareceram as tracking polls, que vão dando a ritmo diário a tendência de voto de um painel de eleitores em mutação. Oliveira e Costa não é fã: “Teria feito uma tracking poll se me pagassem, mas sem nenhum entusiasmo”. Acertar no resultado das eleições com uma sondagem destas é como “prever um terramoto”. “Foram um espetáculo para as televisões”, remata.

Inevitável é falar de telefones fixos, vistos por muitos como uma explicação para as sondagens que os utilizam não acertarem. “O problema existe, mas podia ser muito maior se os jovens não se abstivessem tanto”. Os telemóveis não são alternativa “porque não têm um registo de distribuição geográfica”, explica. “É impossível fazer sondagens por telefone sem saber onde votam as pessoas”. As sondagens com voto na urna são três vezes mais caras e não são melhores: “Temos de apostar numa freguesia-tipo, que pode não ser a acertada”.

A conversa termina muito depois do início do Porto-Chelsea que Oliveira e Costa queria ver em casa. Mas ainda desfaz outra ideia feita: a de que os indecisos são o grande inimigo de quem tenta antecipar resultados eleitorais. “A grande maioria dos indecisos acaba por não ir votar, são abstencionistas. O grande perigo mesmo são os que dizem que votam e depois ficam em casa”, corrige. 

manuel.a.magalhaes@sol.pt